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Fim da era dos alimentos baratos no mercado mundial

<p>Os agricultores enfrentarão os preços mais altos com investimentos e mais produção, mas o alimento mais oneroso deverá persistir por anos.</p>

Redação (18/12/2007)- Pelo que a maioria das pessoas consegue lembrar, os alimentos estão ficando mais baratos e o setor agrícola tem declinado. Entre 1974 e 2005, os preços dos alimentos nos mercados mundiais caíram 75% em termos reais. Os alimentos atualmente estão tão baratos que o Ocidente está combatendo a gula, mesmo enquanto descarta pilhas de restos de comida no lixo.

Isso explica por que o aumento de preços deste ano tem sido extraordinário. Desde a primavera, o trigo dobrou e quase todos os tipos de produções sob o sol – milho, leite, oleaginosas – estão no auge ou dele se aproximam em termos nominais. O índice de preços de alimentos da Economist está no mais alto nível desde sua criação, em 1845 (ver gráfico). Mesmo em termos reais, os preços deram subiram 75% desde 2005.

É claro que os agricultores enfrentarão os preços mais altos com investimentos e mais produção, mas o alimento mais oneroso deverá persistir por anos. Isso porque a "agflação" é sustentada por mudanças prolongadas nas dietas que acompanham a riqueza crescente das economias emergentes – o consumidor chinês, que comia 20 quilos de carne em 1985, comerá mais de 50 este ano. E isso eleva a demanda por grãos: são necessários 8 quilos de grãos para produzir um quilo de carne bovina.

A alta nos preços, porém, também é resultado auto-infligido dos subsídios imprudentes ao etanol promovidos pelos EUA. Neste ano, os biocombustíveis absorverão um terço da colheita recorde de milho do país. Isso afeta os mercados de alimentos: encha o tanque de combustível de um SUV (utilitário esportivo) com etanol e você terá usado milho bastante para alimentar uma pessoa em um ano. E isso afeta as pessoas indiretamente, pois agricultores migram de outras lavouras para o milho. As 30 milhões de toneladas de milho extra destinadas ao etanol este ano equivalem à metade da queda nos estoques globais de grãos.

O alimento mais dispendioso é capaz de trazer benefícios e malefícios. Afetará consumidores urbanos, sobretudo em países pobres, elevando o preço daquilo que já é o item mais caro em seus orçamentos. Beneficiará produtores rurais e comunidades agrícolas, aumentando a remuneração; e em muitas regiões rurais pobres incentivará a mais importante fonte de emprego e o crescimento econômico.

Apesar de o custo dos alimentos ser determinado por padrões básicos de oferta e demanda, o equilíbrio entre benéfico e maléfico também depende, em parte, dos governos. Se os políticos não fazem nada, ou se fazem coisas erradas, o mundo enfrenta mais miséria, especialmente entre os pobres urbanos. Mas se estes forem beneficiados por políticas corretas, podem ajudar a aumentar a riqueza dos países mais pobres, a socorrer os pobres nas regiões rurais e a resgatar o setor agrícola dos subsídios e do abandono – e a minimizar o dano causado aos moradores de favelas e aos trabalhadores sem-terra. Por enquanto, os prognósticos parecem sombrios.

Essa, pelo menos, é a lição de meio século de política alimentar. Independentemente da suposta ameaça – falta de segurança alimentar, pobreza rural, gestão ambiental -, o mundo parece ter só uma solução: intervenção governamental. A maioria dos subsídios e barreiras comerciais veio a um custo enorme. Os trilhões de dólares gastos no apoio aos agricultores nos países ricos resultaram em impostos mais altos, piores alimentos, monoculturas intensivas, superprodução e preços mundiais que destroem as vidas dos agricultores pobres nos emergentes.

E em troca do quê? Apesar da ajuda, um grande número de agricultores ocidentais foi atingido pela pobreza. Produtividade crescente significa menos agricultores, o que, por sua vez, implica a expulsão dos menos eficientes do manuseio da terra. Mesmo um subsídio forte não consegue reverter isso.

