Redação (10/01/07) – Nos últimos anos, os avanços na biotecnologia sucederam-se a um ritmo frenético. Graças a eles, foi possível dominar o processo de alteração genética, a ponto de alterar o genoma animal, ou seja, o material responsável pelas características hereditárias do ser vivo, e criar um organismo transgênico em laboratório que pode possuir genes de outras espécies em seu genoma. Isso aconteceu porque o DNA – que contém a informação genética – é uma molécula que pode ser transferida de uma espécie a outra. O maquinário celular responsável por sua transcrição e tradução em proteínas é semelhante em todos os organismos vivos.
Outra conseqüência positiva dessa nova ferramenta biotecnológica foi promover o uso racional de animais de laboratório em todo o mundo. A geração de modelos transgênicos provocou uma redução do número de animais utilizados na experimentação de forma geral, além de tornar possível a substituição de espécies geneticamente mais próximas do homem, como primatas, por animais menores geneticamente modificados para ter as características específicas que se deseja estudar. No futuro, essa tendência de redução na quantidade de animais empregados deverá se acentuar em razão da maior especificidade dos modelos transgênicos desenvolvidos.
Embora importantes questões éticas envolvendo o tema esperem solução apropriada, as técnicas de geração de modelos transgênicos são muito promissoras comercialmente e nas diversas áreas da pesquisa básica e clínica médica. Os animais transgênicos são definidos de várias formas. Para a Federação Européia das Associações de Ciência em Animais de Laboratório, transgênico é “um animal que possui seu genoma modificado artificialmente pelo homem, quer por meio da introdução, quer da alteração ou da inativação de um gene [uma seqüência definida de DNA]. Esse processo deve culminar na alteração da informação genética contida em todas as células desse animal, até mesmo nas células germinativas [óvulos e espermatozóides], fazendo com que essa modificação seja transmitida aos descendentes”. O gene modificado pode ser proveniente da mesma espécie, de uma espécie diferente ou mesmo de bactérias ou plantas. Em qualquer dos casos, ele é denominado transgene, e o processo de manipulação das técnicas envolvidas nesse processo é chamado transgênese.
Existem vários métodos disponíveis para a geração de um animal transgênico. O método a ser empregado depende do tipo de modificação genética que se deseja realizar: introdução, modificação ou inativação de um gene.
Adição Gênica
O método mais utilizado na introdução de genes é a transgenia por adição, através da qual é inserida no genoma uma ou várias cópias de um gene de interesse – daí suas outras denominações: adição gênica e modelo de superexpressão de genes. O gene adicionado pode ser endógeno ou exógeno. O primeiro tipo já existe no genoma do animal. Ele é usado quando se quer produzir uma quantidade maior da proteína codificada já existente, aumentando a quantidade de cópias dele no genoma. Genes exógenos, como o nome sugere, pertencem a outra espécie e são usados para fazer um animal produzir uma nova proteína, ausente na forma desejada na espécie receptora.
Uma característica importante desse método é que a inserção da seqüência de DNA no genoma animal é aleatória. Assim, ela pode ser ineficaz ou até mesmo letal, uma vez que o local onde o gene será integrado é incerto. Na primeira possibilidade, o transgene pode se inserir em uma região do cromossomo que dificulta ou inviabiliza a sua expressão, fazendo com que o animal não apresente o fenótipo desejado. Na segunda, a inserção aleatória pode provocar, por exemplo, a inativação de um gene essencial ao desenvolvimento na fase embrionária, com conseqüente inviabilidade ou morte prematura do animal. Nesse caso, o fenótipo do animal transgênico é independente do transgene, ou seja, não foi causado por uma característica do gene inserido, mas pelo local onde esse gene se integrou. Esse tipo de evento provoca o que os pesquisadores denominam “efeito não intencional” da transgênese. Por causa dessas possibilidades, a comparação de várias linhagens transgênicas com a mesma modificação genética é imprescindível para que se possa inferir a função de um gene ou correlacioná-lo a determinada doença.
Por sua simplicidade e eficiência, a adição gênica foi o primeiro método de transgenia desenvolvido. Hoje, várias técnicas são utilizadas para produzir animais transgênicos por adição de segmentos de DNA ao genoma – entre elas, a microinjeção pronuclear de embriões, a transferência de DNA mediada por espermatozóides, a infecção de embriões por vetores retrovirais, a transferência de DNA mediada por transposons (segmentos de DNA capazes de inserir cópias e si mesmos em outro local do cromossomo), a agregação ou injeção de células-tronco embrionárias geneticamente modificadas, a transferência nuclear de células geneticamente modificadas e a transferência de segmentos de cromossomos (cromossomos artificiais).
