Brasil lançou medida para que pequenos produtores de energia renovável possam fornecer excedente à rede pública, mas alto custo de instalação e dos impostos espanta potenciais consumidores interessados.
Uma medida com potencial de ampliar a oferta de energia elétrica para o Sistema Interligado Nacional (SIN) e ainda incentivar a produção de energia renovável continua quase sem aplicação no Brasil, sete meses depois de ser efetivamente implementada. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), até agora apenas dois projetos foram cadastrados.
A resolução 482 da Aneel estabelece as regras gerais de acesso a microgeração e minigeração distribuídas. Ela prevê que consumidores donos de pequenas centrais de geração de energia renovável possam fornecer a energia excedente para a rede pública e, mais tarde, quando precisarem dela, receber de volta a mesma quantidade de quilowatts. Mas os altos custos para a instalação do equipamento, a falta de incentivo governamental e a cobrança de impostos acabam limitando a aplicação da medida, dizem entidades ligadas ao setor.
Energia emprestada
O modelo funciona como um empréstimo de energia elétrica feita ao sistema nacional. Qualquer usuário com potência instalada de até 1 Megawatt pode participar. Valem unidades geradoras de energia hidráulica, solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada, por meio de termelétricas de alta potência.
Daniel Vieira, especialista em regulação da Aneel explica que, quando o consumidor gera mais energia do que pode consumir, ele injeta na rede a potência excedente, sem receber pagamento por isso. Depois, quando a energia produzida pelo usuário é menor do que o necessário para o consumo, a mesma quantidade de quilowatt-hora é automaticamente compensada. O prazo para esta devolução é de 36 meses.
O sistema adotado pelo Brasil é diferente do de outros países, como a Alemanha, onde o pequeno gerador tem benefícios financeiros ao injetar energia na rede. Uma lei sancionada em 1990 no país europeu determinou que toda energia produzida a partir de fontes renováveis deve ser injetada na rede. A distribuidora é obrigada a pagar um valor mais alto por esse tipo de energia do que a fontes não renováveis.
Na Alemanha, sistema de fornecimento de energia por parte dos consumidores já funciona há muito tempo Baixa procura no Brasil
A resolução 482 entrou em vigor em 17 de abril de 2012, mas distribuidoras brasileiras tiveram 240 dias de prazo para adequar a rede, sistemas de cobrança e outros processos necessários para viabilizar a aplicação. Por isto, a Aneel considera que a medida efetivamente passou a vigorar apenas em 15 de dezembro.
Em sete meses, apenas dois projetos de compensação energética foram catalogados e publicados pela Aneel. Vieira garante que existem outros, mas ainda não há confirmação de números exatos. Já um levantamento da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), com as 18 maiores distribuidoras do país, apontou que apenas 15 processos de solicitação haviam sido feitos até abril. Para a Aneel, a baixa adesão se deve ao pouco tempo de aplicação da resolução. Para entidades do setor, o problema é outro.
“Infelizmente, esta medida mostrou que apenas uma regulamentação não é suficiente para que se seja feita alguma coisa, é necessário que haja condições para que o mercado possa se desenvolver”, analisa Leonidas Andrade, diretor do grupo setorial de sistemas fotovoltaicos da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee).
Ausência de incentivos e cobrança de impostos
Do lado do consumidor, faltam incentivos para tornar a pequena geração de energias renováveis atrativa e economicamente viável. Os custos de instalação ainda são altos, e as vantagens para o usuário não parecem claras. Andrade exemplifica com o caso da energia solar: “um sistema típico tem entre 2 e 5 kW/h de potência. Para cada kW instalado, é necessário investir em média 8 mil reais”. Isto significa que o consumidor precisa investir entre 16 mil e 40 mil reais para instalar o equipamento em casa, com base no valor médio cobrado no mercado nacional. “O brasileiro paga muito mais do que um alemão ou norte-americano pelo mesmo kW/h sobre seu telhado. Há muito imposto sobre estes produtos”, considera o representante da Abinee.
Além disso, quando o excedente de energia exportado pelos pequenos geradores para a distribuidora retorna, é cobrado PIS, COFINS e ICMS. “A tributação deverá incidir sobre toda a energia utilizada na unidade consumidora, independentemente da quantidade de energia que tenha sido injetada na rede pelo próprio consumidor. Desta forma, só ficará livre de tributação a energia que tenha sido gerada e consumida ao mesmo tempo”, enfatiza Nelson Fonseca Leite, presidente da Abradee. Andrade complementa: “A distribuidora não vai cobrar pela energia compensada, mas vai cobrar o imposto equivalente por toda aquela energia que ela mandou para você, incluindo o excedente que havia sido exportado e voltou”.
A Aneel afirma que pode apenas aplicar o modelo, com base nos objetivos de eficiência energética do país. Incentivos fiscais e outras questões ficariam a cargo de outros órgãos do governo federal. Procurado pela equipe de reportagem da DW Brasil, o Ministério de Minas e Energia não se pronunciou sobre o assunto.