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Grãos

Colheitas de soja contrastam na América do Sul

Enquanto o Brasil está prestes a bater um recorde na produção de soja, a Argentina terá sua pior safra em mais de duas décadas

Colheitas de soja contrastam na América do Sul

Os países da América do Sul, que respondem por cerca de 55% da oferta mundial de soja, estão experimentando diferentes expectativas de colheita nesta safra. Enquanto o Brasil está prestes a bater um recorde na produção do grão, a Argentina terá sua pior safra em mais de duas décadas. 

Os contrastes de rendimentos decorrem dos efeitos do La Niña. No geral, a produção de soja da América do Sul ainda deve superar o ano anterior, mas em menor extensão do que se pensava inicialmente. As consequências de uma maior safra de soja na América do Sul, aliadas ao potencial de uma maior safra de soja nos Estados Unidos no outono, podem tender a pressionar os preços para baixo – tendência já evidente no mercado de commodities em 2023, que pode se acentuar no próximo próximos meses.

Diferentes Efeitos do La Niña

As projeções colocam a produção combinada de 2022-2023 no Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai em 6.887 milhões de bushels, um aumento de 416 milhões de bushels (6%) em relação à safra passada. A safra de soja da América do Sul teria sido maior não fosse a forte influência do La Niña. Eventos de La Niña favorecem o aumento das chuvas no norte do Brasil e a diminuição das chuvas no extremo sul do Brasil, Argentina e Uruguai. A queda das chuvas neste ano fez com que o extremo sul do Brasil, Argentina e Uruguai passassem por uma seca.

Aumento da produção na América do Sul em 2022/23

América do Sul produção de soja

Os efeitos do La Niña nesta temporada foram mais concentrados no sul da América do Sul, afetando o extremo sul do Brasil, Argentina e Uruguai. O Paraguai, quarto maior exportador de soja do mundo, foi poupado nesta temporada. Segundo dados da Câmara dos Exportadores e Comerciantes de Cereais e Oleaginosas (Capeco), o Paraguai deverá produzir 367 milhões de bushels, mais que o dobro da safra passada. Essa estimativa representa uma recuperação em relação ao ciclo anterior, quando a safra de soja do Paraguai caiu quase 60%, para 147 milhões de bushels, o menor nível da última década. O Paraguai exporta mais da metade da soja que produz e sua economia depende fortemente dessas exportações.

Por outro lado, a produção de soja no Uruguai deverá ser apenas um terço da produção do ano passado devido aos efeitos devastadores da seca extrema. Segundo dados do Ministério da Pecuária, Agricultura e Pesca do Uruguai (MGAP), a produção prevista é de 37 milhões de bushels, uma queda de 63% em relação à safra 2021/22. A soja é o segundo produto mais importante exportado pelo Uruguai em termos de receita.

O Oceano Pacífico esteve na fase La Niña de agosto de 2020 a fevereiro de 2023. Três anos-safra consecutivos com condições de La Niña são relativamente raros. Essa sequência tripla ocorreu apenas três vezes desde 1950. Nos últimos 30 anos, os dados mostram uma forte relação entre La Niña e baixa produtividade de soja na Argentina, mas nenhuma correlação no Brasil. A variação geográfica da produção brasileira de soja limita os efeitos do La Niña em relação à Argentina, conforme mostrado nas seções a seguir.

Produção de discos no Brasil

O Brasil, maior produtor e exportador mundial de soja, tem previsão de produção recorde de 5,564 milhões de bushels nesta temporada, um aumento de 21% em relação ao ciclo anterior, quando uma seca afetou a safra nos estados do sul. As projeções para o ciclo atual seguem otimistas principalmente pela recuperação da produtividade à tendência histórica (52 alqueires por acre em média) e pela expansão de 5% da área cultivada em relação à safra passada, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

A safra brasileira de soja está em andamento e deve abastecer o mercado global nos próximos meses. Cerca de 70% da área de soja foi colhida até 25 de março, ante 76% há um ano, segundo dados da Conab. Chuvas constantes nos estados do Centro-Oeste e Nordeste, comportamento climático esperado em um ano de La Niña, provocaram o atraso na colheita, principalmente em fevereiro.

Embora chova bastante na maioria dos estados produtores de soja, tem havido falta de chuva no estado mais ao sul do Brasil, o Rio Grande do Sul. O estado sofreu uma forte seca pelo segundo ano consecutivo. A safra de soja está projetada para ser menor do que a média dos últimos cinco anos. 

O Rio Grande do Sul responde por cerca de 15% da produção de soja no Brasil. Apesar das perdas no extremo Sul, os ganhos de produtividade no Centro-Oeste e Nordeste devem compensar. No Mato Grosso, o maior estado produtor do país, os rendimentos médios têm sido de cerca de 55 acres por alqueire.

As exportações brasileiras de soja em 2023 devem ser maiores do que o inicialmente projetado. A previsão é de um recorde de 3,391 milhões de bushels, 17% acima dos 2,892 milhões de bushels em 2022, segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais. A projeção para o processamento interno de soja está no patamar inédito de 1.929 milhões de bushels para 2023, um aumento de 3% em relação a 2022. As exportações de óleo e farelo de soja também devem crescer, porque a Argentina, maior fornecedor mundial das duas commodities, enfrenta uma seca intensa .

Os estoques globais de soja permanecem historicamente baixos, embora a colheita do Brasil esteja fazendo grandes reabastecimentos para os suprimentos globais. Os preços da soja continuam em queda no mercado brasileiro por conta da expectativa de uma safra recorde. 