Dentre todos esses procedimentos, a microinjeção pronuclear é o mais utilizado. Há mais de duas décadas, é realizado na grande maioria dos centros produtores de transgênicos por adição no mundo. Através dele, é possível introduzir seqüências longas de DNA de diferentes espécies no genoma de mamíferos, produzindo altos níveis de expressão e integração do transgene em células germinativas. Inicialmente, o DNA que se deseja inserir é isolado, quantificado, purificado, amplificado (ou seja, numerosas cópias da seqüência são produzidas) e colocado em um tubo em uma solução apropriada. A seguir, com um micromanipulador acoplado a um microscópio de alta resolução, o DNA contendo centenas de cópias do transgene é injetado diretamente em um embrião recém-fertilizado. Os embriões nessa fase possuem pronúcleos, que são os núcleos materno e paterno, provindos, respectivamente, do óvulo e do espermatozóide, antes que se unam para formar um único núcleo contendo o genoma do novo indivíduo. Aproveitando esse evento que facilita a integração do novo DNA no genoma, a injeção do transgene é feita em um desses pronúcleos, e espera-se então que ocorra a integração da nova seqüência.
Após a microinjeção, os embriões são transferidos para o útero de uma fêmea receptora pseudográvida (um estado semelhante ao da gravidez que ocorre em alguns mamíferos), que levará a termo o nascimento dos transgênicos. A taxa de integração do DNA no genoma embrionário é baixa – cerca de 1% a 4%. Ou seja, apenas alguns animais nascidos carregarão o transgene integrado em seus cromossomos. Para identificar quais são os espécimes transgênicos, utiliza-se uma técnica denominada genotipagem, por meio da qual se identifica a presença do transgene no genoma de todos os animais nascidos.
A integração do transgene por microinjeção, como dito anteriormente, ocorre de forma aleatória no genoma, e todas as células do animal são geneticamente modificadas, inclusive as germinativas, de modo que essa alteração será transmitida aos seus descendentes. Todo animal transgênico positivo originado de um embrião microinjetado é classificado como fundador de uma linhagem transgênica única, que difere de outro fundador quanto ao local de inserção e ao número de cópias do transgene no genoma
Modificação Genética Dirigida
Desde o início, um dos principais objetivos da transgênese era produzir animais com alterações específicas e controladas no genoma, tais como inativação de genes ou mutações pontuais de aminoácidos nas proteínas codificadas por eles. Hoje isso é possível, porém a técnica empregada para produzir esses animais é mais complexa que a de adição gênica. Ao contrário desta, o método utilizado para a modificação e inativação de genes exige que se conheça sua localização no genoma. Por isso, ele é denominado modificação genética dirigida ou controlada. Essa técnica possibilita substituir um gene funcional por uma seqüência mutada que, uma vez introduzida, inativa o gene endógeno original, gerando um animal conhecido como modelo knockout. Da mesma forma, é possível alterar uma pequena seqüência do gene, gerando um modelo knockin que produzirá uma proteína modificada em vez da proteína endógena intacta naturalmente presente no animal. O termo knockin se deve ao fato de, nessa técnica, o gene endógeno ser retirado do genoma e substituído por outro com uma pequena modificação.
A analogia do genoma a uma biblioteca é bastante adequada para entender os modelos de alteração genética. Na transgênese por adição, imagina-se uma ou várias cópias de um livro sendo colocadas aleatoriamente nas estantes, enquanto a inativação gênica (knockout) é como a retirada permanente de um livro específico da biblioteca ou ainda a modificação de apenas uma página desse livro e sua reposição na prateleira (modelo knockin).
