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Economia

O risco de uma nova bolha

<p>Banco Mundial alerta para a ameaça de novas bolhas de ativos na Ásia, especialmente nos mercados de imóveis, ações e câmbio.</p>

Juros baixos e dinheiro injetado no sistema financeiro pelos bancos centrais e governos do mundo todo para combater a recessão ameaçam criar outro problema: novas bolhas de ativos, especialmente nos mercados de imóveis, ações e câmbio da Ásia.

O Banco Mundial alertou ontem (03/11) que o surgimento súbito de bilhões de dólares em investimentos no leste da Ásia está “alimentando preocupações com bolhas de ativos” nos mercados em toda a região e no valor dos imóveis na China, em Hong Kong, em Cingapura e no Vietnã. O Fundo Monetário Internacional também citou ontem o “risco” de que a alta nos preços dos ativos de Hong Kong esteja sendo impulsionada por “condições de liquidez no curto prazo sem relação com as forças fundamentais da oferta e da demanda”.

“É o começo de mais uma alta enorme e cara no valor dos ativos”, disse Simon Johnson, que já foi economista-chefe do FMI.

Políticos de Pequim a Londres, ainda chamuscados com o dano causado pelo estouro das bolhas imobiliária e de crédito, começam a buscar a melhor maneira de evitar esses novos problemas. Como administrar as bolhas “é uma das duas ou três grandes perguntas não respondidas no fim desta crise”, diz Adair Turner, presidente do conselho da FSA, autoridade britânica que regulamenta as empresas financeiras do país. O presidente do Banco da Coreia do Sul, Lee Seong-tae, indicou mês passado que pretende aumentar os juros, se necessário, para evitar que o mercado imobiliário da capital, Seul, se valorizasse demais.

Os temores sobre a velocidade com que os preços estão subindo abrangem vários mercados, do cobre, que já subiu cerca de 60% no último ano, aos títulos com grau de investimento nos EUA, em que o rendimento – que indica a percepção de risco – caiu para o ponto em que estava em agosto de 2007, quando a bolha imobiliária começou a estourar, segundo o Barclays Capital. Mas os sintomas do frenesi insustentável são mais evidentes na Ásia e na Oceania, onde as economias estão se recuperando mais rapidamente do que no resto do mundo.

No mercado de imóveis de luxo de Hong Kong, os preços estão explodindo. Um apartamento de luxo no sofisticado bairro Midlevels é calculado em US$ 55,6 milhões, ou quase US$ 10 mil por metro quadrado, afirmou a incorporadora Henderson Land Development.

Diante da forte demanda, a incorporadora de um condomínio em Cingapura aumentou os preços em 5% um dia antes de começar a vender as unidades, enquanto dezenas de interessados faziam fila. Em vez de deixar as pessoas dormindo na fila, a incorporadora, uma joint venture entre a Hon Leong Group e a Mitsui Fudosan, sorteou entre os interessados o direito de fazer uma oferta. O valor médio dos imóveis em Cingapura subiu 15,8% no terceiro trimestre, o ritmo mais rápido em 28 anos.

O dólar australiano, que já subiu 35% nos últimos 12 meses enquanto os investidores tomavam empréstimos em dólar para comprar a moeda australiana – prática conhecida como “carry trade” – que está atraindo recursos e valorizando as bolsas e o mercado de renda fixa mais rapidamente do que nos EUA ou na Europa. Os operadores de câmbio apostam que o banco central da Austrália, que aumentou os juros em 0,25% ontem, pela segunda vez em dois meses, continuará elevando-os. E os mercados imobiliários da Austrália também estão esquentando.

As bolsas asiáticas também estão subindo. Cerca de US$ 50 bilhões seguiram para fundos de ações de mercados emergentes este ano, segundo a firma de acompanhamento de dados EPFR Global. Até ontem, o amplo Índice MSCI Barra de Mercados Emergentes já tinha subido 60,7% este ano. O Ibovespa havia subido 100% este ano em dólares, enquanto na Indonésia os ganhos chegam a 102,7%. No mesmo período, a Média Industrial Dow Jones subiu apenas 11,5%. Desde que a Média Dow Jones atingiu seu nível mais baixo recente, em 9 de março de 2009, ela já subiu 49,52% até 2 de novembro. Durante o mesmo período, o MSCI Barra subiu 87,75%.