O ritmo de vendas dos agricultores brasileiros melhorou recentemente em resposta à valorização do dólar americano em relação ao real e à necessidade dos produtores de abrir espaço em seus silos para os próximos meses, quando a segunda safra de milho (safrinha) será colhida.

Seca reduz produção na Argentina

A Argentina, terceiro maior produtor mundial de soja, deverá colher 919 milhões de bushels na atual safra. Nas últimas duas décadas, a produção de soja na Argentina foi em média de cerca de 1.600 milhões de bushels, sem tendência significativa, com um máximo de 2.256 milhões de bushels na safra de 2015. A produção esperada na próxima safra seria a menor em mais de duas décadas e 40% menor que a safra anterior (ver Figura 3).

Argentina deve ter a menor produção de soja em 20 anos

Figura 3 - Projeção de soja da Argentina

 

Desde o plantio da soja, as projeções de produção de soja divulgadas pelas bolsas locais, Bolsa de Grãos de Buenos Aires e Bolsa de Valores de Rosario, diminuíram mensalmente. Com o terceiro evento consecutivo de La Niña, os Pampas centrais argentinos estão passando por condições climáticas desfavoráveis sem precedentes: a precipitação está em mínimos históricos, houve geada precoce em fevereiro e ondas de calor no final de fevereiro e março. A colheita está prestes a começar e as estimativas de produção estão 45% abaixo das projeções iniciais para a safra.

Nos últimos 20 anos, apenas na seca extrema de 2008/2009 a produtividade da soja ficou abaixo dos valores projetados para a safra atual. Espera-se que cerca de 15% das plantações de soja não sejam colhidas este ano. A soja da segunda safra plantada depois do trigo está enfrentando condições mais severas do que a soja da primeira safra.

Esta situação terá um impacto significativo nas exportações da Argentina. A Argentina é um player importante no mercado internacional de soja: é o terceiro maior exportador de grãos de soja e o primeiro em óleo de soja e farelo. Os produtos de soja representam mais de 30% do valor das exportações totais da Argentina. China, Índia e União Europeia são os principais compradores da soja argentina. 

A importância da Argentina como fornecedor internacional cairá abruptamente e a demanda será atendida por outros países exportadores. Além disso, a Argentina pode ter que importar mais que o dobro da quantidade de soja em relação aos anos anteriores, principalmente do Paraguai e do Brasil, para continuar abastecendo clientes externos regulares com farelo e óleo de soja.

Os preços da safra de soja cultivada em Rosario, Santa Fé, estão acima da média dos últimos cinco anos, mas o preço caiu 20% nos últimos dois meses por causa da demanda fraca e da expectativa de produção recorde no Brasil. Atualmente, os agricultores argentinos aguardam um anúncio do governo para restabelecer uma taxa de câmbio preferencial dólar-peso argentino (“dólar-soja”) para as exportações de soja na época da colheita. Essa medida pode ser implementada para incentivar a venda de derivados de soja assim que estiverem disponíveis.

Resumo

No geral, a produção de soja da América do Sul deverá exceder o nível do ano anterior, mas em menor extensão do que o previsto anteriormente. Ao contrário da safra passada, os efeitos do La Niña nesta safra foram mais concentrados no extremo sul da América do Sul – Argentina, Uruguai e Rio Grande do Sul, no Brasil. 

Essas regiões vêm sofrendo uma forte seca desde o início da safra. Consequentemente, a Argentina espera a menor produção dos últimos 20 anos. Isso terá um impacto significativo nas exportações da Argentina. Em contraste, o Brasil deverá produzir uma safra recorde de soja nesta temporada como resultado do clima favorável na maioria das regiões produtoras de soja. Portanto, as exportações de soja do Brasil em 2023 devem ser maiores do que o esperado.

Fonte de dados e referências
Bolsa de Cereais de Buenos Aires. Relatórios e Dados. Buenos Aires, Argentina. https://www.bolsadecereales.com/estimaciones-informes

Cabrini, S., J. Colussi e G. Schnitkey. “ Terceiro La Niña consecutivo? O que esperar da produção de soja nos Estados Unidos, Brasil e Argentina .” farmdoc daily  (12):75, Departamento de Economia Agrícola e do Consumidor, Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, 23 de maio de 2022.

Capeco, Câmara dos Exportadores e Comerciantes de Cereais e Oleaginosas. Siembra Área, Produção e Rendimento. Assunção, Paraguai. Março de 2023. https://capeco.org.py/area-de-siembra-produccion-y-rendimiento/

Conab, Companhia Nacional de Abastecimento. Séries Temporais de Culturas. Produção de Soja. Brasília, Brasil. Março de 2023. https://www.conab.gov.br/info-agro/safras/serie-historica-das-safras/itemlist/category/911-soja

Janzen, J. “ Recapitulação WASDE: Menores perspectivas de exportação de milho dos EUA, mas são baixas o suficiente? ”  farmdoc daily  (13):45, Departamento de Economia Agrícola e do Consumidor, Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, 13 de março de 2023.

MGAP, Ministério da Pecuária, Agricultura e Pescas. Dados e Estatísticas. Montevidéu, Uruguai. https://www.gub.uy/ministerio-ganaderia-agricultura-pesca/datos-y-estadisticas/datos

SAGPya, Secretário de Agricultura, Pecuária e Pesca da Argentina. Estimativas Agrícolas. Buenos Aires. Março de 2023. https://datosestimaciones.magyp.gob.ar/reportes.php?reporte=Estimaciones