Fonte CEPEA

Carregando cotações...

Ver cotações

Frustrada, Sadia revê seus planos de expansão

<p>Empresa enfrenta agora o desafio de encontrar alternativas para continuar a crescer.</p>

Redação (24/07/06)- Frustrado o plano de se tornar uma grande multinacional brasileira de alimentos por meio da aquisição do controle da concorrente Perdigão, a Sadia enfrenta agora o desafio de encontrar alternativas para continuar a crescer. Sem uma opção que se compare à Perdigão no mercado, a saída, acreditam analistas, é adquirir empresas menores por aqui ou investir em unidades de produção no exterior – como a companhia fará na Rússia, onde começará a construir uma fábrica ainda neste ano.

O próprio presidente do conselho de administração da Sadia, Walter Fontana Filho, afirma que, se houver oportunidade, a empresa fará novas aquisições. Mas, se isso não ocorrer, continuará crescendo organicamente e tocando seus projetos internacionais.

Na sexta-feira, a Sadia anunciou ter revogado “definitivamente” sua oferta para comprar a Perdigão – que rejeitou duas propostas de preços na semana passada – e informou que sua estratégia de crescimento será mantida. “Podemos adquirir outras empresas, fazer parcerias ou construir novas fábricas”, reitera o diretor-financeiro da Sadia, Luiz Murat. A empresa, que está investindo R$ 850 milhões este ano em um complexo agroindustrial no Mato Grosso, também fará um aporte de US$ 70 milhões em uma unidade de processamento de carne de frango e de carne suína em Kaliningrado, um enclave russo.

A aquisição de outras empresas no Brasil, porém, pode não ser um caminho fácil, já que há poucos ativos atraentes no mercado. Possíveis alvos como Avipal e Doux-Frangosul, por exemplo, têm a desvantagem de ter a maior parte de suas operações no Rio Grande do Sul, onde a oferta de grãos já é escassa e o risco de uma eventual contaminação pela gripe aviária é maior devido à proximidade com as regiões de aves migratórias, potenciais portadoras do vírus.

“A Avipal não é um ativo interessante [para a Sadia comprar] pois está em uma área com maior risco de problemas sanitários”, diz Rafael Weber, analista da Geração Futuro. Ele acrescenta que na região Centro-Oeste, onde a Perdigão tem o complexo industrial de Rio Verde e constrói uma fábrica em Mineiros, ambos em Goiás, há ainda a vantagem da disponibilidade de grãos.

“Não há empresas para comprar no Brasil, do jeito que a Sadia gostaria. A alternativa é construir unidades de processamento nos mercados de destino ou entrar em outras áreas de negócios”, diz um especialista. Ele lembra que a Sadia sempre se preocupou em diversificar as operações, e que isso pode ser intensificado. A própria Perdigão adquiriu recentemente a Batávia, forte em lácteos.

O fato é que Perdigão era a “empresa dos sonhos da Sadia” – e continua sendo, como admite Murat – porque permitiria a esta última avançar no mercado externo (e também no interno), com fôlego para concorrer com grandes players internacionais como a Tyson Foods, que há anos ensaia entrar no Brasil, e a Cargill, que adquiriu a Seara no fim de 2004.

Mas a recusa da Perdigão – capitaneada pelos fundos de pensão, que detêm 49,5% do capital da social da empresa – enterrou, pelo menos por enquanto, os planos da Sadia de criar uma gigante com receita líquida de R$ 12 bilhões anuais, que se tornaria a segunda maior empresa de proteína animal do mundo. “Não existe possibilidade de fazer outra oferta”, garante Walter Fontana. A da semana passada foi a quinta tentativa de unir as duas concorrentes.

No dia 17, a Sadia divulgou uma oferta pública para aquisição do controle da Perdigão, pagando R$ 27,88 por ação, ou R$ 3,723 bilhões pela empresa. Os fundos Previ, Petros, Fapes, Valia, Sistel, Real Grandeza, Previ -Banerj, PSPP e a WEG Participações, que detêm 55,38% do controle, rejeitaram o lance. Uma nova proposta apresentada na quinta-feira, de R$ 29 por ação (R$ 3,88 bilhões), também foi rechaçada por esses acionistas, que vêem em R$ 35 por ação um patamar mais razoável para uma eventual negociação. Na sexta, a Sadia jogou a toalha.

A empresa poderia ter novamente aumentado a oferta, que ainda estava ligeiramente abaixo do valor econômico estimado para o negócio e a partir do qual a aquisição deixaria de ser interessante. Mas tirou o time de campo. Segundo Fontana, isso porque os acionistas da Perdigão “demonstraram claramente que não gostariam que continuássemos. Eles não gostaram de não ter sido consultados antes”.

Assim, a primeira experiência de oferta hostil no mercado de capitais brasileiro acabou tendo um saldo não muito animador. Não pelo fracasso da tentativa, mas pelo que veio à tona na forma como a Perdigão reagiu à proposta. “Eles invocaram um acordo do votos dos acionistas, válido por cinco anos”, diz Fontana. Quando a Perdigão anunciou que iria pulverizar seu capital em bolsa, no Novo Mercado da Bovespa, esse acordo havia sido compreendido muito mais como uma garantia aos novos acionistas minoritários de que a empresa teria continuidade numa gestão que estava sendo muito bem-sucedida nos últimos anos.

A percepção deixada agora ao mercado é que pouco mudou na empresa depois da venda de ações: no momento da decisão, prevaleceu o bloco de controle dos grandes acionistas da Perdigão, que detêm 55,38% do capital. Na prática, funcionou um acordo de acionistas como o de qualquer S.A. Os minoritários não tiveram chance de avaliar o mérito da proposta feita pela concorrente. “O que nós vimos é que Novo Mercado não é sinônimo de boa governança”, afirma Fontana. Em contrapartida, diz, a Sadia deu tag along a seus acionistas no ano passado e, ao apresentar a proposta pela Perdigão, informou ao mercado que seus acionistas estavam dispostos a ser diluídos no capital da nova empresa que surgiria da aquisição.

Questionado sobre o que deu errado na tentativa de comprar a Perdigão, Walter Fontana é enfático e diz que “não deu errado” e que num processo como esse “sabe-se que tudo pode acontecer”. Apesar da evidente decepção, ele afirma estar motivado para “seguir em frente” e afirma que apenas uma coisa o aborreceu durante o processo: ter perdido o sono algumas noites. “Para a Sadia, a oferta pela Perdigão foi um aprendizado e acho que o foi para todo o mercado. Entendemos que nossa proposta foi de vanguarda”, afirma.

Procurada para comentar a desistência da Sadia, a Perdigão limitou-se a informar que seu plano estratégico de crescimento e de internacionalização segue inalterado. A companhia, cujas ações registraram queda de 5,43% na sexta-feira na Bovespa com a desistência da Sadia, tornou-se um ativo mais caro pelo menos no curto prazo, acreditam analistas.

E se a Perdigão pode passar a ser ainda mais assediada por grupos estrangeiros a partir de agora, o mesmo vale para Sadia, diz um executivo de um banco. Ele observa que a empresa, que tem valor de mercado de quase R$ 4 bilhões, está capitalizada com cerca de R$ 2 bilhões em caixa e que por isso mesmo está mais atraente e pode passar de caçadora à caça.