Graças a importantes desenvolvimentos tecnológicos e melhor informação sobre a efetividade de ventos e da incidência da luz solar, a utilização destas fontes renováveis vêm tendo notável desenvolvimento. Em 2014, a energia eólica contribuiu com perto de 2% da geração de energia elétrica do país e a energia solar, particularmente a fotovoltaica, poderá mesmo supera-la, em alguns anos.
No entanto, o futuro da geração de energia elétrica a partir de fontes de energia sujeitas a fortes variações ou mesmo descontinuidades está fortemente condicionado à viabilidade de compensá-las. Uma oferta intermitente, de porte significativo, apresenta problemas operacionais que acarretam custos sistêmicos, nem sempre computados na avaliação de sua competitividade frente a outras opções de oferta e na definição de seu preço.
No Brasil, até agora, considerou-se que a interrupção de suprimento seria normalmente compensada por aumento de geração hidrelétrica, a ser posteriormente “devolvida”, o que nem sempre é factível ou econômico, pois a afluência aos reservatórios que tenham sido deplecionados para atender àquela geração não prevista pode ser insuficiente. Alternativamente, a compensação tem de ser feita por geração termelétrica.
A intermitência pode ser atenuada pela integração desses geradores em grandes sistemas interligados, que abranjam áreas diversificadas. Alguns mercados europeus, nos quais a energia eólica atende mais de 20% de seus requisitos de geração estão integrados com sistemas de maior porte. Entretanto, essa compensação é aleatória e tende a ficar mais precária à medida que a participação dessas, dentre as demais fontes, aumenta. Por enquanto, nos países onde tiveram maior desenvolvimento, como na Alemanha, a grande base termelétrica também compensou a falta de ventos ou de insolação.
Sobretudo quando essas fontes assumirem um papel mais expressivo, a necessidade de considerar sua intermitência na comparação com outras fontes, de disponibilidade mais regular, ficará mais evidente e necessária, pois sua compensação, além de ter valor, geralmente tem custo, ou de combustível ou de uso do armazenamento das hidrelétricas. Portanto, o desenvolvimento de acumuladores de energia, por apresentarem a forma mais efetiva de compensação, assume prioridade tão elevada quanto a busca de maiores eficiências e menores custos dos equipamentos destinados à sua utilização.
Sistemas de acumulação podem ser de várias naturezas e sua definição depende de condições locais e da quantidade de energia a ser estocada. A energia solar fotovoltaica, em particular, que é sujeita a um ciclo diário, pode ser valorizada mediante sua associação a baterias, reservatórios de água gelada ou de ar comprimido, usinas hidrelétricas de acumulação por bombeamento, hidrogênio eletrolítico, volantes de inércia, etc. Já as usinas solares térmicas podem acumular calor localmente, em sais fundidos. Todavia, enquanto a primeira é altamente modulável, podendo ser utilizada em escala doméstica, a segunda requer instalações de grande porte.
Atualmente a maior atenção está mais voltada para o uso de baterias. Recentemente, a Tesla anunciou baterias de íons de lítio para uso doméstico ou comercial, capazes de acumular 7 kWh ou 10 kWh, a um custo médio de US$ 350 por kWh armazenado, além do custo de instalação. Esse preço é semelhante ao das baterias de carros elétricos. Empresas de distribuição de energia elétrica usam baterias de sódio, de grande capacidade, para melhorar a qualidade do seu fornecimento, a preços bastante inferiores, da ordem de US$ 200 por kWh armazenado. Por outro lado, além de haver outras tecnologias, é provável que a difusão do uso de veículos elétricos a bateria e das redes inteligentes crie uma grande capacidade de acumulação de energia a ser disponibilizada, ainda que por períodos relativamente reduzidos.
O armazenamento encarece a energia, pois ao seu custo original soma-se o do sistema de armazenamento, o valor das perdas na acumulação da energia e na sua devolução aos consumidores, além do aumento de reserva girante. Para custos de capacidade de acumulação de US$ 350/kWh, e admitindo que o uso da acumulação seja diário, durante todo o ano, estima-se que o acréscimo de custo da energia seria da ordem de R$ 0,5/kWh (juros de 5%, amortização em 10 anos). Embora supere os preços de energia firme oferecida nos leilões recentes, pode ser interessante para consumidores atendidos em média tensão, pois é inferior à diferença entre as tarifas de ponta e de fora de ponta que lhes são aplicadas, na maioria das concessionárias.
A tecnologia das baterias está avançando, de modo que provavelmente seus preços e durabilidade deverão se tornar mais atrativos. Todavia, cabe estudar outras opções no âmbito das redes de distribuição e dos sistemas geradores. Usinas hidrelétricas de acumulação por bombeamento, ou reversíveis, das quais há cerca de 130 mil MW instalados no mundo, constituem uma opção importante, a ser explorada. No Brasil, principalmente nas regiões Sudeste e Sul, a topografia é particularmente favorável. Diversas localidades apresentam quedas de centenas de metros e, para regularização diária ou semanal, os volumes dos reservatórios, superior e inferior, não precisariam ser tão expressivos que causassem impacto ambiental significativo.
O custo de usinas dessa natureza varia em função da altura da queda e da área de seus reservatórios. De R$ 4 mil a R$ 5 mil por kW instalado seria uma faixa de custos representativa. Admitindo que uma usina gerasse energia durante as 6 horas de maior demanda, em todos os dias do ano, a energia proveniente dessa forma de acumulação seria encarecida de um valor da ordem de R$ 0,2/kWh (amortização em 30 anos, juros de 5% e perdas de 20%). Na comparação com outras modalidades de armazenamento, a hidrelétrica reversível tem a vantagem de compensar oscilações de carga ou de oferta, graças à energia cinética da massa girante de seus alternadores e turbinas.
Esses valores, ainda que aproximados, mostram que a regularização do suprimento das fontes intermitentes tem valor e que seu custo não é negligenciável. Portanto, sem prejuízo da sua utilização, é necessário acrescentar ao custo direto do kWh produzido os custos incorridos para compensar sua intermitência. Desconsiderá-los prejudicará a alocação de recursos para a expansão da oferta e aumentará seu custo, em prejuízo dos consumidores e do meio ambiente.
Pietro Erber é Diretor do Instituto Nacional de Eficiência Energética