Pesquisadores do Laboratório de Bacteriologia de Peixes (Labbep), da Universidade Estadual de Londrina (UEL), estão bem próximos de encontrar uma vacina trivalente capaz de imunizar tilápias para as principais doenças que atacam criadouros – são dois subtipos (sorotipos Ib e III) de estreptococose e da franciselose, causadas por bactérias e que podem provocar sérios prejuízos aos produtores.
A tilápia é o peixe de água doce mais consumido pela população brasileira. Embora não existam relatos de malefícios das doenças aos seres humanos, a vacina é recomendada por ser um tratamento acessível e que proporcionará mais rentabilidade e maior taxa de sobrevida dos peixes. O laboratório já desenvolveu uma vacina bivalente contra a estreptococose, com eficácia de 98%, e a expectativa é concluir os testes para apresentar ao mercado a nova tecnologia capaz de combater as três principais bactérias que afetam a produção comercial de tilápias.
Para se ter a dimensão da importância desta cadeia, a produção brasileira de Tilápia em 2017 alcançou 357 mil toneladas, de acordo a Associação Brasileira da Piscicultura, volume considerado bastante expressivo e que coloca o Brasil entre os quatro maiores produtores do mundo, atrás de China, Indonésia e Egito.
O coordenador do Labbep, professor Ulisses de Pádua Pereira, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva, acredita que até o final de novembro tenha avançado esta primeira fase de testes da vacina trivalente. Ele explica que a Streptococcus agalactiae, principal causadora da estreptococose, é uma bactéria que permanece externamente às células dos peixes, enquanto a bactéria causadora da franciselose tem capacidade de sobreviver e se multiplicar intracelularmente, o que dificulta o estudo.
Na prática
Os testes buscam testar a eficácia da vacina. De acordo com o professor o próximo passo será rastrear nos genomas das bactérias – os quais foram sequenciados e publicados pela equipe – alvos vacinais da superfície destes patógenos que poderão auxiliar no controle e na prevenção das doenças. Os pesquisadores já conseguiram sequenciar cinco genomas completos de bactérias.
Pelo menos dois mestrandos do Programa de Ciência Animal, do Centro de Ciências Agrárias (CCA), estão dedicados a esta fase do estudo. A estudante Raffaella Mainardi, que desenvolve a vacina, e César Facimoto, responsável pela pesquisa em bioinformática e que fazem os modelos de sequenciamento genético que também auxiliam no desenvolvimento das vacinas. O laboratório conta ainda com mais um mestrando, um doutorando, três médicos veterinários residentes e cinco alunos bolsistas.
O professor explica que a vacina é indicada para tilápias com 30 gramas. O peixe atinge o estágio comercial quando chega a pelo menos 900 gramas, o que demanda cinco a seis meses nos criadouros. A vacinação é feita pelo próprio produtor, no abdômen do peixe, em dose única de 0,05 ml. Para vacinar, a recomendação é retirar um lote de peixes do criadouro e separá-los para a anestesia, que pode ser feita em recipiente com água e óleo de cravo ou benzocaína.
O anestésico deixa o peixe sonolento para receber a dose. Posteriormente, ele volta para o tanque sem qualquer comprometimento físico. De acordo com o professor Ulisses, ao contrário do que aparenta, a vacinação é fácil e rápida. Segundo ele, um tratador com prática pode vacinar até 10 mil peixes por dia.
Além do desenvolvimento de vacinas, o Laboratório de Bacteriologia de Peixes da UEL trabalha com outras duas linhas de pesquisa. A bioinformática, que sequencia genoma de bactérias com o objetivo de controle e prevenção de doenças.
Outra linha é o desenvolvimento e validação de probióticos, produtos que utilizam micro-organismos vivos os quais resultarão em efeitos benéficos para os peixes, sejam no estímulo do sistema imune, competição na microbiota intestinal ou no auxílio ao aproveitamento dos nutrientes ingeridos. Nesta segunda linha de pesquisa o Laboratório trabalha com duas bactérias atualmente.
Mercado
A importância do estudo desenvolvido na UEL ganha força a partir da tendência mundial que coloca o peixe como a proteína animal mais produzida no planeta. A estimativa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico e da Organização da Alimentação e Agricultura da ONU (FAO) é que a produção global de peixes de cultivo ultrapassará a produção de peixes de captura a partir de 2020. A produção de peixes de cultivo cresceu 60% entre 2007 e 2017, chegando a 80 milhões de toneladas.
No Brasil, a piscicultura cresceu 8% em 2017, terminando o ano com a produção de 691,7 mil toneladas de peixes cultivados. Com este resultado, a atividade voltou ao eixo normal de crescimento, após enfrentar dificuldades em 2016, com redução dos investimentos e queda no consumo. O Paraná é o primeiro produtor brasileiro, com a produção de 112 mil toneladas no ano passado.
A Tilápia é a mais importante espécie de peixe cultivado no Brasil. De acordo com levantamento da Associação Brasileira da Piscicultura, a espécie representa 51,7% da piscicultura nacional, com 357,6 mil toneladas no ano passado. A segunda posição não é de uma espécie em si, mas de uma categoria, os nativos – tambaqui, carpa e truta. Os dados são do Anuário 2018 da Associação Brasileira da Piscicultura