A modificação genética dirigida ou controlada inclui uma etapa a mais que a adição gênica: a cultura de células-tronco embrionárias. Essas células são modificadas in vitro (fora do organismo vivo, em tubo de ensaio) por um processo denominado recombinação homóloga – a troca de seqüências de DNA correspondentes entre cromossomos, que ocorre naturalmente no núcleo das células – e dão origem a um animal com um gene inativado ou alterado. O princípio dessa técnica é a substituição de um gene-alvo por uma seqüência mutada que, uma vez introduzida, irá inativá-lo ou modificá-lo. O primeiro grande êxito dos pesquisadores, no final da década de 80, foi conseguir isolar e manter células-tronco indiferenciadas in vitro e, pouco mais tarde, com a injeção deles em embriões receptores, produzir camundongos quiméricos – formados por duas linhagens de células geneticamente distintas, uma originária das células-tronco modificadas que foram injetadas (de animais de pelagem escura) e outra do blastocisto receptor (originadas de animais de pelagem clara). O animal resultante desse processo apresenta pelagem malhada. Isso provou definitivamente que essas células são capazes de iniciar o processo de diferenciação e produzir um indivíduo completo.
As células-tronco embrionárias são totipotentes, ou seja, capazes de gerar qualquer tipo de tecido. Elas são oriundas de embriões na fase inicial de desenvolvimento, após cerca de quatro dias da fertilização do óvulo. O embrião nessa fase é denominado blastocisto e possui centenas de células-tronco na sua massa celular interna, que darão origem a todos os tecidos do organismo adulto. Com o domínio da cultura de células-tronco, o próximo passo foi descobrir como inativar ou modificar genes específicos nessas células. Esse feito foi conseguido com o uso da recombinação homóloga. A seleção das células-tronco embrionárias com genoma mutado é realizada, e finalmente as células modificadas são microinjetadas em embriões de camundongo. Assim, é possível inativar de maneira sistemática qualquer gene, desde que sua seqüência genômica seja conhecida.
Atualmente, essa técnica é rotineiramente aplicada em camundongos, uma das únicas espécies – além da humana – em que se domina totalmente o cultivo de células-tronco embrionárias. Para outras espécies, há dificuldade em manter indiferenciadas as células-tronco derivadas de embriões em cultura.
Aplicações na Medicina
Uma aplicação fascinante da transgênese é a utilização de animais geneticamente modificados como modelos para o estudo das causas, da progressão, dos estágios e sintomas de doenças cardiovasculares, auto-imunes, neurológicas e outras. Por permitir uma análise detalhada da fisiopatologia de doenças, os estudos com transgênicos devem propiciar também o desenvolvimento de novas formas de tratamento, novos testes diagnósticos, agentes terapêuticos mais eficazes e baratos, e o tão esperado estabelecimento de protocolos de terapia gênica. Nesse sentido, utilizando a técnica de knockout, nosso grupo foi capaz de demonstrar, em 2000, a importância fisiopatológica do receptor B1 da cinina, proteína presente na membrana das células, que participa no processo de transmissão da dor e de inflamação. Através desse processo, recentemente descobrimos que essa proteína também pode ser uma importante arma no tratamento da obesidade e dos distúrbios metabólicos.
O transplante de órgãos e tecidos de animais em seres humanos, ou xenotransplante, é foco de interesse por mais de um século. Existe carência mundial de órgãos para transplantes clínicos, e infelizmente muitos pacientes morrem na fila de espera. As vantagens do xenotransplante sobre os transplantes tradicionais incluem o suprimento ilimitado de órgãos e a conseqüente diminuição das filas de espera. Além disso, como o órgão a ser transplantado é coletado imediatamente, ele não é prejudicado por efeitos post-mortem, como hemorragia e alterações metabólicas.
Atualmente os pesquisadores desenvolvem porcos transgênicos cujos órgãos podem ser seguramente utilizados para transplante em humanos. Para isso, é preciso superar um difícil obstáculo: o sistema imunológico reconhece e destrói todas as células que não possuem marcadores específicos humanos na sua superfície, ocasionando o fenômeno da rejeição. Para contornar esse problema, foram criados porcos transgênicos portadores de um gene que codifica uma proteína da superfície de células humanas. Como resultado, esses porcos possuem órgãos contendo marcadores de células humanas, o que impede que componentes do sistema imune do receptor ataquem e destruam o órgão transplantado.
Paralelamente, outros grupos de pesquisa estudam uma estratégia diferente para minimizar a rejeição de órgãos na xenotransplantação. Ela consiste em eliminar do genoma do porco, pelo método de knockout, o gene que codifica a a -1,3-galactosiltransferase, uma enzima presente na superfície das células daquele animal que é reconhecida pelo sistema imunológico humano. Sem esta enzima, a primeira etapa na rejeição ao órgão transplantado não se deflagra.
