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Meio Ambiente

Mudança no clima: vamos liderar ou seremos perseguidos?

Por Pedro de Camargo Neto, pecuarista e agricultor, consultor, Dr. Eng.-USP, ex Secretario de Produção e Comercio do MAPA, Ex Presidente da Sociedade Rural Brasileira

Mudança no clima: vamos liderar ou seremos perseguidos?

O setor agrícola, globalmente, emite cerca de 18% dos gases, com destaque para o uso de fertilizantes nitrogenados — 4,1%

Os debates sobre o clima evoluem para a Conferência do Clima — COP26, a ser realizada em Glasgow, Escócia, em novembro. Os esforços vão na direção de limitar o aumento da temperatura global a 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais. Os países desenvolvem políticas visando zerar a emissão líquida dos gases efeito estufa (GEE), a métrica na questão do aquecimento global.

As emissões para a atmosfera são apresentadas em toneladas de gás carbônico, ou seu equivalente de outros gases que também possuem efeito estufa. Hoje as emissões são estimadas em mais de 50 bilhões de toneladas, crescimento de cerca de 40 % em relação a década de 90. A descarbonização é urgente.

A China é a maior emissora, mais do que o dobro do EUA, seguida pela Indonésia e Rússia. As emissões se relacionam com o nível de renda, hábitos de consumo, tamanho da população, além claro da fonte de energia. China e Índia, os mais populosos, são porem dispares na emissão de GEE. A China emite muito mais do que a Índia por habitante. O Brasil é um pouco mais do que a Índia.

Não faltam equívocos nessa matemática, mas há indicação de uma direção. O Brasil não está entre os grandes emissores por habitante ou no total. Tornamo-nos, porém um foco de críticas.

“O enfrentamento do desmatamento ilegal, hoje basicamente em invasões de terras públicas, precisa ocorrer de imediato””
Contextualizando: as principais fontes de emissão em termos globais de GEE: tipo energia na produção industrial — 24%; no transporte — 16 %, principalmente rodoviário -12 %; nos edifícios residenciais e comerciais -17 %. O setor agrícola, globalmente, emite cerca de 18%, com destaque para o uso de fertilizantes nitrogenados — 4,1%; dejetos e fermentação entérica na produção animal — 5,8%.

Caminhar no sentido de zerar o saldo líquido das emissões de GEE representa um desafio, mais do que isso, uma política de desenvolvimento para as próximas décadas. Novas tecnologias na indústria, na locomoção de cargas e pessoas, nas edificações e na produção de alimentos exigirão pesquisa. Representam uma oportunidade.

Os números apresentados para o Brasil, que exigem maior estudo e atenção, indicam que a maior emissão de GEE ocorre na mudança e uso de terras e florestas seguido da produção agropecuária. Nas edificações chega a ser irrelevante.

“O Código Florestal, legislação pioneira no mundo na questão, não é cumprido”

Problema brasileiro

Nosso problema é o desmatamento, em claro descontrole, pois na região da Amazônia cresceu 9,5 % de 2019 a 2020, mesmo com Exército na região. O enfrentamento do desmatamento ilegal, hoje basicamente em invasões de terras públicas, precisa ocorrer de imediato. A pactuação dos compromissos de recuperação ambiental previstos no Código Florestal é relevante, pois no mínimo implica na regeneração das áreas de preservação permanente. Somente acontecerá em sua plenitude através da validação dos CAR- Cadastro Ambiental Rural, processo com enorme atraso. O Código Florestal, legislação pioneira no mundo na questão, não é cumprido.

A agricultura brasileira já caminha firme na produção de baixo carbono, se destacando a nível mundial nesse quesito. Propostas que começam a ser trabalhadas no exterior colocam ao agricultor um novo produto, o carbono. A área de pastagens do Brasil é imensa, bastante degradada, o que representa importante potencial para a absorção de carbono. Faltam políticas que viabilizem esse desenvolvimento.

“Transferências financeiras devem ser vistas como penalização aos que não caminhem no rumo desejado e não facilitação para o não cumprimento do interesse de todos”

A questão dos dejetos e fermentação entérica na produção animal requer ainda maior rigor científico. Atualmente a transformação das toneladas do metano em equivalente gás carbônico ignora que o metano tem um ciclo de vida totalmente diverso do gás carbônico. Certamente um ponto que exigirá dedicação. A métrica da pecuária extensiva é totalmente diferente da intensiva existente nos países desenvolvidos.

No exterior o foco é no carro elétrico, embora ainda omitam esclarecer de onde virá a energia para carregar as baterias, o que altera radicalmente a emissão de GEE. O Brasil foi pioneiro no carro a álcool. Continuamos com o biodiesel. Somos o país da biomassa. Resta muito ainda a ser desenvolvido, porém está comprovada nossa capacidade de fotossíntese, a origem de muita energia. Temos tudo para continuar à frente.

A energia eólica teve crescimento no Nordeste ocupando importante lugar na atual matriz energética. A energia solar fotovoltaica tem amplo espaço para crescer até pelas nossas coordenadas geográficas.

Preparatória para a COP26 os países apresentaram suas metas climáticas, Contribuição Nacional Desenvolvida (NDC). O Brasil, como líder que era na questão, perdeu a oportunidade de pressionar os grandes emissores. Alterou, fragilizando a proposta, a metodologia para comparações entre valores de 2005 e reduções futuras que utilizou no passado. Pior, propôs negociar a antecipação da meta de zerar emissões líquidas mediante compensação financeira de países que assim não conseguirem. Transferências financeiras são previstas, porém, devem ser vistas como penalização aos que não caminhem no rumo desejado e não facilitação para o não cumprimento do interesse de todos na difícil questão climática.

A fragilidade representada pelas ilegalidades na região Amazônica nos prejudica muito. Precisamos chegar em Glasgow liderando as oportunidades para o desenvolvimento e nunca na defensiva na questão do desmatamento.