Quando avaliamos a capacidade de digestão de um suíno terminado, que facilmente absorve nutrientes das mais variadas matérias-primas, não imaginamos que momentos antes de seu nascimento seu trato gastrointestinal (TGI) era estéril. Essa esterilidade reside no fato de que todos os nutrientes durante a vida uterina são providos pela placenta da porca. Imediatamente após o parto, membranas que protegiam o feto são rompidas e o compartimento gástrico dos animais é colonizado por bactérias presentes nas secreções vaginais, fecais e dérmicas da mãe. Esses micro-organismos, somados a outros adquiridos com o tempo, formam a microbiota normal do intestino dos animais. O organismo precisa estabelecer rapidamente o equilíbrio entre essa microbiota e os mecanismos de controle para os patógenos que fatalmente entrarão em contato com o suíno ao longo de sua vida.
O nascimento é um momento crucial para o leitão, pois nas horas subsequentes esse animal deverá ingerir colostro em quantidade e qualidade para crescer e responder adequadamente aos desafios do ambiente. O colostro materno é rico em imunoglobulinas (principalmente IgG e IgA), hormônios, fatores de crescimento, antimicrobianos, enzimas, entre outros compostos. Essa riqueza de nutrientes e fatores imunes proporcionam ao suíno tempo necessário para desenvolvimento gradual de suas próprias defesas, sobrevivência e desempenho satisfatório principalmente na primeira semana de vida. No momento do desmame, a suplementação de ingredientes lácteos e proteínas de elevado valor biológico ganha marcada importância, devido à repentina falta de imunoglobulinas e outros nutrientes do leite da porca, que naturalmente tornam o leitão deficiente em combater desafios sanitários.
Adicionalmente à falta do leite, o desmame imprime drásticas mudanças na arquitetura do intestino dos jovens leitões, engatilhadas principalmente também pela mudança para dieta sólida como única fonte de nutrientes e o próprio estresse da mudança de ambiente e estabelecimento de hierarquia. Para amenizar essa situação, células especializadas do intestino produzem muco, este, por sua vez, atua como camada protetora do epitélio intestinal, protegendo o epitélio contra os ácidos produzidos para digestão e a passagem de bactérias para dentro do tecido. A suplementação de aminoácidos, particularmente a treonina, influencia a produção de muco e, consequentemente, na manutenção da defesa do trato gastrointestinal. Estudos demonstraram que o intestino utiliza grandes quantidades desse aminoácido vindo da dieta, e animais deficientes dessa suplementação podem apresentar problemas quanto à integridade intestinal.
Quanto mais o sistema imune de um animal é exposto a agentes nocivos, maior quantidade de muco deverá ser produzida, mais epitélio deverá ser rearranjado e maior número de células imunes deverão ser recrutadas. Entretanto, toda essa convergência de ações simultâneas tem um custo metabólico para o animal e isso se reflete em situações reais dos sistemas de produção de suínos. Um exemplo que ilustra essa situação é a melhor conversão alimentar de animais criados em instalações com melhor status sanitário. Além disso, essa situação não se restringe aos animais que apresentam quadro clínico de alguma disfunção (diarreia, tosse, afecções locomotoras, etc.), pois aqueles clinicamente normais podem apresentar queda de desempenho como reflexo de uma ativação prolongada e silenciosa da imunidade.
As primeiras semanas de vida dos animais são extremamente desafiadoras e a elaboração das dietas para recém-nascidos e desmamados deve atender às diferentes mudanças fisiológicas, bem como respeitar a construção da atividade imune do animal. Vale a pena ressaltar que embora a nutrição contribua significativamente para a integridade intestinal do suíno, outros parâmetros devem ser atendidos para garantia da saúde do intestino dos animais. Paralelamente ao aporte nutricional, medidas de biosseguridade e utilização de protocolos de vacinação e manejo adequados são essenciais para o correto funcionamento do TGI dos leitões.