Nas doenças degenerativas do sistema nervoso, o transplante de neurônios fetais de porcos representa uma terapia em potencial. Porcos transgênicos expressando uma molécula humana que inibe as células T imunossupressoras foram gerados. Neurônios de embriões que secretam a molécula in vitro foram transplantados em ratos e houve redução de 50% na resposta proliferativa. Esses dados mostram que neurônios de porcos transgênicos podem ser usados para testes pré-clínicos em xenotransplantação.
Apesar das boas perspectivas do xenotransplante, a utilização do método ainda precisa ser avaliada com cautela. Existe a possibilidade de os tecidos transplantados carregarem algum tipo de microorganismo latente que, uma vez introduzido no organismo receptor, origine uma infecção. A técnica também suscita inúmeros aspectos éticos que devem ser ainda bastante discutidos. Entretanto, mesmo em face dos problemas inerentes ao uso de uma nova terapia, tal técnica parece bastante promissora e deve levar ao estabelecimento de uma metodologia, trazendo novas esperanças para aqueles que aguardam há tempos na fila dos transplantes.
Pecuária e Indústria
Há até pouco tempo, os pecuaristas dispunham de poucos métodos para produzir animais com características físicas desejadas. Para aumentar a produção de leite ou acelerar o crescimento corpóreo, utilizava-se o cruzamento seletivo ou ainda hormônio de crescimento. Porém, o cruzamento seletivo é extremamente lento e dispendioso, além de ser um processo que não garante os resultados desejados, e o uso de hormônios é altamente criticado, uma vez que deixa resíduos no produto animal consumido pelo homem. As novas técnicas de biologia molecular tornaram possível a introdução de características desejáveis nos animais, em menos tempo e com mais precisão. Como exemplo, citamos a geração de vacas transgênicas que dão mais leite ou leite com menos lactose ou com menos colesterol, porcos e bovinos que produzem mais carne, ovelhas com mais lã. Também há experimentos que tentam desenvolver porcos e outros animais resistentes a doenças como a gripe influenza. No entanto, conhecem-se poucos genes que conferem resistência a doenças em animais domésticos.
A indústria mundial vem utilizando cada vez mais as novas tecnologias de transgênese, a fim de desenvolver produtos para os mais diversos fins. A indústria farmacêutica, por exemplo, aplica um processo denominado “humanização de camundongos” para a utilização desses modelos animais no desenvolvimento de novas drogas. Por meio desse processo, um gene é retirado do genoma do animal pela técnica de knockout e, em substituição, um gene humano é inserido pelo método de adição gênica. Essa técnica deve facilitar enormemente o desenvolvimento de novos medicamentos, barateando os custos e diminuindo o tempo para uma nova droga chegar às farmácias.
Outra importante aplicação da transgenia animal é a produção de animais conhecidos como biorreatores. Estes são geralmente animais domésticos de médio e grande porte, utilizados para a produção de proteínas recombinantes humanas de grande interesse biológico e comercial, como enzimas, hormônios e fatores de crescimento. Em geral a proteína de interesse é expressa no leite do animal, tornando sua produção mais barata e eficiente.
Em 1997, o primeiro bovino transgênico, a vaca Rosie, produzia leite enriquecido com a proteína humana lactoalbumina. Esse leite transgênico é mais nutritivo para humanos que o leite natural, e poderia ser introduzido na alimentação de crianças com carência de nutrientes específicos. Há também pesquisas em curso voltadas para a produção de leite transgênico contendo as proteínas necessárias para o tratamento de doenças como fenilcetonúria, enfisema hereditário e fibrose cística. Por exemplo, o Instituto A. I. Virtanen, da Finlândia, gerou um bovino contendo um gene cuja proteína correspondente promove o crescimento de hemácias em humanos.
Em razão do impacto e da complexidade ética da criação de animais transgênicos para o consumo humano, a Comissão do Codex alimentarius (Lei alimentar ou Código alimentar, em latim), estabelecida conjuntamente pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação) e pela OMS (Organização Mundial da Saúde), está trabalhando em colaboração com vários países, dentre eles o Brasil, com o objetivo de criar normas de aplicação internacional visando a segurança de alimentos produzidos a partir desses animais.
