As principais produtoras de carne suína brasileiras buscam se adaptar a novos padrões de bem-estar animal. O atual estágio das mudanças no tratamento dos porcos, visando reduzir seu sofrimento, foi analisado e divulgado pela organização de proteção animal Alianima, que produz o relatório Observatório Suíno. O cenário é de maior conscientização entre as empresas, porém, há um longo caminho a percorrer.
Os frigoríficos mais avançados na implementação das medidas de bem-estar são Pamplona, com 75% da produção adaptada, e JBS, com 58%. Em seguida, aparecem BRF e BFFC, com 35%, e Alegra Foods e Frimesa, com 30%. Essa é a primeira edição do relatório, que será divulgado anualmente. Serão monitoradas 10 empresas, as já citadas e Aurora, Burger King, McDonald’s e Subway. Todas assinaram compromissos públicos de banir as chamadas células de gestação na indústria de carne suína.
Essas células são o principal problema apontado por especialistas em bem-estar animal. O dispositivo é adotado para impedir que a porca se mova durante a amamentação dos filhotes. É uma medida cruel, que ignora todas as necessidades naturais dos animais. Também é ineficiente, pois mascara problemas mais sérios de produção, como a má alimentação das porcas. Com as mães presas, os filhotes ficam tentando obter leite mesmo quando não há, o que acaba machucando a porca. Para remediar esse problema, a indústria avança na crueldade: com o uso de uma esmerilhadeira, ferramenta elétrica usada para o desbaste de metais, serram os dentes dos porquinhos.
A alternativa é utilizar baias coletivas, em que as porcas entram e saem quando quiserem. Esse sistema é mais moderno e produtivo. Com uso de sensores e automatização, é possível controlar todo o processo de gestação e verificar a qualidade das matrizes (como são chamadas as porcas reprodutoras). “O alojamento das porcas em baias coletivas proporciona produtividade e saúde igual ou superior quando comparada às celas individuais. Além disso, o exercício físico durante a gestação melhora o desempenho no parto”, afirmou Patrycia Sato, presidente da Alianima.
Criada no Brasil, a ONG defende a produção de alimentos sem sofrimento, o fim do uso de animais como entretenimento, a redução do consumo de carne, entre outras pautas ambientais. Este ano, ela recebeu um aporte de 130 mil dólares da organização americana Open Philanthropy.
O movimento pelo fim das celas de gestação começou a ganhar corpo nos últimos cinco anos no Brasil. Lá fora, o estágio está mais avançado. A prática já foi banida em, pelo menos, dez Estados americanos, no Canadá, na Nova Zelândia e é condenada, também, pela União Europeia. O grupo Smithfield, maior processador de carne suína dos Estados Unidos, aboliu as celas em sua operação americana há dois anos. No resto do mundo, deve fazer o mesmo em 2022.
Para Sato, a pressão dos consumidores tem forçado as empresas a se mexer. “Temos um consumidor mais consciente e exigente, uma indústria mais atenta e preocupada com o sofrimento animal, e mais organizações oferecendo esclarecimento e suporte para que a transformação ocorra da forma mais justa e consistente possível”, afirma.
As maiores produtoras brasileiras, de fato, não estão paradas. Em nota, a BRF afirmou que implantou o programa interno Bem-Estar Animal Feito pela BRF, “que rege compromissos, normas, processos, indicadores e treinamentos para toda a empresa, desde transportadores, produtores integrados, parceiros e colaboradores, para que atuem de forma correta e compassiva em todos os estágios do processo de produção de aves e suínos.”
A empresa aboliu totalmente o corte ou desgaste dos dentes dos suínos, ressaltando que o “procedimento é realizado apenas em casos extremos, onde há comprometimento do bem-estar da fêmea”. O planejamento é de adotar baias coletivas em 100% da produção até 2026.
Já a JBS disse que o relatório da Alianima “demonstra que a empresa está avançando, e bem, no cumprimento das melhores práticas de bem-estar animal e, também, dando transparência ao assunto em seus materiais públicos”.