Na corrida para elevar a produção de grãos, os agricultores gaúchos estão encontrando uma forma de contornar a escassez de terras em seu estado, precursor brasileiro no cultivo de soja e milho industrial. A Expedição Safra Gazeta do Povo, que percorre os campos agrícolas do Rio Grande do Sul nesta semana, verificou que existem produtores arrendando mais de 20 áreas de vizinhos para ampliar o plantio de verão.
O estado acreditava já ter chegado a seu limite, mas nesta safra espera elevar a área do milho em 5%, para 1,1 milhão de hectares, e a de soja em 1%, para 4,1 milhões de hectares, conforme dados das 27 unidades regionais da Emater gaúcha. Ou seja, os grãos vão tirar mais um pedaço da área das pastagens. “Se continuarmos nesse ritmo, seremos obrigados a importar carne”, sentencia o agrônomo Luiz Ataídes Jacobsen, da Emater. Para os gaúchos, comprar carne de outras regiões representa abrir mão do verdadeiro churrasco.
Pai e filho, os produtores Carlos e José Burille estão arrendando 25 pequenos lotes de famílias que abandonaram o campo ou se concentram em atividades como a produção de leite. Com isso, conseguiram reunir cerca de 340 hectares – 250 para a soja e 90 para o milho. Além de terem de criar uma logística complexa para o uso das mesmas máquinas em lavouras que ficam num raio de 30 quilômetros umas das outras, trabalham em três municípios diferentes: Erechim, Gaurama e Três Arroios.
A renda paga aos proprietários das terras corresponde a até 24% do volume produzido. Para não se esquecer de algum dos arrendadores, os Burille vão deixar o pagamento de cada um depositado em sacas de soja no próprio armazém de seleção e secagem de grãos. Os contratos autorizam o dono da terra a vender o produto no momento de sua escolha.
Mercado estimulante
Os preços são o principal fator de estímulo à produção, avalia o agrônomo Nilson Camargo, técnico da Federação da Agricultura do Paraná (Faep) que acompanha a Expedição na viagem ao Rio Grande do Sul. A saca de soja está a R$ 43 e a do milho a R$ 25, valores até 20% superiores aos de um ano atrás. “Além disso, a necessidade de se arrecadar mais para garantir sustentabilidade ao negócio motiva a expansão. Como as propriedades são pequenas, é preciso ganhar escala para alcançar uma renda mínima”, acrescenta.
O plantio de 70 hectares de soja exige a movimentação de R$ 50 mil, mas resulta em lucro de apenas R$ 5 mil, calcula o produtor Renato Dezan, de Erechim. Ele atua na região que atingiu a maior produtividade de soja do Rio Grande do Sul, com média de 3,2 mil quilos por hectare em 2010/11. Boa parte da arrecadação é consumida no arrendamento, relata Dezan, proprietário de 12 hectares. Para conseguir R$ 5 mil “limpos” com a soja, ele trabalha cerca de seis meses. “Ganho menos que minha mulher, que recebe R$ 1,8 mil por mês com oito vacas de leite”, compara. Cada animal rende 15 litros ao dia e o custo de produção é variável.
O fato é que não falta ânimo para a expansão. Praticamente toda a área de milho já foi semeada. Oito dias antes do prazo sugerido pelo Ministério da Agricultura para o início da semeadura de soja, as plantadeiras ficam no campo até o anoitecer. A luz da Lua e os faróis do trator orientam a equipe de plantio na propriedade de Ivan José Mecca, que planta 200 hectares de soja em Sertão, na região de Passo Fundo. “Temos que aproveitar a previsão de chuva.” Ele espera que o tempo úmido favoreça a germinação nos próximos dias.