Discernir exatamente uma bolha – quando os ativos ultrapassam o que os fundamentos econômicos consideram como valores razoáveis – sempre é difícil. Uma alta rápida nos preços não é uma prova definitiva. As ações dos mercados emergentes da Ásia são negociadas atualmente a cerca de o dobro do valor contábil, mais ou menos a média dos últimos 20 anos, segundo o UBS. De 2004 a 2008, a cotação média era cerca de três vezes o valor contábil. “Isso aqui não parece uma bolha”, disse Hugh Simon, diretor-presidente da Hamon Investment Group. “Há ceticismo” entre os investidores.

Um mecanismo importante por trás da alta nos mercados asiáticos é o juro baixo nos EUA. Em busca de rendimentos maiores, os investidores tomam emprestado em dólar e “amontoam o dinheiro em países que estão crescendo mais rapidamente”, disse Stephen Cecchetti, economista-chefe do Banco para Compensações Internacionais – o BIS, o banco central dos bancos centrais -, que alertou para o perigo logo no início da última bolha de ativos e agora está fazendo a mesma coisa. “Isso aumenta o risco de criar booms de imóveis ou de ações nesses países.”

Acrescente a isso o estímulo fiscal e a oferta de crédito gigantescos na China, e há uma enxurrada de dinheiro que impulsionou o volume de transações chinesas com imóveis em 248% em setembro frente a um ano antes, segundo o Citigroup. Os preços se recuperaram quase 30% em relação aos baixos valores atingidos por algumas cidades em 2008.

O que atrai na China é seu tamanho e o crescimento sólido, mas o dinheiro está fluindo também para rincões mais arriscados da Ásia. Empresas indonésias, que no início da década tinham alguns dos índices de calote mais altos da Ásia, estão emitindo títulos em Wall Street pela primeira vez desde que a crise começou.

Diante das perspectivas asiáticas, o fluxo líquido de capital para os mercados emergentes deve aumentar 12% em 2009, para US$ 191,1 bilhões, e 43% no ano que vem, para US$ 272,9 bilhões, calcula o Instituto de Finanças Internacionais. Em todas as outras regiões com mercados emergentes – Leste Europeu, América Latina, África e Oriente Médio -, o fluxo líquido de capital vai cair em 2009, afirma a associação.

Administrar essa torrente de dinheiro é um desafio para os políticos, que estão se voltando primeiramente para a regulamentação. As autoridades de Cingapura aumentaram as exigências para a concessão de financiamentos imobiliários, acabaram com políticas de estímulo ao mercado imobiliário e prometeram disponibilizar mais terrenos para a criação de loteamentos. As autoridades da Coreia do Sul também aumentaram as exigências para obter empréstimos imobiliários em sete distritos ao redor de Seul onde os preços subiram recentemente.

Quando o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, aumentar os juros, os investidores serão persuadidos a trazer de volta para casa um pouco desse capital. Um relatório do Banco da Coreia divulgado semana passada alertou que quando o Fed aumentar os juros, pode detonar uma saída de capital gigantesca e desestabilizadora nos mercados emergentes.

Enquanto isso, ainda está longe de ser evidente que aumentar os juros na Ásia vai diminuir a especulação, porque atrairia ainda mais dinheiro fácil da própria região e do exterior. Esse dinheiro fácil dificultará que as autoridades aumentem os juros.

“Mesmo quem diz que deveríamos responder diretamente (e murchar as bolhas) não tem nenhuma ideia sobre como fazer isso”, disse Laurence Meyer, ex-presidente do Fed. “É fácil adotar uma posição filosófica, mas é difícil se tornar prático e operacional em relação a isso.”