Em relatório sobre oferta e demanda de grãos no mundo divulgado ontem, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) confirmou parte das expectativas de mercado e reduziu suas projeções para a produção de grãos na América do Sul. Mas foram cortes considerados modestos pelo mercado. Garantiram a alta das cotações de soja e milho na bolsa de Chicago, é verdade, mas deixaram entre analistas a sensação de que o pior ainda pode estar no vir.
O USDA divulga esses relatórios todos os meses. Os de fevereiro e março são os que mais põem a América do Sul sob os holofotes, já que as colheitas no Hemisfério Sul da safra em tela estão definidas, e abaixo da linha do Equador os trabalhos estão a pleno vapor. Diante das quebras provocadas pelo La Niña, os números de ontem eram particularmente esperados. E, diante de ajustes não tão profundos, quem vive dessas estimativas agora anseia pelo quadro que será traçado em março.
Noves fora, o fato é que o tabuleiro global da soja vai ficando mais vazio. Com a nova rodada de reduções das estimativas, o USDA passou a calcular a colheita em Brasil, Argentina e Paraguai, os maiores exportadores sul-americanos, em 185,3 milhões de toneladas, 20,5 milhões a menos que o previsto em agosto, às vésperas do início do plantio em Mato Grosso.
Para o Brasil, maior produtor e exportador de soja do mundo, a colheita foi revista pelo USDA 134 milhões de toneladas nesta temporada 2021/22, 5 milhões a menos que o projetado em janeiro e volume 10 milhões de toneladas mais baixo que o vislumbrado em agosto. Se confirmado, a queda ante 2020/21 será de 2,9%. Mas, no país, a maior parte das consultorias estima menos de 130 milhões de toneladas.
“O órgão americano tradicionalmente não faz alterações muito drásticas de um mês para o outro”, lembra a analista Daniele Siqueira, da AgRural, que faz parte do time que espera novo ajuste para baixo do USDA em março.
Com os cortes já feitos, o órgão agora prevê a produção mundial de soja em 363,9 milhões de toneladas, 8,7 milhões a menos que o estimado em janeiro. Os estoques finais em 2021/22 recuaram de 95,2 milhões para 92,8 milhões de toneladas, enquanto os analistas ouvidos pelo “Wall Street Journal” esperavam 91,3 milhões. Para os EUA, país que ocupa a segunda posição no rankings de produção e de exportação, não houve retoques.
E as correções realizadas tiveram pouco efeito na relação global entre oferta e demanda, porque o órgão também ajustou para baixo a projeção para o consumo de soja. Com isso, os estoques finais globais previstos agora representam 25,1% da demanda consolidada em 2021/22. Em janeiro, o resultado da conta era 25,4%. Abaixo de 30%, considera-se normalmente que o quadro é de relativo aperto.
Assim, o contrato da soja para março, o mais negociado atualmente, subiu 1,64% (25,75 centavos de dólar) ontem em Chicago, para US$ 15,9475 o bushel. A posição seguinte, para maio, teve alta de 1,46% (23 cents), a US$ 15,9550 o bushel.
No bandeja do milho, o USDA reduziu em 1,6 milhão de toneladas sua previsão para a safra global de milho em 2021/22. O corte mais expressivo foi feito na previsão para o Brasil, onde a estimativa do departamento americano caiu de 115 milhões para 114 milhões de toneladas – o mercado esperava 113 milhões.
“Como a produção de milho do Brasil é muito dependente da safrinha, e como o calendário de milho da Argentina é muito longo, neste momento fazia mais sentido [o USDA] mexer mais na soja do que no milho”, afirma Daniele Siqueira.
O USDA prevê uma safra global de milho em 1,205 bilhão de toneladas, ante 1,206 bilhão de toneladas de janeiro. A demanda caiu em 1 milhão de toneladas, para 1,195 bilhão de toneladas. A projeção de estoques globais recuou 0,28%, para 302,2 milhões de toneladas, com relação estoque e uso de 25,1% – mesmo índice observado em janeiro. A
pesar de o relatório ter sido um pouco mais “neutro” para o cereal, o milho encontra suporte na “disputa” de área com a soja na safra 2022/23 dos EUA. Fevereiro é o mês em que os agricultores americanos definem suas áreas no ciclo seguinte, e a cotação do cereal tem sido puxada pelo temor do mercado de que mais hectares sejam destinados à soja. Com isso, o contrato do milho para maio subiu 1,89% em Chicago (12 centavos de dólar), a US$ 6,460 o bushel.
No caso do trigo, o USDA fez apenas ajustes pontuais no relatório de oferta e demanda. A perspectiva é que 2021/22 termine com o menor volume de estoque global em cinco anos. A estimativa é de 278,21 milhões de toneladas, frente previsão anterior de 279,95 milhões. Com os novos números do órgão americano, os contratos do trigo para maio tiveram alta de 0,89% (7 centavos de dólar), a US$ 7,910 o bushel.