Redação (29/01/2009)- A escritora e cozinheira Jennifer McLagan cansou de se sentir culpada depois de comer um prato saboroso e gordo. O problema não era o medo de engordar, mas o martelar ininterrupto do mantra "gordura faz mal".
Autora de Fat – An Appreciation of a Misunderstood Ingredient, With Recipes ela concorda que gordura pode fazer mal, sim, quando é industrializada ou consumida em excesso. "O que as pessoas esquecem é que gordura é fundamental para nosso corpo e para dar sabor aos alimentos. Alguém precisava ir além da superfície e defender esse ingrediente maravilhoso que tem sido tão demonizado", disse ela, de Toronto, Canadá, em entrevista por telefone ao Paladar.
Desenvolvemos um medo crônico de gordura?
Acredito que sim. As pessoas costumam associar a gordura do alimento com a gordura do corpo. Então há quem veja uma barriga de porco e já imagine que aquela gordura vá parar diretamente nos quadris, nas coxas… E isso está longe de ser verdade.
Estamos obcecados por saúde?
Todo esse medo não é puramente o desejo de ser saudável, existe uma obrigação em nossa cultura de ser magro. É preciso esclarecer que não é gordura o que está deixando as pessoas gordas.
E o que está engordando as pessoas?
A forma como nos relacionamos com aquilo que comemos. Hoje as pessoas reclamam que nem sequer têm tempo para lavar uma verdura. Esse é um grave problema. Outro é comer em demasia, exagerar em alimentos industrializados e excluir a gordura da dieta.
É preciso comer gordura?
Quando se elimina a gordura dos alimentos há uma compensação com açúcar e carboidratos. É isso o que está engordando as pessoas. É não conseguir entender a diferença entre gordura boa (a animal) e ruim, ou seja, as hidrogenadas, feitas pelo homem.
Como foi publicar um livro enaltecendo gordura em tempos tão politicamente corretos?
Foi bem difícil vender esse livro. Houve editores que nem quiseram tocá-lo porque não era fat free. Eles simplesmente não entenderam o conceito. Mas eu queria muito escrever o livro. De certo modo, sentia que alguém precisava assumir a defesa desse ingrediente tão importante.
De onde vem seu interesse e apreciação por algo tão desprezado?
Comi gordura animal desde muito cedo. Não tenho problemas de saúde ou de peso. E sendo uma cozinheira, sempre soube que era dali, da gordura, que vinha o sabor da comida.
Como está sendo a repercussão?
Ainda recebo e-mails ocasionais – sempre que falo, ou escrevo algo a respeito – de gente que acha que sou maluca, quero matar todo mundo ao dizer que gordura faz bem. Também tive reações positivas, especialmente de quem gosta de comer e de chefs de cozinha.
Esse desconhecimento é um sinal de que as pessoas perderam o contato com aquilo que comem?
Acredito que sim e esse é um problema sério. Existe uma geração que não sabe sequer o básico de cozinha. Eles sabem, como disse um crítico inglês, ler o menu em quatro línguas, mas são incapazes de fazer coisas simples como assar um frango ou preparar uma sopa.
A comida já foi mais bem compreendida?
Sim, numa dimensão puramente prática. Nossas avós diziam que canja de galinha faz bem à saúde. Não sabíamos por que, mas era verdade. As pessoas perderam essa habilidade cotidiana tão básica e tão importante. A cultura gastronômica de um país é tão fundamental quanto a arte, a poesia.
Como voltar a estabelecer uma relação com o alimento?
Começando a assumir uma atitude responsável pela forma como nos alimentamos. Fico bastante irritada quando ouço as pessoas dizerem que não têm tempo para cozinhar, para comer direito. Sexo e comida são as coisas que levam a humanidade adiante.
Sem restrições?
Sem restrições para pessoas saudáveis e com bom senso. Há quem coma uma barra de chocolate só porque lá está escrito low fat, mas ignora um detalhe: na maior parte dos casos o número de calorias é o mesmo, pois a falta de gordura é compensada com açúcar e outros ingredientes.
Como comer?
Acho que tudo se resume a moderação. Uma bola de um sorvete delicioso deveria ser o suficiente para nos dar prazer. Não é preciso mergulhar no pote tod. E comer com prazer, com amigos, em família, também é importante.