A preocupação das indústrias em obter maior eficiência energética e economia está aumentando a demanda por profissionais até há pouco tempo ausentes dos organogramas das companhias no Brasil, como é o caso dos especialistas em risco e cogeração de energia. A escassez de mão de obra com formação específica tem feito com que as empresas busquem até mesmo acadêmicos nos cursos de doutorado para ocupar essas posições, que exigem conhecimentos aprofundados em diferentes áreas de conhecimento.
A ascensão desses executivos está relacionada com as novas necessidades do mercado. Nos últimos dois anos, cresceu fortemente a procura em áreas como a de cogeração de energia no segmento industrial. “É um profissional muito demandado, não só pelo setor energético, mas também em outras companhias que geram parte da energia que consomem”, afirma o gerente de engenharia da consultoria de recrutamento Robert Half, Fabiano Kawano. A autogeração é uma tendência entre as grandes indústrias, que conseguem controlar melhor o consumo, estão menos vulneráveis a apagões e podem até vender seus excedentes de produção. A remuneração de um profissional na área, segundo Kawano, pode chegar a R$ 20 mil.
De acordo com o headhunter, esse profissional tem um perfil misto, que agrega conhecimentos em geração de energia à compreensão sobre as necessidades específicas de cada indústria. Como se trata de uma demanda recente, os executivos contratados têm formação normalmente em engenharia mecânica ou elétrica. “Estão surgindo também algumas especializações na área para complementar a qualificação desse profissional”, diz.
O ambiente acadêmico é também uma fonte de talentos para as empresas, que têm recorrido aos cursos de mestrado e doutorado em energia para encontrar gente com conhecimentos aprofundados na área. A professora Virgínia Parente, do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, conta que é comum receber contatos de headhunters pedindo indicações de alunos. “Alguns doutorandos transferem o curso para o regime de meio período e assim conseguem aproveitar as propostas sem deixar de investir na formação”, diz.
Esse é o caso de Erik Rego, diretor da Excelência Energética, consultoria sediada em São Paulo. Desde 2005, ele concilia o trabalho de consultor na área com a pesquisa acadêmica. Doutorando pela USP em tempo parcial, ele afirma que viu o mercado de energia criar oportunidades para os profissionais da área nos últimos anos. “A regulação do mercado facilitou a negociação de contratos de energia. Isso atraiu investimentos da iniciativa privada, especialmente em fontes como energia eólica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs)”, diz.
Paulo Cesar Tavares, sócio de duas empresas na área (Sol Energias, especializada em comercialização, e Antares, de soluções energéticas), afirma que, além do profissional de cogeração, o mercado tem valorizado também o especialista em gestão de risco de energia. “Eu mesmo contratei duas pessoas recentemente para minha equipe”, conta. Esse profissional calcula o risco do investimento de uma empresa em projetos na área ou em compra de energia.
“Ele faz simulações para saber se esses investimentos são viáveis, qual tipo de geração de energia é mais vantajosa e por que preço será vendida. É preciso entender muito bem as relações de compra e venda para fazer negócios melhores”, exemplifica Kawano, da Robert Half. Demandado pelas indústrias de geração, esse especialista ganha até R$ 13 mil – e a remuneração variável muitas vezes agressiva chega a dobrar esse valor.
Por utilizar técnicas de administração de portfólio semelhantes às do mercado financeiro, o gestor de risco de energia precisa ter uma formação multidisciplinar, que envolve áreas tão diversas quanto regulação do setor e matemática financeira. “Eles aconselham as empresas a comprar energia no curto ou no longo prazo e a escolher em que tipo de fonte investir, por exemplo”, afirma a professora Virgínia Parente, da USP.
Com formação em engenharia elétrica e conhecimentos aprofundados em finanças graças à atuação na área, o consultor de risco de portfólio Luiz Fernando Lorey foi contratado há poucos meses pela Duke Energy. Sua mudança de emprego foi acompanhada por uma ascensão de cargo e de salário. “Também fui motivado pela oportunidade de me aprofundar na área”, diz. Os planos de Lorey para o futuro incluem uma especialização na área de finanças para complementar a formação. “Meu trabalho é dar suporte para a tomada de decisão da empresa e indicar os riscos para as operações no mercado energético. Além disso, também faço análise de crédito das empresas que compram energia da Duke, o que torna muito importante o conhecimento em finanças”, afirma.
A falta de qualificação específica na área tem feito com que o próprio setor se organize para promover a formação de seus profissionais. Este ano, a Associação Brasileira das Empresas Comercializadoras de Energia Elétrica (Abracel) colocou em prática o programa de certificação nessa área, em parceria com a Fundação Getulio Vargas (FGV). Paulo Cesar Tavares, também vice-presidente da entidade, afirma que a ideia da autorregulação foi motivada pelo aumento da demanda por esse tipo de especialista. O desafio é grande – na primeira prova, apenas 20% dos candidatos foram aprovados. “O setor precisa se profissionalizar. Queremos levar as certificações do setor elétrico ao mesmo patamar das do mercado financeiro.”, compara.