Os ganhos que a BRF terá com as mudanças na gestão dos negócios podem ser até maiores do que o R$ 1,9 bilhão divulgado ao mercado, dependendo das avaliações que forem feitas das áreas industrial e de exportação, e também de caixa e investimentos. A informação é do novo presidente global da BRF, Cláudio Galeazzi.
Esse montante já é quatro vezes maior do que as sinergias estimadas inicialmente para a combinação entre Perdigão e Sadia, em 2009, e considera apenas as avaliações feitas para o mercado interno e a área comercial da empresa, segundo o executivo, que chegou à BRF para substituir José Antônio do Prado Fay.
Para se ter uma ideia das dimensões do que está em pauta, no ano passado, a BRF teve receita líquida de R$ 28,5 bilhões e lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de R$ 2,6 bilhões. Trata-se, portanto, de modificações que, se bem-sucedidas, podem mudar significativamente as margens do negócio. Nos primeiros seis meses de 2013, a empresa acumula R$ 14,7 bilhões de receita líquida e Ebitda de R$ 1,8 bilhão.
Essa magnitude ajuda a explicar por que desde o anúncio da reorganização, a BRF já ganhou mais de R$ 4 bilhões em valor de mercado – na sexta-feira (16) encerrou o pregão valendo pouco menos de R$ 49 bilhões.
Na sexta-feira Cláudio Galeazzi explicou com mais detalhes o que planeja para a BRF. Segundo ele, “muita coisa ainda não foi realizada” e a integração da companhia “vai ser acelerada”. O objetivo ambicioso da nova direção da BRF – que tem à frente do conselho de administração o empresário Abilio Diniz – é mudar o DNA da companhia, que tem quase 70 anos de vida, considerando as idades empresas originais, Perdigão e Sadia.
Segundo Galeazzi, até hoje, a empresa era guiada pela lógica industrial. Vendia-se o que era produzido. A partir de agora, o objetivo é que se fabrique o que consumidor estiver pedindo na gôndola do mercado. “A indústria produzia e empurrava para a área comercial”, afirmou. O resultado disso, disse, eram estoques elevados ou necessidade de desovar produtos a preços baixos por conta dos grandes volumes.
Esse quadro foi diagnosticado após um “mergulho”, conforme as palavras do executivo, nas áreas de vendas e comercial no mercado interno e em alguns processos. Falta ainda, segundo ele, “mergulhar” no mercado externo, na área industrial e na compra de grãos.
Questionado sobre o prazo para se mudar uma cultura de uma vida, o executivo disparou: “Normalmente, um ano. ‘A la Galeazzi’ pode dar para fazer em seis meses”, disse, mas logo ressaltando, “sem prepotência”. Apesar da velocidade que pensa em implantar essa troca cultural, ele evitar falar em prazos sobre sua permanência à frente da companhia. Garantiu que ficará o tempo que for necessário para colocar todas as modificações em andamento e também a alteração da atuação internacional.
A meta da nova direção da BRF é que esta deixe de ser exportadora para ser uma empresa global, com processamento de alimentos em outros países, visando fornecer produtos com maior valor agregado e não apenas commodities.
No mercado interno, onde estão as oportunidades já mapeadas, as medidas mais rápidas serão os esforços na área de vendas. Até agora, havia um representante para cada marca atendendo uma mesma rota. A partir da implantação das novas políticas, um mesmo vendedor oferecerá todo portfólio de produtos da companhia.
A mão de obra de vendas será redistribuída para atender novas localidades e canais, pois essa análise identificou uma “grande área branca” no atendimento – regiões onde as marcas estão praticamente ausentes. “Há canais que podem ser aprimorados, mas o maior buraco é de localidades, regiões sem atendimento”, explicou Galeazzi.
Para ele, mudanças são necessárias “ou lá na frente entraremos em uma situação crítica”. “Se você investe cada vez mais em capacidade e não se dedica a estudar como escoar essa produção, terá grande dificuldades”, acrescentou.
Com todas as alterações a serem implementadas, os quase R$ 2 bilhões previstos inicialmente são para a linha do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) – fruto de uma combinação de expansão de receita com corte de custos e despesas. Esse valor só deverá constar integralmente do resultado a partir de 2016. Até lá, será gradualmente incorporado aos números.
O executivo, conhecido por liderar reestruturações em grandes grupos, como o Pão de Açucar, evita falar em eventuais demissões na BRF em decorrência da reorganização. “Responder sobre demissão seria especular”.
Ele reconheceu ainda estar aprendendo sobre o negócio e que, aos 73 anos, presidir a BRF é um desafio. “Seria mais adequado para alguém de 50 anos”, disse. Galeazzi sabe que o ramo é cheio de imprevistos, que vão desde a volatilidade dos grãos até problemas sanitários – que podem afetar dramaticamente os negócios.
Para Galeazzi, tudo na BRF está sendo surpreendente. Principalmente, a complexidade do negócio. “Eu só soube que seria eu [o presidente global] na reunião do comitê de assessoramento de terça-feira da semana passada. Até então, eu mesmo, pessoalmente, só estava fazendo coaching dos executivos para uma avaliação.”
A outra surpresa foi o conhecimento que existe dentro da companhia. De acordo com ele, o valor das oportunidades e as demandas de cada área vieram de grupos de trabalho formados por pessoas da própria empresa. “Não foi gente de fora. Foram as pessoas daqui mesmo que fizeram tudo isso.”
Depois de enfrentar o desafio na BRF, mais uma vez, o plano de Galeazzi é aposentar-se. “Quando saí do Pão de Açúcar falei a mesma coisa e agora estou aqui. Fiquei três surfando, ou melhor, desfilando na praia de prancha e caindo e voltei para essa rotina quando o BTG me chamou”. O executivo compõe o conselho do banco, a convite do próprio fundador, o banqueiro André Esteves.