Da Redação 18/09/2003 – De acordo com o levantamento da safra 2002/2003, realizado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a produção brasileira de grãos deve alcançar 120,2 milhões de toneladas. Nessa história de superação de recordes, a soja foi a grande protagonista pelo terceiro ano consecutivo, comemorando um aumento de 52,2 milhões de toneladas. A expectativa é de que esse enredo se repita nos próximos anos.
Enquanto, por um lado, as autoridades federais e regionais se esforçam para expor os ganhos que podem acompanhar o avanço da fronteira agrícola sobre o cerrado, existem os que afirmam que a atividade não ocorre, na maioria das vezes, conforme os princípios da sustentabilidade e acaba provocando sérios prejuízos, direta e indiretamente, como desmatamentos, destruição de habitats naturais, queimadas, erosões, empobrecimento do solo, riscos de desertificação e contaminação de mananciais e bacias hidrográficas pelo uso excessivo de agrotóxicos.
Os ambientalistas entendem que o país deixa para segundo plano a preservação das áreas agricultáveis, motivado pela ambição de participar de forma marcante das negociações externas relativas à soja. Para o internacionalista Fábio Albergaria, que defendeu dissertação de mestrado na Universidade de Brasília (UNB) sobre as variáveis gerais percebidas na relação entre meio ambiente e comércio externo, o poder executivo também se torna responsável por esse comportamento na medida em que não considera o cerrado como patrimônio nacional, assim como acontece com a Floresta Amazônica, Mata Atlântica e Pantanal mato-grossense.
“Ele está excluído da proteção assegurada pelo artigo 225, parágrafo 4 da Constituição Federal”, esclarece Albergaria, lembrando que, depois da mata atlântica, o cerrado é o bioma que mais sofre degradação. Após os últimos 50 anos de ocupação intensiva, estima-se que cerca de 80% da sua área original tenha sido modificada. Desses, 40% conserva parcialmente suas características naturais e os outros 40% restantes já as perderam completamente, seja pelo aumento da sua produção, ação que exige o uso sempre reforçado de matérias-primas, seja pelo acúmulo de resíduos lançados na natureza. Dos seus 196.776.853 hectares, correspondentes a 2 milhões de quilômetros quadrados ou a um quarto do território brasileiro, restam apenas 20% preservados, cobertos por vegetação característica da região e do pantanal.
Dados do Fundo Mundial para a Natureza (WWF) referentes ao ano 2000 confirmam que, para cada quilo de grão produzido, perdem-se, em média, 10 quilos de terra fértil, ocasionando um desperdício anual de 1 bilhão de toneladas de solo produtivo, resultante da mecanização e do manejo inadequados, em associação com o processo de desmatamento. O planeta desgasta 400 mil hectares de solo por ano. As formas de compensar a perda de fertilidade dos solos do cerrado são citadas por Albergaria como problema que deve ser solucionado, já que estão, em termos gerais, diretamente ligadas à utilização indiscriminada de insumos químicos, considerados agentes de desequilibro muito incidentes nos tão denunciados episódios de agressão ambiental. “Hoje, existem mecanismos interessantes de condução dos trabalhos agrícolas, como o uso de inseticidas naturais e a adoção do plantio direto, que substitui queimadas e preserva parte da vegetação nativa”, explica o internacionalista, comentando que algumas concepções difundidas nacionalmente estão enganadas ao julgar espaço por sua aparência árida e hostil.