A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) pedirá ao governo federal que recorra à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra barreiras não tarifárias que impedem a ampliação do comércio de carne bovina com a União Europeia (UE). Segundo Otávio Cançado, secretário-executivo da entidade, a indústria chegou ao limite das negociações com os europeus para a habilitação de novas propriedades – além das 1,7 mil já aptas a fornecer animais à exportação ao bloco econômico – e forneceu todas as informações sanitárias pedidas, sem que houvesse uma sinalização pelo aumento do comércio.
Cançado, que está na Ucrânia, afirmou que terá reuniões nos próximos dias com representantes do Itamaraty e do Ministério da Agricultura para avaliar os passos diplomáticos e comerciais a serem tomados. O primeiro deles é o chamado Especific Trade Concern, ou “”Preocupação Comercial Específica””, uma consulta à OMC para que, na prática, o órgão pressione de forma “amigável” a UE a ampliar o comércio.
“Vamos levantar isso na OMC, esperar o resultado da consulta; se ainda assim não for favorável ao Brasil, é partir para o painel (contencioso)”, admitiu Cançado. “Chegamos ao limite, entramos com todas as informações, adequamos todo o nosso sistema e, mesmo assim, nos tratam com o que se caracteriza, do ponto de vista comercial, de discriminação, e o que a gente chama também de “undo delay” que é uma demora desnecessária”, completou.
A União Europeia foi, até 2007, um dos maiores e melhores clientes de carne bovina in natura do Brasil e para onde sempre foram os cortes mais nobres, com maior valor agregado. Naquele ano, os 27 países do bloco econômico responderam por 195.201 toneladas, ou 15% do volume total exportado, e ainda por uma receita de US$ 1,08 bilhão, correspondente a 31% dos US$ 3,4 bilhões faturados à época com carnes bovinas in natura.
Mas, após várias ameaças, no final de janeiro de 2008 a União Europeia praticamente suspendeu todas as importações do Brasil, alegando questões sanitárias. O bloco condicionou o retorno do comércio à habilitação prévia de propriedades pelo serviço sanitário da Comissão Europeia. Produtores e a indústria culparam o lobby de irlandeses, concorrentes do Brasil no mercado de carne bovina, para que as barreiras não tarifárias fossem impostas.
Os impactos no comércio foram diretos e as exportações do Brasil para a UE de carne bovina in natura caíram para apenas 36.218 toneladas e o faturamento desabou para US$ 270 milhões no ano passado. O volume e a receita corresponderam, respectivamente, a apenas 4% e 7% da carne exportada e do faturamento de 2008 do setor.
Após o embargo, o governo brasileiro negociou e conseguiu apenas uma abertura gradual do mercado, sob regras sanitárias impostas pelos europeus. Hoje apenas cerca de 1,7 mil fazendas estão aptas a fornecer animais para a indústria exportadora com destino à UE, volume considerado insuficiente. As exportações para a UE tiveram um avanço em 2009 e atingiram, até outubro, 18% da receita total e a 11% do volume de carne bovina in natura, ainda longe da participação até 2007.
“Há um lobby interno, a questão não é sanitária, é simplesmente política, econômica e de protecionismo comercial, pois tem meia dúzia de pessoas na Comissão Europeia que ficam dando canetada e evita que o Brasil seja beneficiado com uma abertura maior, mesmo depois de ter feito o dever”, criticou Cançado. “”Em vez de tomar conta do quintal deles, ficam querendo tomar conta do nosso, que está muito mais arrumado””, completou.
Cançado ampliou ainda as críticas, com acusações sobre a sanidade dos animais consumidos pelos europeus, sujeitos, segundo ele, ao mal da vaca louca. “Enquanto os burocratas da Comissão Europeia ficam sentados comendo carne da Irlanda, do Reino Unido, da Alemanha e da Holanda com vaca louca, negam acesso à carne brasileira”, concluiu.