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Água e Produção Animal, por Julio Palhares

"Produção animal brasileira não é hidricamente sustentável, mas pode ser!", conheça a opinião do pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste sobre o assunto.

Água e Produção Animal, por Julio Palhares

Instituições internacionais como o Banco Mundial, a FAO e a Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento, identificaram há alguns anos uma revolução, denominada “Revolução da Produção Animal”. Características dessa Revolução são: a migração das produções pecuárias dos países desenvolvidos para os em desenvolvimento; concentração geográfica das unidades produtivas; especialização das propriedades rurais; uso intensivo de recursos, principalmente água e energia; estabelecimento de fazendas industriais (caracterizadas pela alta densidade de animais e elevado nível de automação). Nesta Revolução, o Brasil tem papel principal, pois o país é visto como o grande gerador de proteína animal para o planeta, posição a ser atingida em meados de 2020. Mas isso já é uma realidade, pois já somos grande exportador de carne bovina, de frango e de suíno. Alguns já rotulam o país como o “Frigorífico do Mundo”. Calcula-se que 1/3 da carne consumida no mundo é de origem brasileira.

Há várias justificativas para o sucesso pecuário brasileiro. Ambientalmente, essas compreendem a disponibilidade de recursos hídricos e de solos para o cultivo de grãos e pastagens.

A água é um recurso natural fundamental para produção animal, devendo estar disponível em quantidade e qualidade. Ela é utilizada na produção dos insumos e dos alimentos, na dessedentação, na higienização das instalações, como veículo para retirada dos resíduos (fezes, urina, restos de alimentos e camas) no abate dos animais e no processamento dos produtos. Portanto, a dependência hídrica da pecuária é elevada. Isso coloca o Brasil em posição confortável, devido a sua disponibilidade perante aos outros países de tradição pecuária, mas devemos lembrar que uma posição de conforto no presente, não é garantia de conforto no futuro. Para mantermos esse diferencial hídrico, precisamos preservar e conservar nossas águas; precisamos ter segurança hídrica. Nunca devemos esquecer que a água é um recurso natural finito, portanto, é dever de todos que atuam na produção pecuária assegurarem a oferta de água de forma sustentável.

Não há dúvida de que os atores produtivos sabem da importância da água para produção animal e que a riqueza hídrica nacional é estratégica para manutenção do país como um grande produtor de carnes, ovos, leite, etc. Mas esses atores e a sociedade conhecem os potenciais impactos que estas produções podem provocar à quantidade e qualidade da água? Para pecuária, quais as políticas de desenvolvimento e ações para conservar a água em quantidade e qualidade? A produção animal no Brasil é hidricamente sustentável? As respostas a essas perguntas ainda não estão claras para todos. Sem conhecer na há como manejar e gestionar. Precisamos de informação e precisamos transformar essa informação em conhecimento a fim de termos a almejada segurança hídrica.

Iniciativas pontuais existem, demonstrando que é possível produzir proteína animal e conservar os recursos hídricos. Essas devem ser tomadas como exemplo por todos e serem transformadas em boas práticas hídricas, bem como em políticas setoriais e públicas de desenvolvimento.

A produção animal brasileira não é hidricamente sustentável, mas pode ser! Para que isso aconteça, devem ocorrer mudanças de pensamento em todo sistema de produção pecuário, desde produtores até consumidores. Também é fundamental que as agroindústrias assumam a sua co-responsabilidade na mitigação dos passivos ambientais originados na geração das matérias-primas e que os governos estabeleçam políticas de desenvolvimento, através de zoneamentos produtivos e estruturação e fortalecimento dos órgãos fiscalizadores. O mecanismo de pagamento por serviços ambientais certamente poderá contribuir para melhoria do manejo hídrico na pecuária.

Como a própria Política Nacional de Recursos Hídricos estabelece, a gestão do recurso deve ser responsabilidade de todos e ser realizada de forma participativa. O Brasil possui diversos conflitos ambientais e hídricos, a relação produção animal/água já é um deles. Para que esse não se agrave, devemos intervir agora.

A omissão do passado já mostrou suas conseqüências, por enquanto ambientais. A omissão no presente, certamente, trará conseqüências ambientais ainda maiores, mas também econômicas e sociais. A chamada “Revolução da Produção Animal” já nos deu uma lição, as produções se movem, os passivos ambientais ficam.
A Embrapa Pecuária Sudeste irá realizar nos dias 22 e 23 de março de 2012 na cidade de São Carlos-SP o II Simpósio Produção Animal e Recursos Hídricos – II SPARH. No evento serão discutidos vários temas, objetivando a superação dos desafios hídricos da pecuária. Informações podem ser obtidas no endereço www.cppse.embrapa.br/II-SPARH

* Júlio Palhares é pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste