Conhecido por inovar em ferramentas para o controle do desmatamento, o Pará voltou a liderar a lista das maiores áreas abertas no país este ano e elevou o alerta entre ambientalistas. Segundo o governo estadual, pelo menos metade do desmatamento ocorrido entre julho de 2013 e agosto de 2014 se deveu à especulação de terras, na esteira de projetos de infraestrutura futuros ou em andamento.
Numa reversão da tendência de queda registrada desde 2008, o corte raso da porção da Amazônia localizada no Pará atingiu uma área de 2.346 Km2, uma guinada expressiva de 34,8% em relação ao ano anterior, e continua subindo, conforme mostram dados oficiais de agosto e setembro.
As perspectivas geradas pelo novo canal de escoamento dos grãos do Centro-Oeste pela “saída Norte” estão diretamente associadas à compra de glebas na Amazônia e ao corte da floresta que vem depois. Quando observado por município, o desmatamento salta aos olhos no eixo da soja – Novo Progresso (38.183 Km2), Santarém (22.890 Km2) e Itaituba (62.095 Km2), todos à margem da BR-163, que liga o Mato Grosso ao Pará.
“Hoje a soja impacta mais [a floresta]. É normal ter pressão perto de canais logísticos”, diz o secretário de Meio Ambiente José Alberto Colares. Mas a conta não recai apenas sobre o agronegócio – com exceção de Santarém, esses municípios já sofrem influência de projetos de hidrelétricas e do garimpo de ouro.
Segundo Justiniano Netto, secretário extraordinário para a coordenação do programa Municípios Verdes, o grande foco do desmatamento está no oeste, na área do rio Tapajós. “A grilagem tem crescido. As pessoas compram ou simplesmente pegam a terra, aproveitam o inverno [meses de chuva na Amazônia, que dificultam a fiscalização] para desmatar, põem capim e revendem. É a corretagem do desmatamento.”
Segundo Netto, a especulação já representa 50% do desmatamento no Pará. Outros 32% estão ligados a assentamentos e os 18% restantes ao desmatamento convencional para ampliação de área de cultivo.
O repique nos números jogou o Pará à frente do Mato Grosso e demais vizinhos amazônicos no ranking nacional, e tem preocupado o governo paraense. Na tentativa de frear esse processo, o Estado lançou ontem uma Lista de Desmatadores Ilegais (LDI), que complementará a “lista negra” do Ibama criada para embargar municípios com as maiores áreas desmatadas.
Se a lista federal fechou o crédito rural a esses municípios, a intenção agora é olhar mais microscopicamente, identificando polígonos desmatados. Se comprovado que o crime ocorreu em área pública, o governo do Estado trava automaticamente quaisquer incentivos ou serviços públicos, como a concessão de guias de transporte animal e inscrições na Secretaria da Fazenda. Em tese, isso impediria o grileiro de “esquentar” a propriedade.
“Queremos causar um grande constrangimento a quem desmata e a quem grila terras”, diz Netto. Segundo ele, o Estado já tem notado o movimento de “subida do boi” de Mato Grosso ao Pará e a abertura de áreas para a soja, incentivada pelo asfaltamento da BR-163 e pela chegada dos portos fluviais de Itaituba
A “saída Norte” é considerada crucial pelos produtores e tradings agrícolas. Além de representar um caminho mais curto para o mar, com ganhos de tempo e frete, é opção aos congestionados portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR). Segundo a Atap, associação que reúne empresas que investem no corredor Tapajós, os empreendimentos não causam destruição – o desmatamento autorizado e o impacto ambiental das estações fluviais são pequenos e restritos. O problema está na expectativa de progresso econômico que as obras trazem. No oeste paraense há também terras devolutas e unidades de conservação que, na prática, não são protegidas, abrindo caminho para a grilagem. Amintas Brandão Jr., pesquisador do Imazon, de Belém, diz que somente na construção da usina de Belo Monte, 5,6 mil Km2 foram desmatados indiretamente (cálculos excluídos do estudo de impacto ambiental).