Na minha infância tinha um proverbio que o meu avô sempre me dizia que tomo isso como uma verdade absoluta em minha vida. Viver é maravilhoso e aproveitar isso é uma dadiva para todos nós, mas volta e meia, a vida nos dá muitos limões. Muitos pegam esse limão e o acham azedo e difícil de digerir, outros, pegam esse limão e fazem uma bela limonada.
Foi exatamente isso que o Paraguai fez no ano de 2003, quando o então governador do estado do Paraná proibiu o cultivo, manipulação, importação, industrialização e a comercialização de transgênicos destinados à produção agrícola, alimentação humana e animal no estado. Com isso toda a produção do Paraguai que era exportada através do estado do Paraná ficou proibida de passar por lá.
Poderia ser o maior “limão” para aquele país encantador e com uma agricultura pujante, mas o que Requião fez, ajudou o Paraguai a ser hoje o quarto maior exportador de soja, o sexto maior exportador de milho e o sétimo maior exportador de carnes do mundo, aliado a isso, o Paraguai, se tornou nos últimos anos um líder incontestável em navegação fluvial na América Latina, sendo o terceiro no mundo, superado apenas pelos Estados Unidos e China.
O Paraguai de hoje possui 7,2 Milhões de pessoas em uma extensão territorial de 406 mil km quadrados, um pouco maior que o estado do Mato Grosso do Sul, a quem eu considero o estado mais promissor no agronegócio brasileiro para os próximos anos e a similaridade com o Paraguai é imensa, o que me faz acreditar ainda mais nas potencialidades desse país.
Com uma área plantada de 3,4 Milhões de hectares de Soja, os agricultores conseguem fazer duas safras em boa parte dessa área, com o Milho ocupando 800 mil hectares e o Trigo com 400 mil hectares. Junto essas três culturas representam 94% de todo o mercado, com soja sendo 81%, o milho com 7% e o trigo com 6%.
A agricultura Paraguai desenvolveu-se ao longo da divisa com o Brasil e as similaridades com a agricultura brasileira são muito grandes, desde as variedades plantadas, fertilização do solo, pragas e doenças e até o agricultor, visto que grande parte desses são brasileiros.
Outro grupo de agricultores que se destacam no Paraguai são os Menonitas, que possuem a reputação de serem excelentes agricultores, trabalhadores e disciplinados em seus hábitos. Essa mistura fez com que a agricultura Paraguai tenha uma boa mescla entre o arrojo dos brasileiros com a dedicação e resiliência dos Menonitas.
Com um mercado de insumos agrícolas estimado em US$ 2 Bilhões de dólares, destaca se o mercado de agroquímicos na ordem de US$ 700 mio, sendo o quarto mais importante da América Latina, superados somente por Brasil, Argentina e México.
Ao contrário do Brasil onde os 5 grandes players (Syngenta, Bayer, Corteva, Basf e UPL) possuem uma concentração maior do que 70% do mercado, no Paraguai temos um mercado mais pulverizado com os 5 maiores representando apenas 38% do mercado e dois players nacionais ocupando a posição de destaque. Agrofertil/Tecnomyl e Diagro, ocupam as posições de Basf e UPL. O maior mercado são os fungicidas representando 38% do total, sendo as doenças foliares da soja o maior problema. Inseticidas representam 31% do mercado, herbicidas 21% e tratamento de semente e outros 10% do mercado.
O Paraguai tem como vantagem ter um sistema de registro de produtos químicos bem simples e desburocratizado que ajuda a trazer inovações mais rápidas para o mercado e com grandes empresas aproveitando se disso para trazer as suas inovações e servir como um teste rápido para a entrada no mercado brasileiro.
Essa facilidade nos registros, Acesso fácil e mais barato ao crédito, menos impostos, dolarização dos insumos trazendo mais estabilidade na compra e venda de insumos e commodities e facilidade para importação de máquinas agrícolas, faz com que o Paraguai seja uma terra de inovações a céu aberto.
Sementes, Produtos para proteção de plantas e máquinas ultramodernas toma conta dos campos paraguaios, tudo isso se traduz em rentabilidade e produtividade para o agricultor paraguaio.
Outro ponto de diferenciação e que me chamou a atenção foi a infraestrutura e a verticalização dos distribuidores paraguaios, todos eles com um sistema muito parecido com as nossas cooperativas:
- Forte conhecimento dos clientes
- Estrutura de recebimento de grãos e logística completa
- Vendas de peças para tratores e de combustíveis
E forte visão de marcas próprias, sendo que a maioria dos distribuidores possuem linhas próprias de sementes, fertilizantes e agroquímicos o que faz com que grande parte deles sejam líderes em algumas categorias, deixando as grandes multinacionais sem muito espaço e com isso tendo poucos investimentos no país.
