Entre os dias 27 e 30 de maio, ocorreu a 27ª Conferência e Exposição Europeia de Biomassa – EUBCE, em Lisboa, com a presença de 1600 conferencistas de quase 80 países e 43 expositores. O evento contou também com 281 plenárias e apresentações orais sobre os mais diversos temas relacionados à biomassa.
A EUBCE há algum tempo se tornou um evento líder mundial para os setores de biomassa e bioenergia, sendo considerada uma oportunidade global para o intercâmbio de conhecimentos, tanto técnicos quanto relacionados a políticas públicas, inovações e desafios dos países em desenvolverem-se por meio da bioeconomia.
A cada ano, a Conferência aborda uma temática diferente. Em 2019, o tema central foi “O papel da biomassa na entrega das metas do Acordo de Paris e metas de desenvolvimento sustentável”. Na cerimônia de abertura da EUBCE 2019, todos os discursos realizados chamaram a atenção para as metas estabelecidas no acordo de Paris referentes à mitigação das mudanças climáticas. O Ministro do Meio Ambiente e Transição Energética de Portugal, João Matos Fernandes, destacou a importância da biomassa como estratégia e premissa de desenvolvimento econômico sustentável e como essa fonte renovável tem um papel fundamental nas diretrizes de desenvolvimento dos países europeus para o atingimento das metas de mudanças climáticas até 2050. E Carlos Moedas, comissário europeu para a Pesquisa, Ciência e Inovação, ressaltou que a biomassa conecta sustentabilidade, inovação, pesquisa, agricultura e energia.
Em um painel sobre as Aplicações da Pesquisa Científica na Indústria, Geraldine Kutas, representante da UNICA – União da Indústria de Cana-de-Açúcar na Europa apresentou as oportunidades e desafios do Programa Renovabio, trazendo uma abordagem sob a ótica das políticas públicas. Segundo ela, o Renovabio é um programa que entrará em vigor em 2020 e é considerado bastante promissor para impulsionar a produção de biocombustíveis no Brasil. Esse programa foi criado para atuar, principalmente, com o setor dos transportes, responsável por grande parte (ou a maior parte) das emissões de gás carbônico no país.
Dessa forma, alinhado às premissas europeias e ao acordo de Paris, o Brasil também destaca oportunidades do setor de biomassa em prol das mitigações das mudanças climáticas. No entanto, apesar das oportunidades do Renovabio, Geraldine ressalta que alguns desafios serão enfrentados pelo setor em função das necessidades de adaptação tecnológica (por meio da utilização de tecnologias e processos mais eficientes e menos poluidores), de investimentos, de certificação de produtores de biocombustíveis e novos conhecimentos financeiros atrelados ao CBio, crédito de descarbonização. Para saber mais sobre o programa, acesse: https://www.renovabio.org/
Eentre diversas plenárias e apresentações orais que ocorreram nos quatro dias da Conferência, o workshop “Bio-based products making the Circular Economy Era a reality” foi uma das que chamaram a atenção pela forma como a União Europeia tem se organizado em torno do tema bioeconomia. O workshop foi organizado pela BBI JU, uma PPP (Parceria Público Privada) entre a União Europeia e um consórcio de indústrias que atuam no setor da bioeconomia e que possuem um investimento de 3,7 bilhões de euros para desenvolver a cadeia desse setor. Desse montante, 2,7 bilhões de euros são oriundos de investimentos privados e, aproximadamente, 1 bilhão de euros são oriundos do programa Horizon 2020.
Os principais objetivos da PPP BBI-JU são:
– Fomentar e impulsionar o fornecimento sustentável de biomassa com aumento de produtividade e construção de novas cadeias de suprimentos;
– Otimizar os processos das biorrefinarias tornando-as mais eficientes;
– Demonstrar tecnologias que possibilitem o desenvolvimento de novos componentes químicos, novos materiais e novos produtos de consumo a partir da biomassa, que substituam a necessidade de insumos baseados em combustíveis fósseis: a meta é substituir 25% dos produtos derivados do petróleo por bioprodutos;
– Desenvolver modelos de negócios que integrem os atores da cadeia de valor (desde o fornecimento de biomassa, passando pelas biorrefinarias, até os consumidores de materiais de base biológica), incluindo a criação de novas interconexões entre setores e o apoio a clusters intersetoriais. Esse objetivo contribui com a otimização das estruturas políticas e regulatórias;
– Mapear as principais plantas de biorrefinarias, identificando-as com um selo ou emblema, com o intuito de destacar suas tecnologias e modelos de negócios associados a materiais de base biológica, bioprodutos e biocombustíveis;
– Investir em pesquisa para formar massa crítica e especializada;
– Gerar novos empregos a partir da cadeia de valor da bioeconomia.Estima-se gerar aproximadamente 3,7 milhões de novos empregos na Europa.
Observando, portanto, a estratégia adotada pela PPP entre a União Europeia e as Bioindústrias, percebemos que a colaboração está à frente de qualquer resultado de sucesso. Ainda, a visão sistêmica e integrada da iniciativa é apresentada na forma de um modelo de governança, que une governo, indústria e academia de, aproximadamente, 35 países em prol da sustentabilidade das cidades e saúde e bem-estar das pessoas, tendo a bioeconomia como pilar estratégico, sustentável e circular.
Os especialistas que lideraram o workshop apontaram que, apesar das barreiras culturais, tecnológicas, mercadológicas e, claro, regulatórias, reforçam a importância da iniciativa como propulsora do desenvolvimento sustentável de países europeus em prol do atingimento das metas do Acordo de Paris. Dessa forma, pode-se observar que apesar das diferenças socioeconômicas (e algumas ambientais) entre os países europeus e o Brasil, os desafios e barreiras enfrentados são bastante similares.
Assim, como um bom exemplo concreto, a PPP BBI-JU pode e deve servir como inspiração ao mercado brasileiro, tanto à iniciativa pública, mas, principalmente, à iniciativa privada, ressaltando a colaboração e integração de valores e interesses frente a um bem comum, o nosso planeta.
Em resumo, todos os trabalhos e estudos apresentados na EUBCE 2019, seja de forma mais técnica ou científica, seja de forma mais estratégica ou macroeconômica, apontaram a bioeconomia como o caminho para se cumprir as metas de mitigação das mudanças climáticas. Os novos produtos de base biológica prometem reduzir as emissões de CO2 em pelo menos 50%; os resíduos passarão a ser melhor explorados e aproveitados; a criatividade, inovação, cooperação e sustentabilidade serão premissas básicas para qualquer desenvolvimento tecnológico; mais empregos serão criados; e terá mais oportunidades nas áreas rurais e valorização das produções e consumos locais. Portanto, comprovadamente, a ciência aponta que é possível, juntos, cumprirmos com os objetivos e metas traçados pelo Acordo de Paris.