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Grãos

Guerra entre Rússia e Ucrânia afeta margens de moinhos de trigo no Brasil

Conflito na Ucrânia, que elevou custos de produção e preços do cereal, pesou sobre as empresas

Guerra entre Rússia e Ucrânia afeta margens de moinhos de trigo no Brasil

Os moinhos brasileiros de trigo encerraram 2022 com margem líquida (lucro líquido dividido pela receita), em média, 20% menor do que a do ano anterior. As empresas do segmento sofreram principalmente com o forte aumento dos custos de produção e dos preços do cereal, que bateram recorde logo depois do início da guerra na Ucrânia, e também com o aperto nos estoques.

A perda financeira foi mais forte entre as empresas de porte médio, que faturam entre R$ 80 milhões e R$ 600 milhões, segundo a TCP Partners, butique de investimentos que mapeia mais de 40 setores da economia.

“Estou muito preocupado com a cadeia média de moagem. Essas empresas têm equipamentos mais antigos, muitos funcionários e atendem boa parte da cadeia, mas estão sendo pressionadas pelos grupos maiores, que não repassaram o aumento de custos”, disse ao Valor Ricardo Jacomassi, economista-chefe e responsável pela estratégia de mercado da TCP.

O país tinha 144 moinhos em operação no ano passado, segundo levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Trigo (Abitrigo); um ano antes, eram 193. Dos 144, cerca de 30% faturam mais de R$ 130 milhões ao ano.

Mudança de cenário

Há dois anos, Jacomassi elaborou um estudo em que projetava uma consolidação do setor e aumento médio da receita de 6,6% ao ano, para algo próximo a R$ 124 bilhões em 2025. No entanto, a covid-19 e a guerra alteraram o quadro. “Obviamente, não esperávamos essas intercorrências, e isso fez com que as consolidações não ocorressem na velocidade esperada”, afirma.

“O faturamento cresceu com a elevação dos preços dos produtos, mas sem que isso elevasse o lucro”. Mas, no momento, parece que o apetite comprador de grandes grupos voltou à tona. Jacomassi diz que há, por exemplo, um grande grupo europeu de aditivos alimentares em busca de moinhos de nicho, que fazem só panificação premium. “O que não interessa é a compra de moinhos antigos, que operam, mas que teriam custos de modernização muito elevados”, diz.

Perspectiva

Para 2023, a expectativa é de melhora nas margens, com os efeitos da guerra já conhecidos e estoques um pouco mais cheios. Apesar de a safra argentina ter ficado na metade do esperado, a estimativa é que a produção brasileira seja recorde e ultrapasse 11 milhões de toneladas. “Apenas duas questões incomodam agora: o clima seco nos EUA que pode reduzir a safra deles e aumentar os preços, e o alto custo do dinheiro no Brasil, com as taxas de juros”, resume o economista.

Essa é também a visão de Paloma Venturelli, presidente do Moinho Globo, que, assim como seus concorrentes, viu sua margem diminuir em 2022. “Na verdade, a margem líquida ficou menor que a de cinco anos atrás”, relata, sem dar detalhes financeiros.

O jeito, diz ela, é trabalhar na gestão de recursos. O Moinho Globo opera com estoques para quatro a cinco meses, mas precisaria de mais armazéns para garantir compras de trigo ao melhor preço, principalmente o importado, que depende da cotação na bolsa de Chicago e do câmbio. “Acontece que silos e armazéns são caros e o custo de investimento agora é inviável”, diz Paloma.

Nos últimos dois anos, o Globo investiu R$ 60 milhões para ampliar sua capacidade de moagem no Paraná em 70%, para 1 mil toneladas ao dia. Mas ainda falta inaugurar o terceiro diagrama de moagem desse investimento, que só estará pronto em 2024. Assim, o moinho trabalha agora no limite de sua capacidade de 600 toneladas ao dia.

Produção

Do ponto de vista do produtor, a safra 2023, que está em início de plantio, tende a ser mais lucrativa. “Terminamos 2022/23 como a temporada mais cara da história devido aos elevados preços dos insumos. Agora, há uma normalização, mas é cedo para dizer como ficará o clima, qual será produtividade e, principalmente, se o preço de venda será remunerador”, afirma Hamiton Jardim, presidente da Comissão de Trigo da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul).

O custo médio de produção em 2022/23 foi de R$ 4,5 mil por hectare para lavouras de alta tecnologia no Estado. Neste ano, levando em conta os preços atuais dos insumos, ele deve ficar em R$ 3,8 mil. Ao levar o cálculo a valor presente, com o trigo no Rio Grande do Sul a R$ 74 a saca em média, o produtor tem que colher mais de 3,6 mil quilos por hectare para dar conta do desembolso. Na temporada passada, em que produtividade no Estado foi recorde, a média ficou em 3,9 mil quilos por hectare.