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Código Florestal

São Paulo

Código pode regularizar 3,7 milhões de hectares em SP, diz estudo. Lei atual não permite considerar APPs como parte de reserva legal. Produtor de leite passou a preservar nascentes e notou benefícios.

Estudo da Secretaria de Agricultura de São Paulo aponta que 3,7 milhões de hectares no estado poderão sair da ilegalidade caso o novo Código Florestal seja aprovado no Senado e sancionado pela presidente Dilma Rousseff nos moldes em que passou pela Câmara dos Deputados.

O número equivale ao total de áreas que precisam ser recuperadas no estado conforme determina a medida provisória 2166-67, de 2001.

“Essa lei criou uma inovação jurídica. Antes dela, a área de preservação permanente (APP) era contada para efeito de reserva legal. Nessa lei, excluiu-se a APP do computo da reserva legal. Essa lei não pode ter efeito retroativo a situações vividas antes de 2001. Não se está anistiando ninguém, se está cumprindo um preceito legal. Se você fosse aplicar essa medida provisória, teria recompor em São Paulo 3,7 milhões de hectares”, calcula José Sidnei Gonçalves, pesquisador do Instituto de Economia Agrícola (IEA), do estado de São Paulo.

Já a proposta de novo código volta a considerar as APPs no cálculo das reservas legais. “São Paulo tem 18 milhões de hectares de lavouras e pastagens. São dez milhões de lavoura e oito de pastagens. Tirar 3,7 milhões de hectares é impraticável economicamente. Essa recomposição é uma impossibilidade”, afirma.

A reserva legal é a área de vegetação nativa que deve ser protegida dentro da propriedade. Já as APPs são áreas frágeis como topos de morros e margens de rios.

A maior parte do passivo, segundo o pesquisador, está na bacia Tietê-Paraná, onde ficam 3,6 milhões de hectares da produção de cana-de-açúcar, pastagens, plantações de laranja e outros produtos do agronegócio paulista.

Para ele, o projeto do novo código reconhece “direitos adquiridos” de 3,5 milhões de hectares. Sobrariam cerca de 200 mil hectares a serem recuperados na região do Vale do Paraíba, principalmente em plantações de arroz e topos de morro. Essa situação, segundo Gonçalves, poderia ser resolvida por meio da emenda 164, que dá aos estados o poder de regularizar tipos de cultivo que serão permitidos em APPs. A aprovação da emenda gerou atrito dentro da base aliada do governo. A União quer direito exclusivo de determinar o que pode ser ou não cultivado nestas áreas.

Outro ponto do código florestal que deverá causar impacto no estado é a proposta de isentar de recomposição da reserva legal as propriedades rurais de até quatro módulos fiscais. Se for aprovada, colocará a fazenda do produtor Rodrigo Immediato dentro da lei. Ele cria 130 cabeças de gado leiteiro numa área de 50 hectares na região de Pindamonhangaba. Há décadas, a fazenda fazia parte de uma área maior de produção de café. Foi aberta, desmatada e, com o passar dos anos e a vinda de novas gerações, foi sendo desmembrada.

“Essa propriedade está com a minha família desde a época do café. Aqui no Vale do Paraíba ocorreram as grandes devastações de florestas para o cultivo de café. Há muito tempo atrás foi feito desmatamento. Hoje estamos praticamente dentro da cidade. Falar em reserva legal é difícil. Não era uma mentalidade da época. O pessoal não tinha problema de clima, de nada. É difícil julgar isso”, diz. Ele diz que ocupa 85% da propriedade.

A situação de Rodrigo é comum no estado, que atingiu a fronteira agrícola por volta da década de 70. “A partir da década de 70, poucas áreas foram desmatadas em São Paulo”, diz o agrônomo Paulo Kageyama, professor do departamento de Ciências Florestais da Universidade de São Paulo (USP).

Para ele, duas questões principais estão em jogo para o estado em relação ao novo código. Primeiro, a possibilidade de se permitir que produtores rurais comprem áreas de reserva legal fora de suas propriedades. “Isso vai permitir que as pessoas comprem áreas muito distantes, que não têm nada a ver com o equilíbrio da paisagem local. É importante que fosse na mesma microbacia, no mesmo ecossistema. Podendo ser fora disso, sai fora completamente das regras ecológicas”, opina.

Outro ponto da proposta que o agrônomo critica é a permissão de que áreas que ficam às margens de rios de até 10 metros de largura sejam recompostas numa faixa de 15 metros. Atualmente, a lei determina que sejam preservados 30 metros de mata do lado de cada margem.

“Quinze metros não é mata. É uma linguiça tão estreita que não representa uma restauração de um ecossistema. Praticamente é tudo borda. Numa mata, essa faixa mais externa é muito prejudicada porque recebe insolação direta, ventos diretos, então a gente sempre despreza essa faixa de borda. É uma faixa tão estreita que não serve pra proteger animais, não reconstitui a mata, não serve para proteger o rio. A faixa de 30 metros cobre uma área que é a mais sensível quando cai uma chuva forte, a área ciliar. Se não tiver mata, quando chove, a margem desbarranca e assoreia o rio”, explica.

O produtor rural Rodrigo Immediato sentiu a diferença quando decidiu recuperar as quatro nascentes que possui em sua propriedade. Ele cercou as áreas para o gado não entrar na mata ao redor de uma das nascentes que alimentam a represa e plantou mudas de espécies nativas.

“A gente notou que começou a melhorar o fluxo de água no período da seca”, diz. Em outra nascente preservada, ele diz que já viu que animais estão voltando a ir até a mata, antes degradada. As nascentes foram cercadas sem medição ou rigor técnico.

Para o professor da USP, a presença de animais é um sinal de recuperação da biodiversidade. “Essa mata também protege a biodiversidade, que é a única biodiversidade possível, já que fora é tudo agricultura e pecuária. Ela dá equilíbrio para o ecossistema e também protege a produção das pragas e doenças. Está provado que quando você tem mata ciliar perto de culturas, essas culturas têm muito menos pragas e doenças”, defende.