Da Redação 03/06/2005 – Leis e regras de biossegurança voltaram a ser alvo de controvérsia em tribunais brasileiros. Pela primeira vez desde que entrou em vigor, em 24 de março deste ano, a nova Lei de Biossegurança foi questionada por decisão judicial.
O juiz Roberto Wanderley Nogueira, da 1 Vara da Justiça Federal de Pernambuco, declarou, na última sexta-feira, a inconstitucionalidade de alguns aspectos da nova lei n 11.105. Além disso, ao julgar uma ação civil pública movida pelo Instituto do Meio Ambiente (Ibama) contra a Associação Avícola de Pernambuco (Avipe), Nogueira determinou o embargo da importação de 400 mil toneladas de milho geneticamente modificado da Argentina.
A operação havia sido permitida em 4 de abril pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Na semana passada, foram desembarcadas 27 mil toneladas em Recife. Hoje, outras 26 mil toneladas chegam à cidade.
A batalha teve outro capítulo ontem. Em resposta ao recurso da Avipe, o desembargador Marcelo Navarro, do Tribunal Federal Regional da 5 Região, restabeleceu a permissão para a importação de milho e considerou a constitucional a nova lei. A ação do Ibama pedia a rotulagem do milho transgênico e a proibição de seu desembarque no Porto do Recife. A decisão, ainda um efeito suspensivo, deverá ser julgada por outros dois desembargadores federais do TRF na próxima semana.
Mas o questionamento da constitucionalidade da nova lei, entretanto, permanece em aberto. O juiz Nogueira invocou o princípio da precaução e descreve possíveis riscos de contaminação do meio ambiente para argumentar contra a legalidade da Lei de Biossegurança. Segundo ele, a lei deveria restringir-se à pesquisa e manipulação de material geneticamente modificado. “O dispositivo extrapola abertamente o poder regulamentar previsto na Constituição Federal”, escreveu. O juiz cita o artigo 225 da Carta para justificar sua decisão. “Não se pode confundir pesquisa e manipulação de material genético com o seu consumo e, menos ainda, sua comercialização”.
A Advocacia-Geral da União (AGU) informou ontem que estuda, em conjunto com o Ibama, formas de recurso contra a decisão da primeira instância. O governo, porém, já tem uma linha de ação. “Não tem cabimento o Ibama questionar a importação se a CTNBio já havia autorizado. Agora, exigir a rotulagem confere com as diretrizes do governo”, diz Johaness Eck, subchefe de Ação Governamental da Casa Civil.
O presidente da Avipe, Antônio Corrêa de Araújo, disse que o setor “precisa de tranqüilidade” para trabalhar e que tem autorização para fazer as importações. “É complicado querer levantar polêmica num assunto que já está resolvido”, afirmou. “Deixamos de trabalhar para pensar em política e nos defender em tribunais”. Segundo ele, os produtores do estado sofrem com a escassez de matéria-prima para fabricar rações de aves. “Precisamos de 50 mil toneladas por mês. Do contrário, nossas 18 milhões de aves podem ficar sem ter o que comer”, afirmou.
O advogado da Avipe, José Paulo Cavalcanti Filho, afirmou que a ação do Ibama não tem respaldo em suas atribuições. “E mesmo que tivesse, o juiz tomou um decisão que nada tem a ver com o objeto da ação”, disse. Segundo ele, o Ibama incluiu o pedido de proibição do desembarque depois de ter apresentado a ação inicial.
A antiga Lei de Biossegurança e as decisões da CTNBio tem sido alvo de disputas judiciais desde 1998, quando a comissão decidiu liberar o plantio e a comercialização da soja “Roundup Ready” da multinacional americana Monsanto. Organizações não-governamentais questionaram na Justiça a decisão até 2003, quando o governo decidiu liberar a soja transgênica por meio de medidas provisórias.