Maior produtor e consumidor mundial de carne suína, a China sofre com a epidemia de peste suína africana que assola o país, além de alguns vizinhos asiáticos, desde meados de 2018. Os efeitos devastadores da doença levaram à abertura das importações no país. A medida mais recente credenciou plantas frigoríficas em Santa Catarina para exportação de seis tipos de miúdos suínos: pés, língua, focinho, máscara, orelha e rabo.
Embora ainda não tenha sido diretamente beneficiado pelas exportações para a China, o mercado em Minas Gerais vive momento promissor. Segundo dados fornecidos pela Associação dos Suinocultores de Minas Gerais (Asemg), o estado detém o maior consumo per capta de carne suína no país, com 21,5 quilos por habitante ao ano, frente à média brasileira de 15,3kg. Quarto maior produtor nacional, com 1.217 granjas, Minas responde por 15,9% do plantel brasileiro. No campo das exportações, também ocupa a quarta colocação.
De acordo com Alvimar Jales, consultor de mercado da Asemg, o estado tem uma forte tradição culinária focada na carne suína, e seu consumo é semelhante à produção. “Talvez essa demanda explique porque não somos tão fortes na exportação quanto os estados do Sul, que estão mais voltados para o mercado externo. Nossa demanda por carne suína de outros estados já foi maior. Hoje, isso está equilibrado, nós vendemos um pouco para outros estados, mas também compramos. Contudo, existe um olhar para ampliar a exportação”, avalia Jales.
Wallisson Lara, analista de agronegócios da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), lembra que o principal exportador de carne suína do Brasil é Santa Catarina, seguido pelo Paraná e Rio Grande do Sul. “Esses três estados diferem de Minas Gerais no modo de produção, adotando um método conhecido como integração, que é a parceria entre o produtor e a indústria, que, inclusive, fornece os insumos necessários para a criação. Quando o animal está pronto para o abate, o produtor o entrega para a agroindústria. Já em Minas Gerais, de forma geral, o modo de produção é independente. O produtor contrata um frigorífico para abater os animais e monta sua própria estratégia para depois negociar no mercado”, explica Lara.
Para João Ricardo Albanez, subsecretário de Política e Economia Agropecuária da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais, é natural que Santa Catarina seja a porta de saída das exportações de suínos devido à sua cadeia bem estruturada e consolidada. “Em 2018, o Brasil produziu 3,9 milhões de toneladas de carne suína, sendo que Minas foi responsável por 476 mil toneladas. Nas exportações ainda somos fracos. Neste mesmo ano, das 635 mil toneladas exportadas pelo Brasil, o estado foi responsável por apenas 15 mil toneladas. Mas vivemos um momento muito oportuno para o setor e temos condições de ampliar nossas exportações”, garante Albanez.
Porém, de acordo com Leandro Castro, analista de Comércio Exterior do Frigorífico Saudali, sediado em Ponte Nova (MG), a abertura da China pode criar euforia nos mercados, mas é necessário ter cuidado. “As empresas precisam entender que isso é um momento. A China deve se recuperar em até três anos e será muito mais forte do que era. Não se deve fazer investimento especifico para o mercado chinês. O mercado muda muito e nunca se deve concentrar em um só lugar”, aconselha Castro.
A Saudali destina 15% de sua produção para exportação, alcançando países como Uruguai, Argentina, Albânia, Gana, Costa do Marfim e, mais recentemente, a África do Sul. Segundo Castro, o frigorífico está próximo de conseguir exportar para Cingapura e Vietnã. No fim de 2020, a empresa vai concluir programa de investimento que aumentará o número de suínos abatidos de 2.700 para 4 mil por dia. Com esse aumento, o percentual de exportação deve continuar na casa dos 15%.
O analista da Saudali explica que alguns mercados exigem critérios superiores aos estabelecidos pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento para emitir o selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF). “A China é um mercado muito restrito e, além de vários processos, exige a rastreabilidade do rebanho para combater o uso da ractopamina, que é um aditivo comumente usado na ração animal. Já a Argentina e o Uruguai exigem análise de 100% das carcaças para identificar a presença do parasita Trichinella”, explica o analista.
O analista de agronegócios da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg) Wallisson Lara chama a atenção para o potencial do mercado interno brasileiro. O analista da Faemg calcula que o consumo médio de carne suína no Brasil é considerado bem inferior em relação a outros países, como China e Estados Unidos, e à União Europeia. Lara acredita que a carne suína ainda carrega certo estigma de não ser saudável. “Os tempos são outros. Há décadas nossa carne passou por uma transformação genética, perdendo gordura e ganhando massa muscular. Hoje temos um porco fit, e precisamos desmistificar essa ideia. A carne suína é uma iguaria e tem ganhado seu espaço”, avalia Lara.
O analista da Faemg se recorda que há três anos o setor vivia uma crise aguda, marcada pelo alto custo de produção (com o milho e soja, insumos usados na ração suína, em alta no mercado externo) e uma remuneração baixa em um contexto econômico estagnado. A partir daí foi feito um trabalho para ajudar a ajustar a oferta do produto, quando seu preço se estabilizou.
“A partir daí, fatos como a guerra mercadológica travada entre os Estados Unidos e a China, além da epidemia de peste suína africana na China, favoreceram nossas exportações. Nos últimos anos, enquanto a exportação de carne bovina cresceu 7%, a de cortes suínos cresceu 23%. De janeiro a outubro, o preço do quilo do suíno vivo aumentou em 39%”, explica Lara.
Alvimar Jales, consultor de mercado da Associação dos Suinocultores de Minas Gerais (Asemg), confirma a dificuldade vivida pelo setor quando a Rússia decidiu suspender as exportações brasileiras, em novembro de 2017, para estimular seu mercado interno. O país europeu era um importante comprador e sua decisão gerou um excesso de produto no mercado interno. Walisson Lara lembra que as festas de fim de ano são um período especialmente bom para o setor, quando a população está mais capitalizada.