Produtores rurais de Cunha, município nas encostas da Serra do Mar, a 180 quilômetros de São Paulo, estão resgatando, com sucesso, o uso de sementes crioulas, que servem tanto para consumo próprio quanto para comercialização e até para recuperação de mata nativa. A iniciativa faz parte de um projeto da ONG Serra Acima, iniciado há um ano e meio, com apoio da Bolsa de Valores Sociais e Ambientais e da Petrobrás, e já envolve 130 pequenas propriedades.
O hábito de multiplicar e trocar essas sementes tem contribuído para preservar variedades tradicionais, algumas em extinção. É em uma feira semanal, que já é um sucesso na cidade e vende frutas, hortaliças e legumes, que as trocas são feitas. Desde dezembro de 2009, 20 toneladas de alimentos já foram comercializadas.
“É costume dos agricultores fazer o melhoramento de sementes na própria unidade de produção familiar. E isso é possível com uso de sementes caipiras ou crioulas”, diz o engenheiro agrônomo Leonardo Ikari Kon, responsável técnico pelo projeto. “Muita história vem junto com a semente. É também um resgate cultural do agricultor.”
Banco genético. Confirmou-se, no encontro do dia 16 de julho, a existência de um “banco” que já tem mais de 100 variedades, sendo 35 de hortícolas; 8 de milho; 5 de feijão; 11 de adubos verdes de inverno e verão; 12 de plantas medicinais; 8 de pasto de inverno e verão, além de 18 espécies de árvores nativas e até três raças de pequenos animais. Segundo Kon, com isso há um processo contínuo de melhoria dos cultivos, a partir da experiência do agricultor.
Um dos primeiros passos foi fazer um levantamento do que existia nas propriedades. “Achavam que havia pouca variedade, mas só uma caminhada por algumas propriedades já nos permitiu identificar cultivares como os milhos palha roxa, dente de cavalo, mixurum e cunha, além dos feijões preto, jalo, roxo e outros.”
Além da troca de sementes, outras práticas são repassadas aos participantes, como o incentivo aos viveiros, minhocários, composteiras, o uso de caldas no controle biológico de insetos e pragas, a participação da família e os mutirões. Uma turma já se formou e outra está a caminho de se formar no curso de agroecologia, com aulas que revezam teoria e prática a cada 15 dias. Muitas atividades são orientadas pelos próprios agricultores já formados.
“É importante ver a participação de todos, demonstrando que é possível viver bem na roça e que o produtor pode melhorar a renda sem explorar o consumidor.” Na feira, o custo de uma unidade de alface é de R$ 0,60 e uma de repolho custa R$ 1.
Mesmo assim, os resultados econômicos, de acordo com cálculos da equipe técnica, têm sido interessantes. O faturamento médio mensal de cada agricultor participante é de R$ 785, ou R$ 35,70 por dia, considerando-se os 22 dias úteis do mês. Isso significa uma renda 44% acima da média do que ganhariam como diaristas na região.