Durante o período de recomposição de empregos no país, a região Centro-Oeste tem se destacado liderando a geração de vagas tanto formais quanto informais.
De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a ocupação nessa região apresentou um crescimento significativo de 6,8% entre dezembro de 2019 e março de 2023, antes dos impactos turbulentos causados pela pandemia de covid-19.
Essa taxa de crescimento é quase três vezes superior à alta de 2,4% registrada em todo o país no mesmo período. Segundo um levantamento da LCA Consultores, com base nos dados trimestrais da Pnad, ao término do primeiro trimestre de 2023, havia 8,4 milhões de pessoas ocupadas na região Centro-Oeste.
Esses números evidenciam a resiliência e o dinamismo do mercado de trabalho nessa região do Brasil, que tem sido um importante motor para a recuperação econômica e a geração de empregos.
Logo atrás vem a região Norte, com aumento de 5,1% desde 2019. Em números absolutos para a ocupação de pessoas, as duas regiões ficam atrás das demais, mais populosas (ver quadro ao lado). A principal causa para a expansão no Centro Oeste “é o desempenho do agronegócio”, diz Bruno Imaizumi, economista da LCA. “Houve um boom de commodities nesses últimos anos e as safras recordes impulsionaram a geração de empregos diretos e indiretos”.
Para 2023, a projeção para o emprego no país ainda é positiva, embora deva crescer mais lentamente respondendo ao ritmo do cenário macroeconômico, projeta a LCA. O agro não é a maior gerador de empregos diretos. Do universo ocupado em março na região, 8% estavam alocados em agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura, mostra a Pnad.
O setor de serviços abrigava mais da metade das pessoas ocupadas na região. Se observado apenas o recorte do emprego formal oferecido pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), a agropecuária ocupa 12% em Mato Grosso e 21% em Goiás e Mato Grosso do Sul em 2023, segundo levantamento da Fecomércio Mato Grosso. Em São Paulo e Rio a atividade não representa mais de 5% do saldo total de empregos formais. No Sudeste, o agro tem mais peso em Minas Gerais (15%) e no Espírito Santo (31%), graças à liderança no cultivo de café.
Mas se os volumes do campo avançam, há efeito dominó em outros setores da economia. “Cada emprego gerado numa indústria gera outros quatro indiretos”, projeta Silvio Rangel, presidente da Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso (Fiemt). Em outras palavras, mais soja (milho ou outros produtos) leva a maior necessidade de serviços de armazenagem, de transportes para escoar a safra e de consultorias no campo, além de crescer o atendimento no varejo agrícola de insumos, para citar as principais atividades.
“Todo ano vem crescendo a produção. Isso gera valor e, consequentemente, mais empregos e renda”, comenta Leonardo Machado, assessor técnico da Faeg, que representa o agronegócio em Goiás. Ademais, a região é exportadora de alimentos, fator que explica a sustentação do ambiente de negócios local em anos recentes de crise econômica, lembra Laysa Avalos, assistente de pesquisa do Instituto de Pesquisa e Análise da Fecomércio MT.
Segundo ela, o número de empresas abertas desde 2020 avançou mais que o de extintas e evidencia ambiente favorável à manutenção de negócios. O PIB do Centro-Oeste deve avançar 2,3% em 2023, estima a Tendências Consultoria, acima da projeção de 1,9% de crescimento para o país. O economista Lucas Assis destaca as safras recorde de soja e milho, além de bons resultados para a cana, abate de bovinos, indústrias de alimentos e biocombustíveis.
Cada emprego gerado numa indústria gera outros quatro indiretos” — Silvio Rangel
Há riscos para a produção agrícola no ano que vem, devido às condições climáticas, mas apesar dos desafios do cenário, a Tendências projeta alta média anual de 2,5% do PIB do Centro Oeste entre 2024 e 2032 – acima da alta média anual de 2% estimada para o Brasil no período.
Imaizumi, da LCA, acrescenta, ainda, que o alto patamar da Selic, embora amargo em muitos aspectos para mover a economia, mostrou uma faceta positiva no que diz respeito à oferta de crédito para o campo: desde meados de 2020 atraiu forte volume de recursos para os títulos de Letra de Crédito do Agronegócio (LCA). Os papéis, com ganhos atrelados a juros e isentos de cobrança de Imposto de Renda, são importante origem para o crédito rural hoje, lembra.
Ainda segundo o economista, o Centro Oeste tinha o patamar mais elevado de rendimento médio na Pnad mais recente com recorte regional. A média de R$ 3.575 avançou 12,2% desde dezembro de 2019 – e também foi o maior aumento na comparação entre regiões no período observado.
Imaizumi lembra que o Distrito Federal tem concentração grande de servidores públicos bem remunerados, fator que pesa no cálculo regional, mas acrescenta que há um efeito importante do aumento da empregabilidade formal em Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul, que traz na esteira melhores salários.
O volume da safra mais recente de grãos cresceu 15% sobre a anterior e rendeu 158,6 milhões de toneladas no Centro Oeste, puxados pela soja, segundo a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab).
