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Reflexões sobre medidas de produtividade e alguns resultados para a agropecuária brasileira

Por Mirian Rumenos Piedade Bacchi, Professora da Esalq/USP e pesquisadora do Cepea

Reflexões sobre medidas de produtividade e alguns resultados para a agropecuária brasileira

O sucesso da agropecuária brasileira está calcado na produtividade de suas diversas cadeias, que cresceu, nas últimas décadas, a taxas elevadas, superando em mais de duas vezes a média mundial. Como consequência, o Brasil se tornou uma das três potências agrícolas e o terceiro maior exportador de alimento.

A produtividade pode ser definida com a variação do produto depois de descontados os efeitos do maior ou menor uso de fatores de produção/insumos. Diferentemente das produtividades parciais do trabalho e capital, a PTF (Produtividade do Total dos Fatores) é uma medida de produtividade abrangente e que permite que se avalie ganhos de eficiência na economia ou em setores específicos dela decorrentes do uso conjunto dos recursos no processo produtivo. Assim, a PTF indica a eficiência obtida com a totalidade dos recursos ou fatores de produção combinados para gerar bens e serviços, e se refere ao crescimento do produto relacionado às melhorias no processo de produção. Isso, por sua vez, pode se dar, entre outros fatores, por introdução de novas tecnologias, uso de recursos de qualidade superior (como terra, no caso da agropecuária), combinação mais eficiente dos fatores e melhor gestão do negócio.

Gasques, em diversos estudos realizados nas últimas décadas, tem apontado que a PTF é o principal fator responsável pelo crescimento do produto agropecuário. Considerando-se os anos de 1975 a 2018, foi estimada pelo autor uma taxa média de crescimento da PTF para a agropecuária brasileira em 3,36% a.a. (índice médio do produto de 3,81% a.a e índice de fatores de 0,44% a.a). Para fim de comparação, dados sobre a PTF da agricultura norte-americana indicam que, entre 2007 e 2015, a média da taxa de crescimento anual foi de 0,53% a.a., sendo a taxa histórica de 1,58% a.a.  

Ao analisar a taxa média de crescimento da PTF da agropecuária mundial no período 1991 a 2009, Fuglie conclui que ela é menor que 2% a.a. O mesmo autor cita que, de 2001 a 2009, a região Nordeste da América do Sul (produção predominantemente brasileira) apresentou a maior taxa crescimento da PTF do mundo, seguida pela região nordeste da Asia (principalmente China).

No caso da agropecuária, na literatura pertinente foram considerados que alguns fatos podem sugerir um aumento da capacitação da mão de obra, o que poderia levar ao aumento da produtividade do trabalho: i) houve incremento no nível educacional dos trabalhadores rurais entre 1996 e 2009, que passaram de uma média de 2,6 anos de estudo para 4 anos; ii) os Censos Agropecuários de 2006 e 2017 registraram pequenos ganhos na qualificação dos empregados rurais; iii) setores específicos da agropecuária estão fazendo esforço para cumprir a legislação vigente sobre a necessidade de treinamento de trabalhadores, principalmente aqueles que valorizam as certificações. No entanto, há ainda um grande caminho a percorrer quando se trata de produtividade do trabalho, e acredita-se que os ganhos na qualificação formal e informal dos trabalhadores sejam ainda pequenos. Assim, consideramos que os números apresentados na literatura sobre produtividade parcial do trabalho na agropecuária, que superam a os valores da PTF para período correspondente, certamente estão incluindo a parcela que trata do maior uso de máquinas e equipamentos, e até mesmo de sementes geneticamente modificadas, como é o caso da soja, por exemplo, que exige um menor número de empregados dedicados à lavoura do grão.  Gasques estimou, para o período 1975 a 2018, taxa média de crescimento do capital utilizado na agropecuária de 0,80% a.a., enquanto no caso da mão de obra ela foi negativa (-0,39% a.a) e no da terra de pequena magnitude, apesar de positiva (0,03% a.a.).

Em relação ao aumento da produtividade da terra, ele ocorre pelo uso de parcelas com maior potencial de produção (solos com qualidades edáficas satisfatórias considerando as atividades agrícolas potenciais). Também os rearranjos locacionais das atividades agrícolas, compatibilizando as exigências das culturas agrícolas com a condições edáficas dos solos disponíveis, podem gerar mais produto por quantidade do fator utilizados.

No caso da agropecuária, o uso de inovações tecnológicas buscando redução de custos médios de produção é decorrente da necessidade de os agentes desse segmento da economia manterem suas posições no mercado concorrencial em que estão inseridos. Inovações tecnológicas certamente têm um papel importante a desempenhar nesse processo. De outro lado, também as economias de escala e de escopo obtidas com propriedades de maior tamanho auxiliam no processo de manutenção da competitividade.  

Ao levar-se em conta os dados apresentados neste texto sobre as taxas de crescimento do uso de fatores, pode-se inferir que o capital empregado na agropecuária foi o principal determinante do aumento da produtividade brasileira. Isso ocorre especificamente pelo aumento da eficiência do fator capital (tecnologia cristalizada).