O mundo está mais instável e perigoso. Terrorismo, crises geopolíticas, migrações maciças, conflitos étnicos e religiosos, xenofobia e protecionismo são fatos diários nesse período turbulento que vivemos.
Mas há novos paradigmas e elementos positivos que precisam ser notados.
Um dos autores mais criativos na matéria é Richard Baldwin, professor do Instituto de Estudos Internacionais e de Desenvolvimento de Genebra. Consultor de governos e organizações internacionais, seu livro mais recente, “The Great Convergence: information technology and the new globalization” (nov. 2016), merece ser lido e refletido.
Baldwin mostra que as antigas civilizações da Ásia e do Oriente Médio —que dominaram o mundo por quatro mil anos— perderam espaço para os países desenvolvidos da Europa e da América entre 1820 e 1990.
Em 170 anos, o PIB somado de apenas sete países saltou de 20% para 66% do PIB mundial —EUA, Alemanha, Japão, França, Reino Unido, Canadá e Itália, o chamado G7. Historiadores chamam esse fenômeno de “a grande divergência”, gerada pela fabulosa concentração de poder econômico, político, cultural e militar nesse pequeno grupo de países.
Para Baldwin, a globalização começa de fato em 1820. Nesse momento, a Revolução Industrial, as ferrovias e os navios a vapor reduziram o custo para transportar produtos, permitindo a separação da produção e do consumo, até então atados à mesma geografia. Porém, o custo para movimentar pessoas e ideias ainda era elevado e, por isso, as inovações que ocorriam no G7 ficavam no G7, criando imensa assimetria de renda e oportunidades em relação ao resto do mundo.
No século 20, a globalização se acelera com a possibilidade de mudar fábricas e serviços para outros países, transferindo gestão e conhecimento e coordenando atividades complexas à distância. Nesse contexto, ocorre a forte expansão dos grandes conglomerados multinacionais e a consolidação das cadeias globais de valor. A globalização não só separa produção e consumo como permite contratar globalmente e hoje se comunicar a custo próximo de zero.
A partir de 1990, a revolução das tecnologias de informação e comunicação muda radicalmente os paradigmas da globalização, transferindo renda e empregos para as economias (re)emergentes, notadamente a China e os países asiáticos.
Esse é o fenômeno que está na raiz dos atuais sentimentos antiglobalização dos países ricos. Produtos, pessoas e ideias deixam de respeitar as restrições geográficas. Em só duas décadas, o PIB do G7 cai mais de 20 pontos percentuais, voltando ao nível de 1914 —40% do PIB mundial.
Ocorre uma imensa transferência de renda e empregos para o mundo em desenvolvimento, caracterizando o que Baldwin chama de “a grande convergência”. Essa é a nova globalização, que nasce da facilidade de transferir ativos, ideias e conhecimentos, criando ganhadores e perdedores em todas as geografias.
A ruptura da nova globalização foi rápida e brutal, e nesse momento os descontentes querem interrompê-la fechando fronteiras, subindo muros, destruindo blocos econômicos, controlando migrantes e criando tumultos e guerras.
O poder dos Estados-nação está sendo duramente testado. Vários governos querem restringir o fluxo de bens e pessoas, mas não conseguirão conter o fluxo de ideias e conhecimento. Com elas, pessoas e empresas se adaptam, transformam e, se necessário, se mudam. A nação deixa de ser a unidade central de presença e decisão da empresa, sendo substituída por redes globais de produção capazes de desnacionalizar as vantagens comparativas vigentes.
Quem perceber as sutilezas desse movimento vai continuar se globalizando, apesar da desglobalização horrorosa do noticiário diário. Alguns países já perceberam isso e mudaram posições e paradigmas. É fundamental entender o mundo em que vivemos, onde a crise de uns pode virar oportunidade para outros.