O anúncio feito na sexta-feira pela Corporação de Investimento do Governo de Cingapura (GIC, na sigla em inglês), dando conta de que adquiriu uma fatia da americana Bunge, apenas confirma o crescente interesse dos países asiáticos pelas firmas globais de commodities. Com US$ 248 bilhões em sua carteira, o GIC comprou 5% das ações da companhia americana por um valor estimado em US$ 500 milhões.
Nos últimos anos, a Corporação de Investimento da China (CIC) e a da Coreia (KIC) adquiriram fatias na Noble, maior trading de commodities da Ásia, e a Temasek Holdings, também de Cingapura, entrou no capital da Olam, trading agrícola com sede no mesmo país. A própria GIC já tinha participação em outra gigante do setor, a suíça Glencore.
Mas a compra de ações da Bunge tem um peso simbólico. Marca a entrada do capital asiático em uma empresa do seleto grupo das “ABCD” – formado também pelas tradings americanas ADM e Cargill, além da francesa Louis Dreyfus -, que domina o comércio global de produtos agrícolas. Com vendas de US$ 58 bilhões, a Bunge movimentou quase 142 milhões de toneladas entre grãos, açúcar e adubos em 2011.
A Dreyfus pode ser a próxima a ter um investidor estatal asiático. A empresa já informou que um aporte de um fundo soberano pode ser uma saída para atrair recursos em um desejado processo de capitalização.
Os fundos soberanos, ligados a governos de países com grandes superávits comerciais, detêm mais de US$ 4,8 trilhões em ativos espalhados pelo mundo. Cerca de 75% desses fundos estão na Ásia e no Oriente Médio. Papéis lastreados em recursos naturais ainda têm um espaço pequeno nessa carteira – no caso da GIC, não passam de 3% – mas são uma aposta cada vez mais evidente.
Os governos asiáticos têm procurado ampliar o controle sobre fontes de alimentos, metais e energia, com o objetivo de sustentar o rápido crescimento de suas economias e populações. Como a compra direta de terras por estrangeiros vem sendo combatida em países que ainda têm condição de expandir a produção agrícola, a participação acionária em empresas do segmento pode ser uma alternativa.
No Brasil, a legislação carece de definições claras sobre a participação de estrangeiros nesse tipo de ativo. Algumas concessões devem ser feitas, mas a tendência é os fundos soberanos ficarem de fora. “Fizemos todas as consultas e análises possíveis e nos convencemos de que a lei não permite, em nenhum caso, a participação de fundos soberanos na propriedade de terras no Brasil”, disse Arlindo Moura, presidente da SLC Agrícola, ao Valor no fim de fevereiro.
À frente da maior companhia agrícola do país, Moura negociou durante todo o ano de 2011 a entrada de fundos soberanos no capital da Land Co., uma subsidiária da SLC Agrícola com foco em compra e venda de terras. Na época, a proposta era vender 49% da empresa de terras por US$ 220 milhões. “Estávamos com o cheque na mão. Mas, na última hora, se percebeu que, apesar de a legislação brasileira fazer concessões, elas não existiriam para os fundos soberanos”, relata Moura, que agora negocia com fundos de investimentos nacionais para a Land Co.
Mas a compra de pequenas participações em companhias de commodities por fundos soberanos pode indicar tão somente uma aposta no retorno financeiro desses ativos ou uma estratégia para minimizar os prejuízos com a desvalorização do dólar. Apesar da queda no segundo semestre de 2011, os preços das commodities devem seguir pressionados para cima frente ao aumento da demanda, o excesso de liquidez nos mercados financeiros e as restrições ao aumento da oferta no médio prazo