Foi uma reunião breve entre duas poderosas pessoas do mercado de carne suína. O encontro entre Joseph W. Luter III, presidente da Smithfield Foods Inc., a maior processadora de carne suína do mundo, e Wan Longo, presidente do conselho da Shuanghui International Holdings Ltd., conhecido como o “açougue número um da China”, durou só 90 minutos, há cerca de sete anos.
Quando Luter recebeu Wan em seu apartamento em Manhattan, em Nova York, lançou a ideia de uma joint venture: “Nós devemos fazer algo juntos”, disse. E isso foi o começo de uma reunião bem diferente, disse Luter em uma entrevista esta semana: a que resultou na compra, na semana passada, da Smithfield pela Shuanghui, por US$ 4,7 bilhões, a maior aquisição chinesa de uma empresa dos Estados Unidos. “As sementes foram plantadas”, disse Luter, de 73 anos, “e às vezes demora um pouco para elas germinarem”.
O negócio que floresceu marca uma conclusão impressionante sobre a administração da família Luter na Smithfield e reflete as mudanças na indústria global de carne. O pai e avô de Luter fundaram juntos o frigorífico em 1936, em Smithfield, no Estado americano da Virgínia, e ele o transformou em um gigante global ao promover mais de 50 aquisições ao longo de três décadas.
Ao longo do caminho, Luter ganhou uma reputação de homem de negócios prático e sério, com gostos caros que incluem residências chiques na Park Avenue, em Manhattan, e em Aspen, no Colorado. Ele também foi um defensor feroz da indústria de carne suína frente às críticas de ativistas de direitos dos animais e grupos ambientalistas, ganhando apelidos nos meios de comunicação como “O Chefe do Porco” e o “Rei do Porco”.
A oferta de compra é um reconhecimento de Luter e outros diretores da Smithfield de que as perspectivas de crescimento da empresa no país estão limitadas pelas fracas vendas em um mercado maduro e consolidado, enquanto a China oferece grandes oportunidades, à medida que a crescente riqueza da sua população impulsiona a demanda por carne de porco e outras carnes.
“Eu sempre pensei que algo grande pudesse acontecer entre a China e os Estados Unidos”, afirmou Luter. “Tem muita carne suína nos EUA e muito pouca na China.”
A transação continua sujeita à análise do ponto de vista de segurança nacional pelo Comitê de Investimentos Estrangeiros nos EUA. Luter disse também que outras ofertas ainda podem surgir.
O frigorífico brasileiro JBS e o tailandês Charoen Pokphand Foods, conhecido como CP Foods, também consideraram a compra da Smithfield, de acordo com uma declaração da CP Foods na semana passada e pessoas próximas à JBS. A Shuanghui só ficou sabendo que a CP Foods e a JBS estavam interessadas na empresa americana uma semana antes da assinatura do negócio, disse uma pessoa a par do assunto. A resposta da Shuanghui foi acelerar as negociações, disse uma pessoa, e até deixou claro que desistiria da transação caso ela não fosse concluída até certa data.
Mas a JBS não está atualmente interessada em apresentar uma proposta maior, de acordo com pessoas familiarizadas com o tema. A Shuanghui não acredita que qualquer das partes cubra a oferta, disse outra pessoa a par da situação, que acrescentou que Wan poderia aumentar o valor caso apareçam outras propostas. Representantes de JBS e Shuanghui não quiseram comentar.
Luter e Wan, que cresceram em lados opostos do mundo, ajudaram a transformar modestos frigoríficos regionais em gigantes do setor.
Luter começou a trabalhar nas divisões de abate e de carga da empresa da sua família durante as férias de verão na época em que cursava a Wake Forest University. Seu pai morreu quando ele estava no último ano. Luter comprou a parte dos investidores que não eram da família para se tornar diretor-presidente em 1966, com de 26 anos de idade.
Três anos mais tarde, Luter vendeu a empresa para o Liberty Equities Corp. e logo depois foi demitido. Ele usou o dinheiro que recebeu com o negócio para criar um resort de esqui na Virgínia, mas quando a Smithfield começou a afundar, os diretores o trouxeram de volta.
Luter começou abocanhando empresas de carne suína menores. Nos anos 80 e 90, ele adotou a estratégia da indústria de frango, comprando e desenvolvendo fazendas de suínos para que a Smithfield pudesse ter controle de todas as etapas d produção da carne.
À medida que a Smithfield cresceu, Luter e sua empresa tornaram-se alvo de grupos ambientalistas e outros críticos. Ativistas dos direitos dos animais o criticaram por confinar fêmeas em cercas estreitas conhecidas como barracas de gestação. Em 1997, um juiz federal multou a Smithfield em US$ 12,6 milhões por violar a chamada “Clean Water Act” (Lei da Água Limpa) por despejar resíduos poluentes na baia de Chesapeake Bay.
Luter com frequência respondeu de forma pouco diplomática. “O pessoal dos direitos dos animais quer impor uma sociedade vegetariana aos EUA”, disse ele ao The Wall Street Journal em 2001. “A maioria dos vegetarianos que eu conheço são neuróticos.” Luter agora lamenta muitos desses comentários. “Eu fiz um péssimo trabalho” de relações públicas, disse ele.
Os preços das ações da Smithfield subiram sob o seu comando. Mas ele disse que deixou o cargo de diretor-presidente em 2006 porque estava cansado de lidar com os reguladores governamentais. “Não estava mais me divertindo.” Ele foi sucedido por Larry Pope, seu braço direito de longa data, mas manteve-se como presidente do conselho.
A proposta da joint venture apresentada por Luter a Wan foi feita quando ele ainda era diretor-presidente e envolvia a construção de uma planta em conjunto nos EUA, dedicada à produção de carne de porco para exportação para a China. A ideia não vingou imediatamente, mas, em 2009, a Shuanghui pediu para conselheiros examinarem a situação financeira da Smithfield, já tendo a intenção da joint venture em mente, de acordo com uma fonte familiarizada com o assunto. Então, em fevereiro deste ano, a Shuanghui mirou novamente a Smithfield e em meados de abril apresentou um acordo de fusão, o que desencadeou uma corrida para fechar o negócio no fim da semana passada, disse a fonte.