Padraig Walshe foi o maior inimigo da carne bovina brasileira na Europa como presidente da Associação dos Agricultores da Irlanda. Ele comandou a campanha que acabou restringindo a entrada do produto brasileiro nos 27 países-membros, há quase dois anos. Agora, Walshe se tornou presidente da Copa-Cogeca, a poderosa central sindical dos agricultores europeus. Ampliou seu raio de ação e é sobretudo o impacto da crise financeira global no setor que toma seu tempo.
Ontem, à margem da conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), sua inquietação estava focada no que chama de aumento de poder dos supermercados em detrimento dos produtores, no cenário de recessão e fragilidade econômica.
“O que realmente mudou para a agricultura foi o crescente poder dos varejistas na cadeia de produção de alimentos”, disse ele. “Os supermercados prometem aos consumidores mais alimentos por menos dinheiro, e para isso cortam as margens dos produtores, mas aumentam as suas”, afirmou.
Walshe acusa os varejistas de cobiça excessiva, de “canibalizar” a renda dos agricultores e deixar parte deles em situação financeira desesperadora. “Se continuar desse jeito, não dá para ter nem um pequeno lucro, e a Europa vai produzir menos alimentos”. Segundo ele, na Irlanda, a renda dos produtores vai cair 28% este ano, ficando em média em € 16 mil, incluindo os subsídios recebidos, soma em todo caso insuficiente para pagar os bancos e sobreviver.
Em Genebra, Walshe se declarou “encantado” com o fiasco da conferência ministerial da OMC, porque ao seu ver empurra a conclusão da Rodada Doha de liberalização global para algo distante. “Essa rodada não acaba antes de 2013, pelo menos. Estou encantado. Ela só serviria para países avançados como o Brasil, com seu açúcar e carne, e não para países pobres”, disse pouco depois de ter se encontrado com a comissária de agricultura da UE, Mariann Fischer Boel, que defendia justamente o contrário.
Mas Padraig ressalva que não é contra os agricultores brasileiros. O presidente da central dos agricultores europeus acha que um acordo na OMC beneficiaria as multinacionais e os varejistas.
E para não perder o hábito, Walshe voltou a atacar a produção brasileira de carne, deixando claro que vai usar seu novo e mais poderoso cargo para se manter vigilante sobre a aplicação de rastreabilidade no Brasil.
“O que realmente me incomoda é que na Europa somos submetidos a enormes exigências, preços de seguros e outras coisas extremamente caras e a concorrência quer seguir outras normas”, reclamou.
“Eu seria um criminoso na Europa e estaria na prisão se usasse hormônios e métodos veterinários inapropriados [na produção de carne]”‘, acrescentou. Indagado se o problema de hormônios não ocorreria sobretudo nos EUA, ele retrucou que “descobriu” a mesma prática no Brasil. “Uma missão nossa encontrou hormônios em fazendas. Se estavam lá, é porque alguém comprou e queria usá-los”. No Brasil, o uso de hormônio na produção de gado bovino é proibido.
Desde que a UE restringiu a carne bovina brasileira, o número de fazendas autorizadas a fornecer animais para abate e exportação ao mercado europeu caiu de 10 mil para 100. Agora voltou a crescer para cerca de 1.800.
Walshe admite que a concorrência brasileira está aumentando um pouco, “mas eu ainda acho que os padrões não são comparáveis”.
O irlandês ainda pode dar dor de cabeça à agricultura brasileira.