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Carne 'sem carne'

Cientistas avançam em pesquisas para produzir carne sem animal. Produto poderia reduzir doenças de origem alimentar, como salmonela e vaca louca.

Carne 'sem carne'

Desde que Winston Churchill, primeiro-ministro britânico durante a Segunda Guerra Mundial, previu que seria possível criar peitos e asas de frango sem ter que utilizar a própria galinha, a ciência obteve alguns avanços interessantes sobre o tema. Depois de descobrir como desenvolver nuggets em laboratório, os cientistas chegaram à conclusão de que em breve será possível produzir carne sem a necessidade da criação de aves, gado ou suínos.

Costeletas de porco ou hambúrgueres cultivados na mesa de pesquisa poderiam eliminar problemas de saúde por contaminação, que ocorrem com frequência nos dias de hoje, além de contribuir para a preservação ambiental, degradada pela exploração pecuária industrial. No entanto, de acordo com o site científico Live Science, a pesquisa também poderia abrir possibilidades que preocupam o planeta do ponto de vista da ficção científica: qual o limite da curiosidade humana e até que ponto ela avançaria para desenvolver um tipo de carne?

Cada vez mais, bioengenheiros estão criando nervos, coração e outros tecidos em laboratório. Recentemente, cientistas anunciaram o desenvolvimento do tecido de um pênis artificial em coelhos. Embora essa pesquisa seja destinada para tratamentos com pacientes, o biomédico Marcos Post, da Universidade de Maastricht, na Holanda, e seus colegas, sugerem que a mesma também poderia ajudar a alimentar a crescente demanda mundial por carne.

Benefícios significativos – Os pesquisadores apontaram que o crescimento do músculo esquelético em laboratórios poderia ajudar a combater uma série de problemas:

– Evitar o sofrimento dos animais, reduzindo a produção e o abate de gado;

– Reduzir drasticamente as doenças de origem alimentar, tais como a doença da vaca louca, as salmonelas ou germes, acompanhando o crescimento de carne em laboratórios;

– A pecuária ocupa atualmente 70% de todas as terras agrícolas, correspondendo a 30% da superfície terrestre do mundo, segundo a Organização para a Agricultura e a Alimentação (FAO, sigla em inglês Food and Agriculture Organization) das Nações Unidas. Centros de pesquisa obviamente exigiriam menores espaços físicos;

– A pecuária é responsável por 18% das emissões de gases causadores do efeito estufa, mais do que todos os veículos em terra, acrescentou a FAO. Lembrando que os próprios animais também fazem parte dos poluidores, reduzir suas populações ajudaria ainda a aliviar o aquecimento global.

Necessidade de intensificação – As células-tronco são consideradas a fonte mais promissora para o desenvolvimento de carne, conforme os cientistas. Eles explicaram que as células satélite – células-tronco musculares naturais responsáveis pela regeneração em adultos – seriam uma saída. Já as células-tronco embrionárias também poderiam ser utilizadas, dependendo de como caminharem as preocupações éticas que envolvem o tema.

Para crescer carne em laboratório a partir de células satélite, os pesquisadores falam em aprofundar as técnicas atuais de engenharia de tecidos, onde as células-tronco são muitas vezes incorporadas em três matrizes sintéticas tridimensionais biodegradáveis, que apresentam os ambientes físicos e químicos que as células precisam para se desenvolver adequadamente. Outros fatores-chave envolvem estimular eletricamente e mecanicamente os músculos, ajudando-os a amadurecer em busca de pistas moleculares.

Até agora, os cientistas conseguiram fazer crescer apenas pequenos pedaços de músculo esquelético – cerca de metade do tamanho da unha do dedo maior do pé. No entanto, de acordo com o que os pesquisadores afirmaram na última edição da revista científica Trends in Food Science & Technology, a criação de um bife exigiria produção em maior escala.

Pensamentos obscuros – Mesmo que a intenção dos cientistas seja a de optar pela produção de carne de vaca, porco, frango ou peixe, há muito tempo a ficção científica brinca com possibilidades obscuras de comercializar carne clonada. Na antiga série de histórias em quadrinhos Transmetropolitan, de Warren Ellis e Darick Robertson, supermercados e redes de fast food vendem carnes de golfinho, peixe-boi, baleia, filhotes de foca, macaco, rena e até humana. “Em princípio, poderíamos colher células progenitoras do cadáver de seres humanos e estimular seu crescimento”, disse Post. “Se não analisarmos o contexto de canibalismo, não existe nenhuma razão para não comer este tipo de carne. Você não está matando o próximo, ele já estaria morto”, afirmou.

Evidentemente, produzir carne de ser humano é algo difícil de não gerar polêmicas e grandes perturbações no mundo, mas ainda assim, Post sugere que o marketing poderia superar tais obstáculos. “Se cada pacote de carne cultivado atualmente tivesse o comunicado ‘Cuidado, animais foram mortos por esse produto’, eu posso imaginar uma mudança cultural gradual”, afirmou o especialista. “Claro que ainda temos um longo caminho a percorrer para fazer um produto se tornar competitivo, mesmo que remotamente, com os alimentos de hoje em dia”, disse.