Recentemente foi aprovada pela Agência Européia de Medicina a produção pioneira de antitrombina humana pela empresa americana GTC Biotherapeutics, valendo-se de cabras transgênicas como biorreatores. O novo medicamento se chama Atryn e será comercializado no próximo ano na Grã-Bretanha e em outros países europeus. A antitrombina é uma proteína presente no sangue com propriedades anti-coagulantes e antiinflamatórias, que pode ser utilizada no tratamento de portadores de uma doença genética rara conhecida como deficiência hereditária de antitrombina. A deficiência de antitrombina torna seus portadores vulneráveis a tromboses, que se caracterizam pela formação ou desenvolvimento de coágulos sangüíneos. Pelo fato de a antitrombina ser purificada do sangue humano, uma grande vantagem dessa nova tecnologia é evitar contaminações através do material dos doadores. Além dessa proteína, a mesma empresa já possui outros produtos que deverão em breve ser colocados no mercado, dentre eles a antitripsina alfa-1 humana recombinante, usada no tratamento de certas formas de enfisema, e uma nova vacina transgênica contra a malária. A empresa holandesa Pharming deverá produzir várias proteínas no leite de vaca para tratamento de doenças como o Rhucin, um inibidor de C1 esterase recombinante para o tratamento de angiedema hereditário; e a lactoferrina humana, uma proteína com propriedades antiinflamatórias, além de fibrinogênio e colágeno. Em 2001, dois cientistas da Nexia Biotechnologies, do Canadá, introduziram genes responsáveis pela produção de proteínas de teia de aranha nas células das glândulas mamárias de cabras lactentes. As cabras começaram então a produzir a seda no leite e, através da extração e manufatura dos fios de polímeros do leite, desenvolveu-se um material leve, flexível e resistente que poderia ser utilizado na confecção de uniformes militares, fios de microssutura para cirurgia e cordas de raquete de tênis.
No Brasil, nosso grupo de pesquisa, em colaboração com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Universidade de Brasília (UnB) e o Hospital de Apoio de Brasília, produziu no leite de camundongos transgênicos o fator IX humano, uma proteína responsável pela coa-gulação do sangue. Essa proteína é ausente nos hemofílicos, dificultando a coagulação nos portadores da doença. As pesquisas iniciais foram realizadas em camundongos, mas o objetivo final dos pesquisadores da Embrapa é desenvolver vacas clonadas transgênicas expressando o gene humano para esse fator no leite.
Outra instituição de ensino e pesquisa brasileira que tem se destacado no uso de animais para produção de proteínas humanas modificadas é a Universidade Estadual do Ceará, que visa produzir cabras transgênicas expressando no leite o fator de estimulação de colônias de granulócitos (G-CSF), uma proteína utilizada para estimular a produção de glóbulos brancos e recrutar células-tronco da medula óssea. A G-CSF é usada no tratamento de pacientes com sistema imunológico debilitado.
O Futuro da Transgênese As alterações genéticas animais desenvolvidas ao longo das últimas três décadas provocaram uma grande revolução no campo da biologia, permitindo a análise de vários aspectos da função gênica in vivo. As pesquisas biomédicas baseadas nas alterações genéticas na modelos animais oferecem esperança para a cura das principais doenças que afligem a humanidade. O uso de animais transgênicos em pesquisas é um aspecto central na direção dessa concretização e, além disso, oferece a possibilidade de reduzir o número de animais nas experimentações.
Portanto, o uso apropriado dos modelos de animais transgênicos propicia as ferramentas necessárias para o desenvolvimento da ciência, com grande potencial para gerar benefícios altamente significativos nos campos médico, biotecnológico e comercial.
Entretanto, apesar de todas essas vantagens conferidas por essa técnica revolucionária, muitos ainda relutam em aceitá-la. Por exemplo, esse tipo de ciência é visto por alguns como uma interferência na ordem “natural” das coisas. Porém, transferências de genes entre espécies às vezes ocorrem na Natureza. Outros oponentes receiam que a proliferação dos organismos geneticamente modificados tenha conseqüêcias globais nefastas. No entanto, até o momento não existe qualquer indício que apóie esse temor. Como pesquisadores dessa intrigante área do conhecimento, e em consonância com a comunidade científica, acreditamos que o homem pode e deve extrair vantagens das novas tecnologias disponíveis, se as devidas precauções forem tomadas, de modo a melhorar a qualidade de vida das pessoas.