Na última quinta-feira, estava almoçando na praça de alimentação de um shopping, em Brasília. Três jovens, na mesa ao lado da em que eu estava, falavam sobre a manifestação programada para o final daquela tarde e diziam que dela iriam participar. Provavelmente não eram usuários de ônibus. Talvez até tenham comprado automóvel, com isenção de IPI, para congestionar mais o caótico trânsito das grandes cidades. Estavam almoçando, possivelmente sem refletir sobre a origem do alimento que consumiam.
Iriam participar de uma grande mobilização realizada na sequência de outras, todas demonstrando a força das redes sociais.
No país, milhares de pessoas foram às ruas, muitos não sabendo exatamente a razão.
Um dos meus netos tem 14 anos. Nas primeiras manifestações, assistindo aos noticiários de televisão, apoiava os manifestantes com sentimento genérico, ao tempo em que repudiava a ação dos que vandalizavam.
Vibrei porque ficava claro que ele tinha sentimento de indignação, mas não aprovava a mera bravata, que não é sinônimo de coragem.
Na última quinta-feira ele disse que iria à manifestação, em Brasília, enrolado em uma bandeira do Brasil. Fiquei preocupado, mas os familiares o desestimularam, em função de sua idade.
Não me assustam as manifestações populares. Elas resultam da democracia, na qual vivemos.
Não me preocupam as bravatas ou insânias dos que não visam a reivindicar, mas pretendem desestabilizar autoridades policiais – comprometendo suas imagens – ou até fazer psicoterapia em movimentos de massa. Os longos anos de vivência em contato com as instituições e os movimentos populares me dizem que a minoria, inconsequente ou bravateira, apenas concorrerá para aumentar a crença na necessidade de democracia e apoio às ações, mesmo policiais, que visem a evitar os excessos.
Relativamente aos movimentos reivindicatórios, sempre digo que passei por todos os lados do balcão.
Como líder de uma bancada partidária na Câmara dos Deputados, ao final do regime autoritário vigente à época, apoiei ostensivamente as primeiras greves e manifestações que ocorriam no país. Estive ao lado de sindicalistas e fui visitá-los na prisão. Visitei, ostensivamente, na UNB, estudantes que passaram a ousadia cívica da reivindicação, enfrentando os perigos. Os operários queriam melhores condições para o trabalhador. Os estudantes, melhor qualidade de ensino. Todos queriam a redemocratização do país.
Não havia redes sociais a estimular, mas propósitos bem determinados e articulação.
Como dirigente cooperativista, apoiei manifestações nas ruas, já após a redemocratização, pleiteando modificações na então vigente política cambial, bem como reivindicando melhores preços para os produtos agrícolas.
Em 1985, ou seja, logo após o início da retomada democrática, fui diretor de recursos humanos do Banco do Brasil e aí tive que negociar com bancários em greve, pois o banco não podia atender a tudo o que pleiteavam e, à época, quando o comércio era feito quase que totalmente via cheques e a instituição financeira era a realizadora da compensação – contabilidade de débitos e créditos de cheques em todo o sistema financeiro –, uma paralisação de tal atividade resultaria em situação anárquica na economia nacional.
O diálogo preponderou e os acordos foram feitos. Quando o bom senso impera, ninguém é derrotado. Reivindicantes e reivindicados sabiam o que queriam e no que podiam ceder.
Quando presidente do Banrisul, enfrentei greves. Reivindicações foram atendidas, mas informei, ao governo que integrava e aos parlamentares, que não concordaria em pagar “dias parados”, pois quem reivindica o faz com riscos e não pode transformar uma paralisação em ócio remunerado.
Posteriormente, como secretário da agricultura, enfrentei greves de fiscais e vibrei quando o Judiciário determinou que cargas de maçãs, que não podiam sair do estado por falta de autorização dos agentes públicos, fossem liberadas.
Reivindicações justas são formas de pressão e os dois lados precisam ter faixas de recuo bem estabelecidas. Por isso, entendo que os movimentos sociais são corretos.
Atualmente, vivemos uma realidade nova, pois as redes sociais mobilizam, servindo como canais para manifestação das insatisfações. Podem produzir movimentos genéricos, sem postulações mais específicas ou então pleitos multifacetados.
Tais mecanismos para convencer e mobilizar são formas novas. Assistimos, no país, ao resultado disto na última semana.
Exatamente neste ponto é que penso na imagem do agronegócio. É possível que a maioria dos manifestantes, residentes em áreas urbanas que crescem desordenadamente, tenha visão deturpada com relação a quem produz alimentos.
As entidades da cadeia produtiva agroalimentar, desde as que representam fornecedores de insumos até as do final do processo de industrialização para consumo, buscam divulgar, mas suas campanhas são limitadas.
Uma atriz de televisão, a “custo zero” em termos de responsabilidade social, fez repercutir amplamente o “veta, Dilma”, proferido em evento em que a mesma era apresentadora, com a presença da senhora Presidente da República.
Naquele momento, os produtores de alimentos queriam apenas um Código Florestal que lhes garantisse produzir com sustentabilidade.
As redes sociais, também com custo zero, repercutiram a posição da atriz, fazendo parecer que a produção de alimentos é resultado de um processo predatório e de enriquecimento indevido.
Nenhum dos manifestantes, dos milhares que foram às ruas, clamou por alimento. Eles não faltam. Podem, episodicamente, ter preços aumentados ou diminuídos.
Sou um péssimo operador dos instrumentos modernos que a informática nos oferece. No entanto, penso ter sensibilidade. Parece-me que, para divulgar a imagem correta do agronegócio e da agricultura familiar, mais importante do que campanhas com a presença de lideranças do setor, é fundamental comunicação.
Está comprovado que as redes sociais têm força. Por que não pensar em usá-las cada vez mais e organizadamente, divulgando a importância da agricultura, da pecuária e da agroindústria para o fornecimento de alimentos e agroenergia com sustentabilidade?
É possível que 95% da população urbana não saibam que a pesquisa, para gerar uma nova semente que resulta em aumento de produtividade, chega a levar 13 anos, com muito labor científico e grandes investimentos.
Parece-me que é assunto para pensar, não promovendo personalidades, mas divulgando fortemente a salutar mensagem.
Por Odacir Klein, advogado e profissional da área contábil. É sócio da Klein & Associados e coordenador do Fórum Nacional do Milho.
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