A China adiou inesperadamente a publicação dos dados do terceiro trimestre relativos a seu Produto Interno Bruto (PIB), um dia antes da data prevista para sua divulgação. A medida é incomum no momento em que o Partido Comunista que governa o país realiza uma reunião política crucial.
Os números do PIB, assim como vários outros indicadores econômicos importantes — vendas no varejo, vendas de imóveis e investimento em ativos fixos, todos programados para serem divulgados hoje — foram marcados como “adiados” no site do Escritório Nacional de Estatísticas da China.
Os dados sobre os preços de imóveis residenciais em 70 grandes cidades, previstos amanhã, também foram adiados, segundo o site da agência de estatísticas, que não informou o motivo e nem deu uma nova data de divulgação. Uma funcionária do departamento, contatada por telefone, confirmou o adiamento e mencionou “questões de organização do trabalho”, sem especificá-las.
Ela disse que não sabia quando os dados serão divulgados e que as novas datas serão publicadas no site. O adiamento da divulgação dos dados do PIB coincide com o Congresso do PC, que começou no domingo e deve terminar com o anúncio de um terceiro mandato para o presidente Xi Jinping.
Ontem, uma autoridade do principal órgão de planejamento econômico da China, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, disse que a economia “melhorou significativamente” no terceiro trimestre do ano, apesar de vários problemas, como os novos surtos de covid-19 e as inundações e secas que assolaram partes do país durante o período.
Economistas privados estimam que PIB chinês cresceu 3,5% ao ano no terceiro trimestre, uma aceleração se comparado ao 0,4% registrado no segundo trimestre, quando Xangai, a cidade mais próspera do país, ficou paralisada por lockdowns durante dois meses.
Na sexta-feira, a Administração Geral de Alfândegas da China já havia adiado a publicação dos dados mensais sobre o comércio exterior. Também nesse caso as autoridades não deram explicações.
De modo geral, os economistas ficaram surpresos com o adiamento na divulgação dos dados. Muitos disseram que não lembrar de um precedente direto na China. Normalmente, reuniões importantes na China não levam a atrasos na publicação de dados.
Embora muitos economistas tenham dúvidas há bastante tempo sobre a qualidade dos dados econômicos da China, a falta de um indicador oficial fundamental aumenta as dificuldades para investidores e empresas mundiais que buscam medir a profundidade da desaceleração econômica do país.
As viagens para o continente, que costumavam ser um instrumento básico dos economistas, foram muito restringidas na maior parte dos últimos três anos, e alguns indicadores privados da atividade foram excluídos nos últimos anos.
Nas últimas semanas, a agência reguladora de valores mobiliários da China solicitou às instituições financeiras, como as empresas chinesas do JPMorgan Chase e do Goldman Sachs, que se abstivessem de comentar assuntos politicamente sensíveis.
Nos últimos meses, comentários sobre os impactos das restrições relativas à covid tornaram-se controversos. Ainda assim, muitos economistas ficaram bastante intrigados, dado que a atividade empresarial parecia estar em recuperação, depois de um segundo trimestre particularmente fraco.
Bruce Pang, economista-chefe para a Grande China da Jones Lang LaSalle, disse que a supressão da divulgação dos dados programada para hoje não significa necessariamente que a economia esteja em más condições. “Dados de alta frequência que temos observado, apontam que a economia da China se recuperou rapidamente no terceiro trimestre”, disse Pang. “É possível que as autoridades queiram estimular o mercado a se concentrar na mensagem-chave passada pelo Congresso do partido.” A expectativa era de que os dados do PIB mostrassem uma recuperação modesta da atividade econômica depois de os lockdowns terem afetado fortemente o crescimento no segundo trimestre. “Não existe nenhuma possibilidade de que fossem piores”, disse Shuang Ding, economista-chefe para a Grande China do banco Standard Chartered em Hong Kong.
Ele descreveu a decisão do governo de adiar a divulgação dos dados como algo “realmente estranho”. À exceção de 2020, quando a pandemia da covid-19 começou, os economistas acham provável que a economia da China em 2022 cresça ao ritmo anual mais lento desde 1990, sob o peso de sua política severa para conter a covid e de uma retração cada vez mais profunda do setor imobiliário.
O Banco Mundial prevê que o crescimento deste ano só chegue a 2,8% e seja de 4,5% em 2023. Em março, os líderes chineses tinham definido uma meta oficial para o PIB deste ano de cerca de 5,5%, mas quatro meses depois admitiram na prática que o país não conseguiria cumprir esse objetivo, dado o custo do duro lockdown de Xangai.
O crescimento do PIB no primeiro semestre de 2022 foi de apenas 2,5%. Zhang Hengyu, investidor independente em Xangai que concentra em ações chinesas negociadas nas bolsas do país, disse que parou de prestar muita atenção aos dados econômicos mensais nos últimos tempos, já que Pequim deu poucos sinais de que amenizará as restrições relativas à covid ou socorrerá as incorporadoras imobiliárias em dificuldades.
“A tendência geral é bastante clara e não importa por quanto tempo se adie a publicação dos dados”, disse Zhang. “Muitos investidores têm pouca confiança de que o governo possa estabilizar o crescimento.”
A agência não deu uma nova data para a divulgação ou uma explicação para o atraso, que aconteceu horas depois de Zhao Chenxin, vice-chefe de planejamento estatal da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, ter dito a repórteres que a economia estava pronta para uma recuperação no terceiro trimestre após as medidas de apoio terem entrado em vigor.
Zhao, no entanto, reconheceu os desafios para a economia, prejudicada pela rígida política de “covid zero” de Pequim, uma crescente crise no mercado imobiliário e a desaceleração global. O raro atraso ocorre depois que a Administração Geral de Alfândegas também adiou a divulgação de dados do comércio do país na sexta-feira, sem justificativa.