Considerados os ecossistemas do agro, destacam-se ainda outras cadeias de negócios, como carnes, biocombustíveis, açúcar e óleos vegetais, atividades que fomentam boa parte da economia nos Estados da região.
A produção de ferro-gusa e brinquedos também aparecem como destaques de Mato Grosso do Sul (MS), somando-se ao agro, comentou Ezequiel Resende, economista-chefe da Fiems, que representa as indústrias locais. Segundo ele, a pandemia não afetou a geração de empregos no Estado. Com impulso do agro, somente em 2022, as 6 mil indústrias abriram 9,7 mil postos.
Resende conta que, em MS, há 28 projetos que envolvem a construção de unidades e ou expansões industriais que vão demandar investimentos aproximados de R$ 40 bilhões até 2028. Em função das expansões fabris, principalmente, a indústria da construção local tem cerca de 35 mil trabalhadores formais. “E falta gente”, diz.
O economista da Fiems cita, entre os projetos em andamento, a expansão de unidades de abate da JBS e da Aurora. A da JBS, em Dourados, deve sair dos atuais 5 mil para 10 mil suínos por dia. Há ainda os investimentos bilionários em celulose da Suzano e de uma concorrente, a chilena Arauco. Esta última escolheu o município de Inocência, a cerca de 330 quilômetros da capital de MS, Campo Grande.
Já a Suzano levanta sua nova planta em Ribas do Rio Pardo (a 100 quilômetros da capital do Estado), e estima gerar 3 mil postos de trabalho diretos nas operações florestal e industrial. O investimento é calculado em R$ 22 bilhões. Entre empregos diretos e indiretos com o início da operação, a unidade poderá ocupar ao todo cerca de 10 mil pessoas. “É quase metade da população de Ribas”, destaca Rodolpho Mangialardo, diretor-regional do Senai. A cidade tem cerca de 23 mil habitantes.
No pico da obra, que ocorre em 2023, o efeito se vê na construção civil, com cerca de outros 10 mil trabalhadores em operação – neste caso, boa parte é de prestadores de serviços de outros locais, acrescenta Mangialardo. Para treinar a mão de obra que poderá buscar espaço no projeto, o Senai, que não tem unidade fixa na cidade, precisou estruturar unidades itinerantes, em contêineres, e trazer professores do Maranhão, Bahia e Paraná, que se uniram à equipe local, para ministrar as aulas. Os cursos técnicos estão em andamento.
A instalação da floresta e da fábrica de celulose da Suzano moveu mais gente fora do projeto. Segundo o governo estadual, estão ocorrendo obras em rodovias locais, a exemplo do trecho que liga Ribas do Rio Pardo à BR-060 em Camapuã. Um plano de expansão da rede de saneamento, ademais, está em estudo. A cidade tem atendimento de rede de esgoto próximo à universalização, informa o ente, mas será preciso adaptar a estrutura da cidade ao desembarque da nova unidade fabril.
A Arauco deve começar a obra de sua nova fábrica em 2024, mas já emprega 800 pessoas na área florestal. O aporte é estimado em R$ 20 bilhões, informa Bruno Gouveia, secretário executivo de qualificação profissional e trabalho da Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento de MS. Ele informa que o Estado assinou um protocolo de intenções com as duas empresas de celulose, que se comprometeram a realizar obras e prover os municípios de serviços essenciais para atender necessidades básicas em educação, saúde, segurança e infraestrutura.
Um outro projeto de grandes proporções, este em Mato Grosso, é a construção da ferrovia que vai ligar Rondonópolis a Lucas do Rio Verde. A obra está nas mãos da Rumo, uma das maiores empresas de logística do país. Neste caso, os investimentos são estimados de R$ 14 bilhões.
Segundo a companhia, o início das obras ao longo deste ano deve gerar quase mil postos unindo a construção do primeiro viaduto ferroviário em Rondonópolis e as obras de serviços de terraplanagem e drenagens, além de outra frente dedicada a construção de pontes e viadutos. Estima-se a geração de 186 mil empregos, deles, 105 mil diretos.
Ainda em Mato Grosso, o carro-chefe da produção de soja no país, as cadeias de carnes e biocombustíveis têm feito pesados investimentos, diz Rangel, presidente da Fiemt. São dois entre os universos foco do Senai local, que tem contratos fechados com o governo mato-grossense para capacitar ao todo cerca de 50 mil pessoas em 141 municípios.
O governo federal aumentou recentemente a mistura de biodiesel no diesel, uma das causas da reativação de plantas locais, lembrou Rangel. Entre os investidores em MT estão a FS Fuel Sustainability, que aportou R$ 2,3 bilhões em uma nova unidade no município de Primavera do Leste, a qual entrou em operação neste ano. A Inpasa, que produz etanol de milho, ampliou sua unidade em Nova Mutum no ano passado e, a Uisa, de biogás, está construindo uma fábrica. A geração de empregos nos três projetos supera mil vagas, informa a Fiemt.