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Dia Mundial da Alimentação 2013: em direção a sistemas alimentares sustentáveis

Por José Graziano da Silva, Diretor-Geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).

Dia Mundial da Alimentação 2013: em direção a sistemas alimentares sustentáveis

O processo de produção dos alimentos é extraordinariamente complexo. Não somente inclui agricultores e pescadores, mas também aqueles que desenvolvem novas tecnologias, os fornecedores de insumos e os responsáveis pelo transporte, armazenamento, processamento e comercialização de alimentos. Todas as pessoas são, além disso, consumidores, e suas decisões ajudam a escala da demanda global por alimentos.

O tema do Dia Mundial da Alimentação deste ano, que a FAO comemora dia 16 de outubro de cada ano, é Sistemas Alimentares Sustentáveis para a Segurança Alimentar e a Nutrição, e convida à reflexão sobre a forma como estes estão funcionando e o que pode ser feito para melhorá-los.

As coisas mudaram muito nos últimos setenta anos: a média de disponibilidade de alimentos por pessoa cresceu em 40%, apesar de a população mundial ter triplicado.  Esta é uma conquista extraordinária e muitos economistas a citariam como prova da eficácia do “mercado” ao induzir a uma resposta adequada da oferta frente ao crescimento da demanda mundial.

No entanto, ao examinar os sistemas alimentares com um pouco mais de cuidado, verificamos que existem grandes falhas. Sua maior falha é que, apesar de contar com abundantes fornecedores de alimentos, a saúde de metade da população mundial é afetada por um consumo muito baixo ou excessivo dos mesmos. A fome que ocorreu há três anos na Somália matou 260.000 pessoas, uma lembrança terrível de que o mercado mundial de alimentos funciona bem para os quem têm dinheiro, mas não responde às necessidades dos pobres.

Cerca de 840 milhões de pessoas enfrentam diariamente a fome. A saúde de outros 2 bilhões de pessoas está comprometida por deficiências nutricionais. Em outro extremo, há 1,5 bilhão de pessoas obesas ou com sobrepeso. Está claro que o mercado por si só não traduz automaticamente a disponibilidade de alimentos em melhor nutrição, saúde, produtividade e felicidade.

Seu fracasso mais evidente se estabelece naqueles que têm maior necessidade de alimentos e não podem – por causa de sua pobreza – traduzir essa demanda efetiva e vivem presos ao círculo vicioso da fome. Que a fome persista em um mundo de abundância de comida é realmente escandaloso.

A outra grande falha está relacionada com a falta de sustentabilidade de muitos dos sistemas alimentares. Grande parte do crescimento extraordinário da produção de alimentos levou ao aumento da pressão sobre os recursos naturais, o que ocasionou solos degradados, fontes de água poluídas, florestas destruídas, oceanos superexplorados e uma diminuição da biodiversidade, prejudicando nossa capacidade de satisfazer as necessidades alimentares das gerações futuras.

Os sistemas agrícolas intensivos – combinados com o desperdício de alimentos em escala massiva – têm se transformado também em uma grande fonte de emissão de gases de efeito estufa que contribuem para impulsionar os processos de mudanças climáticas.

Um segundo paradoxo afeta produtores e agricultores: ainda que tenham ampliado muito a disponibilidade de alimentos, as barreiras comerciais, as políticas de subsídios dos países desenvolvidos e o poder limitado de barganha que têm em relação às grandes empresas comerciais, agroindústrias e varejo levaram a uma crescente concentração da pobreza nas áreas rurais de muitos países em desenvolvimento. Hoje 70% das pessoas que passam fome no mundo vivem em áreas rurais.

Estou confiante de que podemos fazer muito melhor em ambas as frentes. Graças ao comprometimento de muitos países em assegurar o direito humano à alimentação de todos os cidadãos, hoje, existem muitos exemplos de que a fome e a desnutrição podem ser rapidamente reduzidas por meio de medidas diretas tais como os programas de alimentação escolar e as transferências de renda para as famílias mais pobres, programas que podem estimular os mercados locais para os pequenos agricultores.

O comércio justo, o movimento slow food e a certificação de alimentos e produtos florestais a partir de recursos geridos de forma sustentável, estão impulsionando o desenvolvimento de sistemas alimentares sustentáveis, e permitindo que os consumidores tomem decisões que melhorem as condições de vida dos agricultores e pescadores e os incentive a práticas de produção sustentáveis.

Os países membros da FAO confirmaram recentemente as duas principais prioridades da Organização: trabalhar em prol da rápida erradicação da fome e da má nutrição e acelerar a mudança em direção a sistemas de produção e consumo de alimentos.

Estou convencido de que as duas coisas estão ao alcance das mãos, mas exigem mudanças e novas atitudes que envolvam a todos nós, desde o agricultor até as maiores autoridades políticas do planeta, passando por cada um de nós.