Recálculo de rota. Essa tem sido a realidade de motoristas que transportam cargas agrícolas no Sul do Brasil nos últimos meses. Fretes a preços mais baixos, aumento de custos com o veículo e margens mais apertadas são reclamações recorrentes entre caminhoneiros e que têm levado a essa mudança de estratégia na hora de fechar uma operação.
No Paraná, percorrer uma distância média de 150 a 300 quilômetros do centro do Estado até o Porto de Paranaguá, de onde saem grãos para exportação, valia cerca de R$ 400 por tonelada em 2021. Agora, não chega a R$ 300, relatam motoristas. Diante disso, caminhoneiros têm trocado o corredor de exportação por trechos mais curtos.
Sidnei Bielski, motorista autônomo há quatro anos, em Ponta Grossa, é um deles. Segundo ele, se for para Paranaguá, além de estar recebendo menos pelo trajeto, precisará pagar para estacionar o caminhão, caso tenha de esperar um outro carregamento por mais de 24 horas para ganhar um extra na viagem de volta, até a região paranaense dos Campos Gerais.
“Onera o motorista, que, além da manutenção cara, precisa gastar para ficar em Paranaguá. Lá, só chega quem tem cadastro. Quem tem cadastro é quem tem cota, por isso, as transportadoras saem na frente da gente que é autônomo”, afirma. Além disso, segundo ele, ao esperar para carregar ou descarregar, há risco de furtos de estepe, combustível e até roubo da carga.
A redução do valor dos fretes que afeta os transportadores é reflexo da queda dos preços dos grãos no mercado internacional e dos estoques elevados atualmente. Segundo Fernando Paulo de Bastiani, pesquisador da Esalq-LOG, “com os preços das commodities caindo bastante nos últimos meses”, os produtores optam por armazenar o produto, reduzindo o fluxo das exportações de grãos e a demanda por frete.
Ele observa ainda que, normalmente, nos períodos de colheita — entre janeiro e maio — o valor do frete aumenta. Depois começa a cair, como ocorre agora.
Outra explicação para a queda é a redução dos valores do óleo diesel que interfere na tabela de preços mínimos de frete. “A Petrobras anunciou uma série de reduções no preço de combustíveis e a própria baixa do dólar frente ao real fez com que o preço nacional do diesel caísse”, acrescenta Bastiani.
No fim de maio, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) anunciou uma redução dos preços mínimos de frete rodoviário de carga no país. A queda média nos valores do transporte variou entre 2,34% e 3,21%, a depender da categoria.
Segundo levantamento do Sistema de Informação de Fretes (Sifreca), da Esalq-LOG nos corredores de exportação do Sul, como Paraná-Paranaguá e Rio Grande do Sul-Rio Grande, o frete caiu 12% e 17%, respectivamente, nos últimos três meses.
O frete por tonelada no corredor Paraná-Paranaguá, por exemplo, saiu do pico de R$ 155,94 em abril para R$ 138,68 no fim de junho, segundo o último balanço da Sifreca. No trajeto Rio Grande do Sul-Rio Grande, o recuo foi de R$ 139,29 em março, mês que atingiu o maior valor do ano, para R$ 116,19 em junho.
A queda do diesel, que poderia ser um alento para os caminhoneiros, não estimula a opção por rotas mais longas. Foram 22 semanas seguidas de baixa até a semana passada. De 2 a 8 de julho, o valor médio chegou a R$ 4,95 o litro, segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
De acordo com o presidente da Associação de Transportes Autônomos de Ponta Grossa (Astrapon), Edílson Edling, os motoristas associados optam por rodar no máximo 30 km entre as empresas, pois o frete dentro da cidade compensa mais. Para isso precisam que tradings liberem cotas para carregamento das cargas.
“No sentido Ponta Grossa-Porto de São Francisco do Sul (SC), o frete chegou a oscilar entre R$ 65 e R$ 80 (por tonelada). Não compensa para o motorista por causa do custo de manutenção do caminhão e das dificuldades com a infraestrutura das rodovias e das vias urbanas”, afirma.
O frete de retorno é outro fator que tem desestimulado os caminhoneiros. Os motoristas podem voltar do porto transportando fertilizantes ao interior do Estado, mas o valor não tem compensado. Segundo a consultoria Argus, o frete caiu, sobretudo, porque a baixa comercialização do insumo reduziu a demanda por transporte.
Entre o fim de maio e início de junho, no Rio Grande do Sul, caminhoneiros, principalmente os autônomos, manifestavam preocupações semelhantes às dos paranaenses.
“Tem o desgaste de pneu, manutenção, troca de óleo. Tudo afeta diretamente no frete. Aperta demais [a margem dos autônomos]”, afirma Dieck Sena, presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Bens de Rio Grande (Sindicam Rio Grande).
Em um posto de combustíveis, em Rio Grande, Antônio Carlos Machado conta ter ficado uma semana com o caminhão descarregado, até conseguir o frete de retorno. Ele diz ter levado a soja por um percurso de cerca de 400 quilômetros até Rio Grande por R$ 70 por tonelada. O adubo saiu por R$ 80 a tonelada.
“Está dando para trabalhar, mas está sobrando pouco. O custo está alto. O frete não está lá grandes coisas. O problema é o óleo (diesel). E o pedágio é caro demais”, reclama, explicando que, de Rio Grande a Porto Alegre, pagaria quase R$ 300 somando as praças de cobrança.
O caminhoneiro Denis Silveira teve mais sorte. Ele afirma ter conseguido descarregar soja em um dia e carregar adubo no outro. A ida com o grão e a volta com o insumo somariam quase 1,4 mil quilômetros de estrada. A soja, levou por R$ 108 a tonelada e o adubo, acertou por R$ 160.
O gaúcho Paulo Cezar Paes da Silva, por sua vez, priorizava rotas mais curtas. Estava de saída do armazém em Cruz Alta com 32 toneladas de soja para entregar em uma cooperativa na cidade. Segundo ele, o frete foi contratado a R$ 9 a tonelada para um percurso de menos de 20 quilômetros.
“Não tenho feito Rio Grande, o frete também é baixo para lá. Então, estamos fazendo por aqui mesmo, distâncias menores para sobrar um pouquinho mais”, diz.