A última vez que o empresário Luciano Sanches Fernandes figurou com destaque no noticiário econômico, protagonizava uma das operações de venda de usina mais surpreendentes da história do setor sucroalcooleiro. Após quatro meses de negociações com a petroleira BP, vendeu do dia para a noite suas duas usinas de São Paulo para a asiática Noble, diante da tentativa da britânica de mudar na última hora condições previamente acertadas.
Ao se desfazer dos dois ativos paulistas, o grupo ficou com apenas uma unidade, a de Goiás e R$ 300 milhões da dívida, que totalizava R$ 1,3 bilhão. A venda também rendeu aos sócios do grupo, da família Fernandes, R$ 600 milhões em dinheiro, dos quais R$ 300 milhões foram reinvestidos na usina goiana, batizada de Porto das Águas.
Três anos depois, o empresário volta aos holofotes para anunciar que continuará a investir. Até então, o grupo havia injetado R$ 800 milhões. O dinheiro começou a entrar em 2006, ainda no plantio dos primeiros pés de cana em Chapadão do Céu, cidade goiana que abriga a usina, e seguiu irrigando o projeto até março deste ano, quando a empresa concluiu a safra 2013/14 com moagem de 4 milhões de toneladas. Esse valor também incluiu o terminal de transbordo de etanol, construído no ramal ferroviário da América Latina Logística (ALL), em Chapadão do Sul (MS), de onde a empresa escoa o produto até Paulínia (SP).
Agora, o plano é investir mais R$ 500 milhões em cinco anos, diz Fernandes, que preside o grupo. O objetivo é crescer em capacidade de moagem de cana e em produção de etanol, mas o grande motivador desse projeto quinquenal será a cogeração de energia. A meta é mais que triplicar a capacidade atual de 200 mil Megawatts-hora (MWh), para 765 mil MWh até 2018/19.
Para 2014, o conselho de administração da Cerradinho aprovou investir R$ 184 milhões, dos quais R$ 108 milhões, ou 60%, em cogeração. A meta é colocar em operação já em 2016 uma capacidade 50% maior, de 300 mil MWh por ano. “O mercado de energia está muito demandado e a perspectiva é de preços crescentes também no longo prazo. Esse não é o caso do etanol”, disse Fernandes.
Do total de recursos a ser aplicado em cinco anos, em torno de R$ 270 milhões serão aplicados em cogeração. O maior desafio será captar biomassa para suportar o projeto, diz o empresário. O bagaço gerado pela usina não será suficiente, e o grupo terá que criar alternativas para coletar a palha da própria cana – que fica no campo após a colheita mecanizada – e outros tipos de biomassa.
A região no entorno da usina, conta Fernandes, tem uma grande produção de sementes de pastagem. Após a colheita, essa cultura também gera uma palha que é, muitas vezes, queimada a céu aberto. O objetivo da Cerradinho, revela o empresário, é encontrar alternativas viáveis de coletar esse material para dar suporte à planta de eletricidade.
A empresa partirá para a pesquisa. Busca R$ 100 milhões dentro do Inova Sustentabilidade, do BNDES, para desenvolver tecnologia para captar e limpar biomassa. O objetivo é também ampliar a eficiência no processo de produção da energia. Essa captação faz parte dos R$ 500 milhões a serem investidos até 2019.
Em cana e etanol, o aumento será mais modesto. De 4 milhões, a usina passará a moer 5 milhões de toneladas de cana em cinco ano. Para isso, o grupo precisará apenas plantar mais cana, pois a fábrica já comporta essa moagem adicional. “O próprio projeto de cogeração dará suporte energético à moagem maior da usina”.
A produção de etanol, hoje de 332 milhões de litros, deve, até 2018/19, ir a 476 milhões, 43% mais. O diretor de operações agroindustrias da Cerradinho, Fernando Tersi, diz que o foco é ganhar produtividade. Não que ela esteja baixa, explica o executivo. Do canavial goiano, a Cerradinho tirou nas últimas duas safras mais de 100 toneladas de cana por hectare – 104 em 2013/14 e 109 em 2012/13, 30% acima da produtividade das usinas de São Paulo. “Como eram pastagens degradadas, antes de plantar cana, cultivamos por dois anos crotalária, planta que fixa mais nitrogênio no solo”, detalhou Tersi.
A meta da empresa, que hoje produz 9 mil litros de etanol por hectare – ante a média de 7 mil litros de São Paulo – é elevar essa produtividade a 10 mil litros por hectare. A Cerradinho vai buscar esse ganho com desenvolvimento de tecnologia e, para isso, protocolou três projetos que pleiteiam R$ 80 milhões no PAISS Agrícola, programa conjunto do BNDES e da Finep. Se esses projetos forem aprovados, os investimentos totais da companhia podem ir a R$ 580 milhões. “Queremos colher cana em três linhas. A maior parte do setor colhe uma linha de cada vez. Já adotamos duas linhas em metade da nossa área”, orgulha-se Tersi.
A empresa defende que é nessa elevada produtividade agrícola e industrial que está a base dos resultados obtidos. Mesmo com um modelo que contempla produção de etanol hidratado e eletricidade fora de São Paulo, o grupo diz estar satisfeito com os resultados. “Geramos caixa, investimos, desalavancamos e pagamos dividendos”, afirmou o diretor administrativo e financeiro do grupo, Gustavo de Marchi Oliveira.
Na safra 2013/14, a Cerradinho teve um lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de R$ 186,1 milhões, 72% maior. A margem Ebitda foi de 37%, ganho de 4 pontos percentuais. Oliveira esclarece que a metodologia considera tratos culturais e manutenção industrial como despesa, e não investimento. O variação dos ativos biológicos também não entra na conta. “Se adotado o mesmo padrão contábil (IFRS) dos grupos de capital aberto, nosso Ebitda foi de R$ 250 milhões e a margem, de 51%”, compara Oliveira.