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Relações Internacionais

China quer negociar acordo de livre comércio com o Mercosul ou com o Brasil

Tema dificilmente ficará de fora na visita que o presidente Lula planejar fazer à China. "A porta de abertura da China para o mundo estará se abrindo cada vez mais", disse Xi Jinping, presidente da China, em outubro

China quer negociar acordo de livre comércio com o Mercosul ou com o Brasil

A China se diz pronta a negociar um acordo de livre comércio com o Mercosul ou separadamente com qualquer sócio do bloco. É um tema de impacto que dificilmente ficará de fora na visita que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva planejar fazer à China proximamente.

Durante o 20º Congresso do Partido Comunista chinês, em outubro de 2022, um relatório apresentado pelo presidente Xi Jinping destacou a estratégia chinesa de buscar “uma maior integração na cadeia industrial global e na cadeia de fornecimento e (continuar) a promover a liberalização e a facilitação do comércio e dos investimentos”.

Para isso, o país continuará a negociar “acordos de livre comércio de alto padrão” com seus parceiros comerciais. “Em resumo, a porta de abertura da China para o mundo estará se abrindo cada vez mais. Isto certamente criará mais oportunidades para seu desenvolvimento próprio e para o resto do mundo”, disse.

No fim de novembro, durante o exame da política comercial do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), o embaixador chinês Li Chenggang observou que o Brasil concluiu vários acordos de livre comércio e renovou ou iniciou novas negociações, e deu a mensagem de Pequim: “A China acredita que é fundamental melhorar a integração regional do Brasil e a diversificação das exportações. Nesse sentido, a China encoraja o Brasil a desempenhar um papel ativo na expansão da rede de acordos regionais de comércio do Mercosul com os principais parceiros comerciais”.

Chenggang logo lembrou que a China é o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009, o maior mercado para as exportações brasileiras, fonte grande de importações para o Brasil e contribui fortemente no superavit comercial brasileiro. Indagado pelo Valor para aprofundar o discurso do embaixador, o Ministério de Comércio chinês (Mofcom) respondeu sem rodeios: “Isso significa que a China está disposta a negociar um acordo de livre comércio (ALC) com o Mercosul como um todo ou um ALC com qualquer membro do Mercosul”.

Pequim já tem 22 acordos de livre comércio concluídos, por exemplo com Chile e Peru na América do Sul, além de 10 em negociação e oito “em consideração”, como com a Colômbia. Também fez estudo de viabilidade de um acordo com o Uruguai, o que na prática causaria desmonte do Mercosul como união aduaneira. Diplomaticamente, para Pequim seria mais interessante negociar mesmo com o Mercosul como um todo. Mas confirma o plano B para negociação separada. O governo de Jair Bolsonaro nunca escondeu o ceticismo e a pouca simpatia pelo Mercosul. Já o governo Lula sinaliza sobre a importância não apenas econômica, mas política e estratégica do bloco do cone sul para o Brasil. E a reação ao plano de Pequim será certamente diferente. No entanto, a discussão torna-se menos defensiva em relação à China.

A diplomata e economista Tatiana Rosito elaborou um documento sobre “Bases para uma estratégia de longo prazo do Brasil para a China”, a pedido do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), em 2020 que vai nesse sentido. Tatiana é, agora, a nova secretária de Assuntos Econômicos Internacionais do Ministério da Fazenda. No documento para o CEBC, ela nota que, pelos impactos esperados, há caminho a ser percorrido pelo Brasil (e os parceiros do Mercosul) nas negociações de acordos internacionais antes da negociação de um acordo de livre comércio com a China, “mas esse tema não deve ser um tabu e deve ser crescentemente considerado mediante uma abordagem que possa levar o Brasil e os diferentes setores da economia brasileira a debruçar-se sobre ganhos e perdas de um maior comércio com a China”.

Rosito cita estudo do Instituto de Pesquisa Economica Aplicada (Ipea), de “Avaliação dos Impactos sobre a Economia Brasileira de um Acordo de Livre Comércio do Brasil com a China”, de 2019, que aponta “resultados inequivocamente positivos para a economia brasileira, com ganhos de PIB, investimento, exportações e importações. O saldo comercial seria um pouco pior, mas haveria uma redução significativa do nível de preços agregado e um aumento do grau de abertura da economia”.

“O fato de que a abertura com a China promoveria grandes ganhos de exportação mesmo em setores ‘inesperados’ é um resultado de grande relevância”, diz o estudo, com a ressalva de que as perdas de produção e emprego em alguns setores exigem debate sobre o tema.

O estudo utiliza um modelo de equilíbrio geral que deixa, porém, mais de um cético. De fato, não é por causa de tarifas que o Brasil não exporta outros produtos, fora da lista de commodities, para a China. E sim por não ter competitividade, escala ou eficiência para atender o gigantesco mercado chinês. “Não conheço nenhum segmento (no Brasil) que, primeiro, tenha produção suficiente, e segundo, que tenha o apetite para assumir o risco de aumentar os negócios num mercado daquele tamanho.

A China não é um mercado para vender excedentes, os distribuidores não tem interesse em pequenos volumes’, diz Marcos Caramuru, ex-embaixador do Brasil na China (2016-2018), sócio da consultoria Kemu e um dos maiores especialistas brasileiros em China. Quando Lula levantar em Pequim a recorrente queixa de falta de diversificação das vendas brasileiras para o mercado chinês, uma resposta certamente virá para discutir acordo de livre comércio.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) não se esconde no debate. Para Renato da Fonseca, superintendente de Desenvolvimento Industrial da entidade, não precisa se começar com acordo de livre comércio. E sugere a proposta aos chineses de um acordo inicial para facilitação de comércio.