Com a "agflação", a política atingiu novo nível de ridicularização. Tomemos os subsídios de etanol supostamente ecológico dos EUA. Não se trata somente do fato de estarem apoiando uma versão relativamente suja do etanol (seria melhor importar do Brasil o combustível derivado da cana); também estão neutralizando subsídios mais antigos a grãos, que reduziram preços por meio do estímulo à produção excessiva. Intervenções se multiplicam como mentiras.

Agora, países como Rússia e Venezuela impuseram controles de preços – uma ajuda aos consumidores – para compensar a ajuda dos EUA ao etanol. Enquanto isso, os preços elevados dos grãos estão convencendo as pessoas a derrubar florestas para plantar milho.

A comida mais cara representa uma oportunidade para romper esse ciclo estonteante. Preços de mercado mais altos possibilitam reduzir subsídios. A União Européia prometeu uma revisão completa (não uma reforma, por enquanto) do seu programa de apoio à agricultura, e o tema está em pauta nos EUA. Reformas nas décadas passadas investiram contra os programas agrícolas do mundo rico – mas timidamente. Agora, surge nova oportunidade. Cortar subsídios e barreiras comerciais do mundo rico ajudará os contribuintes e poderá ressuscitar a Rodada Doha de negociações sobre o comércio, impulsionando a economia mundial e ajudando os pobres.

Três quartos dos pobres do mundo vivem em zonas rurais. Os preços deprimidos criados pelos subsídios nas décadas passadas tiveram efeito devastador. Ocorreu uma queda prolongada no investimento na agricultura e nos itens que a sustentam, como a irrigação. A parcela de gasto público que vai para a agricultura nos países em desenvolvimento se reduziu à metade desde 1980. Países pobres que costumavam exportar alimentos agora os importam.

Reduzir subsídios no Ocidente ajudaria a reverter esta situação. O Banco Mundial avalia que, se o comércio agrícola for liberado, os preços dos itens nos quais os países pobres se especializam aumentariam, e os países em desenvolvimento captariam os ganhos por meio do aumento das exportações. Além disso, a atividade agrícola pode ser grande colaboradora nos estágios iniciais do crescimento econômico de um país. Segundo o Bird, os verdadeiramente pobres recebem três vezes mais renda extra de um aumento na produtividade agrícola em relação ao mesmo ganho na indústria ou no ramo de serviços.

Mas há um complicador – do tipo que justifica a ajuda do governo. Preços elevados têm um impacto misto sobre a pobreza: prejudicam os que perdem mais com alimento caro do que os que ganham com renda mais alta. E isso significa mais de um bilhão de consumidores (e alguns trabalhadores sem terra), muitos deles politicamente influentes nos países pobres. Os governos deveriam subsidiar as rendas dos pobres, em vez do alimento, pois isso minimiza distorções de preço. Onde os subsídios aos alimentos são inevitáveis, eles deveriam ser temporários e para os pobres. Por enquanto, a maioria das intervenções governamentais no mundo pobre fracassou nesses testes: políticos que parecem pensar que os alimentos baratos são um fator natural encorajaram controles de preços e restrições às exportações, que prejudicam os agricultores e quase sempre fracassam.

Ao longo dos anos recentes, desenvolveu-se uma sensação de que os ricos estão se apropriando da riqueza do mundo. Nos países pobres, a crescente desigualdade de renda assume a forma de um abismo entre cidade e interior: as rendas têm crescido em ritmo mais veloz para moradores urbanos que para os rurais. Se for tratado devidamente, o alimento mais caro representa uma chance única em uma geração de reduzir disparidades de renda e de desacostumar os produtores rurais ricos dos subsídios e de ajudar os pobres. A recompensa suprema, porém, não é meramente deles; é a de tornar o mundo mais rico e mais justo (Tradução de Robert Banvolgyi)