Um levantamento realizado recentemente pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que para atender a população global de forma satisfatória, a oferta mundial de alimentos obrigatoriamente deve crescer 20% até 2020. Ainda baseado nas estimativas da entidade, a produção da União Europeia (UE) crescerá 4%, Estados Unidos (EUA) e Canadá 15%, China e Rússia 25% e o Brasil – para que a oferta atinja o número projetado – precisa ascender obrigatoriamente 40%.
Mas será o País capaz de atingir tais patamares nesse curto espaço de tempo? Segundo o ex-ministro da agricultura do Governo Lula (de 2003 a 2006) e Coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Roberto Rodrigues, “é possível, mas não é trivial”. Rodrigues recebeu a FOLHA ontem no hotel em que estava hospedado em Londrina. Ele esteve na cidade para ministrar uma palestra acerca das perspectivas do agronegócio brasileiro e sua potencialidade no mercado mundial para as próximas décadas.
Durante a entrevista, o ex-ministro elencou números que comprovam que o Brasil tem tudo para atingir esse patamar de soberania no agronegócio mundial. Nos últimos 20 anos a área plantada cresceu 40%, enquanto a produção de grãos subiu 220%, atingindo um total de 53 milhões de hectares (ha). No ano passado, o saldo comercial fechou em US$ 2,5 bilhões, já o do agronegócio em US$ 82 bilhões. O setor ainda exportou US$ 96 bilhões em 2012, contra US$ 26 bilhões em 2002. “Temos uma condição formidável de atender um tema central do mundo moderno, que é a segurança alimentar. Nossa tecnologia não só é tecnicamente rentável, mas é sustentável, visto que o aumento de área plantada é cinco vezes menor que o da produção. Há terra disponível, gente competente, água e a melhor tecnologia tropical do planeta”, complementou Rodrigues.
Mas o que falta para o País, então, assumir essa posição no agronegócio mundial? A resposta está na ponta da língua do ex-ministro: planejamento estratégico que envolva todo o Governo. Diversos ministérios precisam estar envolvidos neste objetivo, já que os gargalos brasileiros envolvem logística, política comercial, política de renda, questões institucionais e cumprimento da legislação em vigor. “O ministério da Agricultura tem que ser um executor da estratégia definida pelo Estado. O presidente da República deve entender que a agricultura é essencial para o País e montar um plano. A última vez que fizemos isso foi no governo Geisel, quando surgiu a Embrapa, há mais de 40 anos”, ressaltou ele.
Dos pontos elencados, Rodrigues disse que o País não fez nada pelo setor de logística nas últimas duas décadas. Só agora, segundo ele, o Governo mudou regras das parcerias público-privadas e existe “uma luz no fim do túnel”. “Estamos perdendo dinheiro uma barbaridade”. Já na política comercial, ele lembrou que enquanto EUA e UE negociam acordos bilaterais, o Brasil fica a “ver navios”. “Um terço do mercado agrícola brasileiro é nos EUA e UE. Nossa política comercial é muito tímida e certamente vamos perder mercado se não formos mais agressivos e agregar valor aos nossos produtos”.
Outro ponto abordado que precisa de atenção é a política de renda. O seguro rural surgiu no País em 2003 e até hoje apenas 6% dos produtores têm seguro, a grande maioria ligado apenas a questões climáticas. “Mais uma questão difícil é que enquanto o mundo inteiro tem um ministro da agricultura, pesca e floresta, aqui temos vários ministros disputando o mesmo orçamento, prestígio, o que acaba gerando dispersão de recursos e de atenção ao agronegócio brasileiro. É possível o País se tornar uma potência, mas será necessário criar um projeto grande, abrangendo diversas variáveis”.