Redação (22/08/07) – Com a recuperação dos preços do grão no mercado internacional, depois de três anos de forte crise, boa parte dos produtores de soja não abre mão de sua área para para a entrada da cana.
Na ponta do lápis, os números comprovam que a briga promete ser boa entre as duas culturas, uma vez que a rentabilidade da soja está bem maior do que a da cana. Levantamento da consultoria MB Associados mostra que o lucro líquido da soja no Paraná está em R$ 582 por hectare. No Mato Grosso, R$ 185. A maior rentabilidade no Paraná reflete os custos mais baixos com insumos e logística privilegiada. Já o lucro com a cana fica em R$ 78 (média centro-sul).
E onde a disputa por áreas para expansão de cana e soja é mais acirrada, os preços da terra registram as maiores valorizações em 12 meses, observa Jacqueline Bierhals, analista do Instituto FNP. Levantamento da consultoria mostra que os preços da terra para plantio de cana-de-açúcar subiram 67,4% em Chapadão do Sul (MS), chegando a R$ 2.778 o hectare, e 61,5% em Três Lagoas (MS), para R$ 3.788 por hectare. No Triângulo Mineiro, onde cana, milho e soja disputam as áreas de pecuária, o preço médio subiu 20,6% em Água Comprida e 26,7% em Uberaba, para R$ 10.013 e R$ 8.812 o hectare, respectivamente. Já em regiões tradicionais como Ribeirão Preto e Sertãozinho (SP), o preço da terra baixou 1,3% em 12 meses para R$ 20.455 o hectare. "Em São Paulo houve uma certa estabilização, mas Mato Grosso do Sul e Triângulo Mineiro devem sofrer novas valorizações", diz.
Com o boom do etanol, pequenos produtores acabaram cedendo suas áreas de grãos para cana. Mas a "rixa" entre as duas culturas impede o avanço da cana em tradicionais áreas de grãos. Em Rio Verde (GO), por exemplo, a prefeitura impôs restrição à expansão dos canaviais para evitar a monocultura. O Estado não fomenta a expansão da cana em áreas de grãos, segundo a Seagro (Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Goiás). Em Dourados (MS), a cana só pode ocupar até 30% da área agrícola da região.
"Há um preconceito de que a cana também provoca êxodo rural, uma vez que o produtor de grãos arrenda sua terra e migra para cidade", afirma José Carlos Hausknesht, analista da MB.
Apesar de apresentar uma rentabilidade mais baixa nesta safra, a cana tem suporte no mercado internacional por conta da boa demanda pelo álcool. "Apesar dos baixos preços da cana atuais, quem está na cana não abandona a cultura. Há perspectivas de melhora para os próximos anos", diz Antonio de Padua Rodrigues, diretor técnico da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica). Rodrigues reconhece certa resistência dos produtores dos grãos em ceder área para os canaviais, mas contemporiza. "O produtor de soja já tem toda uma estrutura montada com armazenagens [silos] e máquinas agrícolas específicas para a cultura. É difícil se desfazer disso para migrar para cana", diz.
Tradicional produtor de soja e milho em Campo Mourão (PR), Milton Munhoz, engrossa o coro para barrar a cana. "Tive dificuldade em arrendar terra para soja. Só consegui fechar negócio no município de Tapira", diz. Segundo Munhoz, o produtor de grãos do Paraná já vê a cana cercando a produção de grãos no Estado.
"Desde 2004, a cana se expandiu em muitos Estados onde os produtores estavam em dificuldades devido à crise com a soja. Tudo leva a crer que o setor canavieiro vai encontrar limitações para se expandir, principalmente porque agora a cana rende menos que a soja", diz Fabio Turquino, analista da FNP. Hoje a cana ocupa 6 milhões de hectares e a soja, 20 milhões.
Em Goiás, a diferença na rentabilidade é um dos fatores que pode limitar o avanço da cana. Uma projeção feita pela consultoria Céleres – com base na produtividade média da região e previsões de preço futuro de cada cultura, mostra que a soja s deve gerar uma margem de ganho ao produtor de R$ 252 por hectare, contra ganho de R$ 176,80 por hectare com a cana. As margens para milho e algodão também são superiores, na faixa de R$ 300 por hectare, diz Anderson Galvão, da Céleres.
No Paraná, observa Disonei Zampieri, do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Agricultura, a disputa por terras ficará concentrada nas regiões norte e noroeste do Estado. "Nessas regiões há uma competição por áreas que são de pastagem, feijão e mandioca", diz. Segundo ele, a região também será disputada para plantio de soja e milho.