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Agroindústrias

Produção de carne de frango na China desafia frigoríficos

Segundo Sérgio Rial, a Marfrig pretende dobrar produção de frango na China.

Produção de carne de frango na China desafia frigoríficos

Um dos mercados mais promissores para as carnes brasileiras, a China está no foco dos frigoríficos nacionais, mas produzir naquele país não é uma estratégia unânime, ao menos por ora. Enquanto multinacionais americanas como Tyson Foods e Cargill investem na produção local de carne de frango, entre as brasileiras, apenas a Marfrig tem produção e processamento na China. Responsáveis por 70% das exportações de carne de frango do Brasil, BRF e JBS ainda não têm operações no país asiático.

Em estágio mais avançado que os concorrentes, a Marfrig herdou uma operação com mais de 20 anos de atuação na China em 2010, por meio da aquisição da americana Keystone – hoje, a divisão de food service da empresa brasileira. Com faturamento de US$ 450 milhões por ano na China, a Keystone tem uma planta de processamento no país e pretende dobrar a produção de frango em território chinês até 2020, disse ao Valor o CEO da Marfrig, Sergio Rial.

A tendência é que a Marfrig – que não atua mais em frango no Brasil – não seja a única companhia brasileira a produzir na China. “Esse é um movimento que provavelmente as empresas brasileiras vão fazer”, afirmou o diretor de mercados da União Brasileira d e Avicultura (Ubabef), Ricardo Santin. Segundo ele, produzir no país asiático é fundamental para garantir mercado.

“As operações são pequenas e funcionam muito mais para abrir a porta para as exportações”, disse. Em 2013, o Brasil vendeu 526 mil toneladas de carne de frango para a China (incluindo Hong Kong), que foi a segunda maior importadora do produto nacional em volume, só atrás da Arábia Saudita. Em receita, foram US$ 525,9 milhões, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) compilados pela Ubabef. Isso fez do país o quarto mais importante em receita cambial para o Brasil, que exportou quase US$ 8 bilhões em 2013.

Um especialista em avicultura, que prefere não se identificar, avalia que as empresas brasileiras estão atrasadas em sua estratégia para a China. “É preciso estar na China produzindo. Estando lá é mais fácil importar do Brasil”, argumentou.
 
Apesar de reconhecer a importância de produzir na China, a JBS, maior empresa de proteína animal do mundo, não planeja fazer investimentos no país no curto prazo, afirmou Wesley Batista, presidente da companhia. “A demanda da China por proteínas vem crescendo de forma grandiosa nos últimos dois anos e é claro que estamos com a antena ligada, mas a curto prazo não está nos planos ter produção na China”, afirmou em entrevista ao Valor. Segundo ele, ter produção em território chinês é um plano “para cinco a 10 anos”.

O empresário argumenta que “no momento em que a JBS está, [ter produção na China] não é prioridade”, acrescentando que a empresa acaba de “fazer uma aquisição relevante, a Seara”. De acordo com Batista, “há bastante coisa para ser feita por aqui” e a JBS focará investimentos em regiões onde já atua. “Temos espaço para crescer ainda nos mercados onde já estamos. O foco é expandir valor agregado”, acrescentou.

Embora não pretenda ter produção de frango nem processamento na China num horizonte de curto prazo, a JBS deve investir no fortalecimento dos escritórios comerciais no país asiático, ressaltou Batista. Atualmente, as representações estão localizadas em Xangai e em Hong Kong, e a JBS analisa a viabilidade de ter um escritório em Pequim.

A maior parte das exportações da JBS para a China tem como origem as unidades da companhia na Austrália (carne bovina e de cordeiro) e nos Estados Unidos (frango). Do Brasil, a JBS exporta carne bovina e de frango ao país asiático. No terceiro trimestre de 2013, o que a JBS exportou para a Grande China (inclui China, Hong Kong e Vietnã) representou 20,4% do total de exportações do período (de US$ 2,95 bilhões).

A BRF, que sob o comando de Abilio Diniz tem batido repetidamente na tecla da internacionalização, também não produz na China. Em outubro de 2012, quando Abilio ainda não havia assumido a companhia, o então vice-presidente de mercado externo da BRF Antonio Augusto de Toni, disse em entrevista que a empresa iniciaria no fim do 2013 a construção de uma unidade de processamento de carnes de aves e suínos em terras chinesas.

Na ocasião, Toni – que hoje só atua como consultor da BRF após uma grande reestruturação nos cargos de direção – afirmou que o investimento seria realizado em parceria com a chinesa Dah Chong Hong (DCH), controlada pela estatal Citic Pacific, com a qual a companhia brasileira tem um uma joint venture na venda e distribuição de produtos da BRF na China desde o começo de 2012. A construção de uma fábrica para agregar valor à carne in natura exportada para a China já era intenção das parceiras antes mesmo de a joint venture ser oficializada.

No entanto, após a chegada de Abilio à BRF, os planos parecem ter mudado. Segundo fontes a par do tema internacionalização da companhia, a BRF teria a intenção de rever a joint venture com a DCH e estaria considerando fazer uma parceria na venda e distribuição com a gigante Cofco, que atua em diferentes segmentos. Procurada, a BRF preferiu não comentar o tema.

Se há consenso entre as empresas brasileiras sobre a necessidade de produzir carne de frango na China – no curto ou no médio prazo -, a estratégia de produção ainda divide as companhias.

Diferentemente do que ocorre no Brasil, a produção da Keystone na China não é baseada totalmente em granjas integradas, nas quais a empresa fornece a ração e os animais que serão engordados pelos produtores integrados. “Ao invés de 100% da integração, temos 30% de granjas próprias e 70% de alianças com grandes granjeiros”, afirma Rial. Independentes, os grandes granjeiros assumem os ‘riscos’ da aquisição de grãos, mas podem lucrar mais com um aumento de preços do frango. Em contrapartida, a Keystone usa menos capital de giro no negócio.

Conforme o CEO da Marfrig, a Keystone trabalha hoje com 120 granjas, distribuídas entre as regiões de Shenzhen e Shandong, que produzem cerca de 150 milhões de aves por ano. Até 2016, a empresa pretende elevar esse número para 220 milhões de aves por ano e em 2020, para cerca de 300 milhões de aves.

O modelo adotado pela Keystone diminui a intensidade dos investimentos para essa ampliação, segundo Rial. “Se eu tivesse 100% das granjas, o ônus para a indústria seria quase insustentável”, afirmou. Ao todo, a Marfrig prevê investir US$ 30 milhões para ampliar a produção de frango até 2016.

A estratégia adotada pela Keystone difere bastante do modelo aplicado pelas americanas Tyson e Cargill. Conforme recente reportagem do “The Wall Street Journal”, a Tyson está investindo “centenas de milhões de dólares” na construção de granjas próprias. A justificativa para isso é garantir as condições sanitárias da produção, uma vez que a China ainda tem muito problemas nessa questão, como o surto de gripe aviária ocorrido em 2013 evidenciou.

Wesley Batista, da JBS, concorda com a decisão da Tyson de verticalizar a produção por considerar o modelo mais seguro, tanto do ponto de vista sanitário quanto de negócio. Para Rial, no entanto, a estrutura construída em mais de 20 anos de atuação da Keystone, fornecendo produtos para redes como McDonald’s e KFC na China, garante o “controle do que está sendo produzido”. Apesar disso, a própria Marfrig já havia reconhecido na divulgação dos resultados no segundo trimestre de 2013 que o surto de gripe aviária havia prejudicado as vendas da Keystone.