Dentre esses distribuidores o que eu destaco aqui é a Transagro, empresa que pertence ao tradicional grupo Hilagro e que foi fundada pelo Sr Albert Hildebrand no ano de 2000. O grupo Hilagro possui diversas vertentes de negócios e com uma sinergia muito grande entre eles, pois vão desde a assistência técnica aos agricultores até a comercialização dessas matérias primas in natura ou industrializados dos produtos no Paraguai e no exterior.
A Transagro hoje é composta por 7 unidades comerciais com serviços que vão desde a assistência técnica, venda de insumos agrícolas, venda e compra de grãos, serviços de armazenamento e beneficiamento, venda de combustíveis até o de de peças para tratores, além de prover toda a matéria prima para as indústrias do Grupo Hilagro, ou seja, uma verticalização completa e muito difícil de ser copiada, o que coloca ela com uma das empresas de maiores potenciais de crescimento.
Atualmente possui entre os seus provedores as principais marcas de insumos agrícolas como Syngenta, Bayer, FortGreen e Rizobacter além de terem as suas marcas próprias de agroquímicos como os genéricos tradicionais Atrazina, Glifosato, 2,4_D , Acephate dentre outros e algumas inovações como suas misturas duplas e triplas, incluindo o seu recente lançamento para o mercado de fungicidas de soja o Horus (Picoxystrobin + Prothioconazole + Difenoconazole), e também alguns packs diferenciados para tratamento de sementes.
A menor burocracia na legislação de agroquímicos fez com que após a expiração das patentes dos produtos a oferta e a disponibilidade desses como marcas exclusivas e com importação direta de ativos, ou produtos formulados oriundos da China ou Índia se tornassem abundantes, e o agricultor com isso, tem os custos desses insumos reduzidos melhorando e muito a sua rentabilidade. Estimo que o agricultor Paraguaio com os mesmos problemas de pragas e doenças, condições de solo e outras similaridades tenha o custo quase 50% menor que o agricultor brasileiro, e o custo da terra também ser muito mais atrativo.
A consolidação que estamos vivendo aqui no Brasil, de certo modo, já ocorreu no Paraguai, com 6 grandes distribuidores Agrofertil, Agrotec, Glymax, Matrisoja, Somax e a própria Transagro terem mais de 60% de participação do mercado e com atuação em todo o território e todas elas fazendo as suas expansões para as áreas novas de agricultura e pecuária como a região do chaco. Destaca-se também o acesso aos clientes serem quase em sua totalidade feitos através do sistema de distribuição, fortalecendo ainda mais esse sistema.
Ainda falta ao Paraguai instituições de pesquisas como a que temos aqui como a Embrapa, uma melhor oferta de mão de obra mais abundante e qualificada, e um sistema que protege mais o agricultor, pois eles não possuem nenhum sistema como que temos aqui como o Funrural, que garantam uma melhor seguridade social e um colchão para a aposentadoria. Por outro lado, apesar da excelente logística necessitam buscar alternativas para o escoamento de sua produção agrícola, visto que a dependência de escoamento pelos Rio Paraguai e Paraná possam causar alguns gargalos em épocas de seca como a que estamos passando em 2021. A construção da tão almejada bioceânica encurtará a distância para a Ásia, aumentando ainda mais a competitividade.
Ressalto também a melhoria da segurança jurídica, visto que recentemente foi aprovado uma lei criminalizando invasões de terras, algo comum em anos anteriores. Sinto um pouco de inveja do Paraguai nesse tema.
Muitas mudanças estão postas ao futuro para a agricultura paraguaia como a entrada mais forte das multinacionais, uma melhor adaptação da genética e da biotecnologia principalmente para novas regiões, a forte entrada de algumas cooperativas brasileiras, a possibilidade de fusões e aquisições, a maior profissionalização, a sucessão e a diversificação de novos negócios como a agricultura de precisão, a redistribuição de insumos e outras formas de agregação de valor como a oferta de produtos biológicos, maior oferta de nutrientes especiais para as plantas e a integração lavoura pecuária.
Somente com a viabilidade de produção de agricultura no Chaco, poderiam ser adicionados mais 8 milhões de hectares à agricultura paraguaia, ou seja, a mesma quantidade que ali se cultiva hoje.
Esse novo olhar para o potencial e para os desafios da agricultura paraguaia são gigantes, mas com certeza essa agricultura irá se consolidar e ficar cada vez mais forte em nosso continente.