por Stephen Leahy*
O consumo e a produção de energia estão vivendo transformações radicais, mas o clima do planeta continua se dirigindo para um aumento de temperatura de 3,6 graus, afirma um informe divulgado durante a conferência sobre mudança climática da Organização das Nações Unidas (ONU), na capital da Polônia.
O Brasil desempenhará um papel crucial para acalmar a crescente sede por petróleo dos países em desenvolvimento, afirma a edição 2013 das Perspectivas da Energia no Mundo, elaborada pela Agência Internacional de Energia (AIE). A projeção chega até 2035 e estabelece que, nessa ocasião, o grosso do crescimento do consumo de petróleo e gás se mudará para a Índia e os países do sudeste a asiático e do Oriente Médio.
Apesar de, em 2035, as fontes de energia renováveis e nuclear, que emitem baixa quantidade de dióxido de carbono (CO2), estarem abastecendo cerca de 40% do crescimento da demanda mundial, as emissões de CO2 do setor energético serão 20% mais altas. E isso presumindo que os países cumprirão todos seus compromissos de redução até 2020. O Canadá, por exemplo, não o conseguirá.
É necessário que as emissões cheguem ao seu pico em 2020 e a partir daí passem a diminuir para que seja possível manter o aumento da temperatura do planeta em menos de dois graus, segundo o Informe Gap 2013, divulgado no dia 5 deste mês pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).
“Se permanecermos no rumo atual, não nos aproximaremos do objetivo de limitar o aumento a dois graus”, afirmou Maria van der Hoeven, diretora-executiva da AIE, em um comunicado que foi divulgado, no dia 12 deste mês, durante a 19ª Conferência das Partes (COP 19) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que se estenderá até o dia 22, em Varsóvia, na Polônia.
Os subsídios para combustíveis fósseis, cujo custo global chegou em 2012 a US$ 544 bilhões, são o principal estímulo para cruzar o umbral dos dois graus. Essas subvenções governamentais mantêm os preços artificialmente baixos e afetam os êxitos na redução do consumo por maior eficiência e na adoção de fontes renováveis, diz o informe da AIE.
“Na Bolívia, o diesel, a gasolina e o gás natural estão fortemente subsidiados, por isso é quase impossível trabalhar com fontes renováveis”, apontou Dirk Hoffmann, diretor do Instituto Boliviano da Montanha em La Paz, na Bolívia. “O transporte também está muito orientado para os automóveis individuais, e os números aumentam rapidamente”, afirmou Hoffmann ao Terramérica.
O informe da AIE dedica um capítulo especial ao Brasil, pois estima que se converterá em uma superpotência energética mundial. Suas enormes jazidas submarinas, de petróleo e gás em águas profundas, responderão por um terço do crescimento da oferta mundial de petróleo até 2035, e o país se converterá no sexto maior produtor mundial.
A demanda primária de energia crescerá 80%, e o consumo elétrico duplicará graças a uma classe média muito maior. A chave para sustentar esse desenvolvimento será a capacidade do país para obter grandes investimentos, de aproximadamente US$ 90 bilhões por ano. Com tudo isso, a pegada de carbono do Brasil continuará sendo baixa. Atualmente, 43% de sua energia procede de fontes renováveis, principalmente a hidráulica, seguida da biomassa e dos agrocombustíveis.
O Brasil também experimentará grande crescimento em agrocombustíveis e energia eólica. O Plano Decenal de Expansão de Energia prioriza a hidroeletricidade, a energia eólica e a biomassa. Espera-se que, até 2020, a expansão desses setores reduza as emissões projetadas em 234 milhões de toneladas de CO2, pontuou ao Terramérica uma fonte do governo em Brasília. “Combinadas, as centrais eólicas, as térmicas, a biomassa e as pequenas hidrelétricas duplicarão sua participação, de 8% para 16%”, destacou.
A América Latina poderia funcionar com 100% de energia renovável, segundo vários estudos, incluindo a exaustiva Global Energy Assessment 2012. Até 2050, as fontes renováveis poderão atender entre 60% e 100% das necessidades energéticas da região, garante esse informe. Entretanto, se forem excluídas as grandes hidrelétricas, menos de 10% da energia na América do Sul é obtida de fontes renováveis.
Embora quase todos os países afirmem querer desenvolver as fontes limpas, os subsídios aos combustíveis fósseis distorcem o mercado, segundo uma análise comparativa das condições institucionais e técnicas relevantes para a integração da energia renovável na América do Sul.
O estudo foi elaborado por especialistas da Alemanha, Bolívia, Chile e Brasil e diz que esses subsídios são muito maiores do que os incentivos ou os benefícios impositivos criados para fomentar o desenvolvimento de fontes renováveis. Outra dificuldade é atrair investimentos, sobretudo estrangeiros, para as fontes renováveis. São necessários melhores regulamentações e incentivos para responder às mutantes condições do mercado global, diz o informe.
Espera-se que o tratado sobre mudança climática que a comunidade internacional deve adotar a partir de 2015 acelere o processo sul-americano para uma matriz energética mais verde, limpa e diversificada. Fatores domésticos, como os custos e impactos crescentes dos combustíveis fósseis, podem aumentar o interesse em um modelo energético baixo em carbono, conclui o documento.
*Stephen Leahy é correspondente da IPS.