Fonte CEPEA

Carregando cotações...

Ver cotações

Comentário B&B

Glicerol: Um Subproduto de Energia 2 - por Thiago Corrêa

Por ser uma alternativa aos combustíveis derivados do petróleo, o uso do Glicerol tem sido uma aposta de muitos produtores e investidores.

Glicerol: Um Subproduto de Energia 2 - por Thiago Corrêa

Por ser uma alternativa aos combustíveis derivados do petróleo, o Biodiesel tem sido a aposta de muitos produtores e investidores. Um mercado emergente que se resume em duas palavras: inovador e promissor. O Biodiesel é um combustível alternativo que pode ser utilizado em carros ou qualquer outro veículo com motor diesel. Fabricado a partir de fontes renováveis, como biomassa e produtos agrícolas, têm uma vantagem significativa em relação à emissão de poluentes.

O processo para a transformação do óleo vegetal em biodiesel chama-se transesterificação. Para elucidar o processo precisamos entender um pouco da bioquímica das plantas. O óleo vegetal é formado por três moléculas de ácidos graxos ligadas a uma molécula de glicerina (glicerol), o que faz dele um triglicerídio. A transesterificação é nada mais que a remoção da glicerina do óleo vegetal, tornando-o mais fino.

 

Subproduto da síntese de Biodiesel, a glicerina ou glicerol se tornou um fator preocupante frente ao destino deste, já que para cada tonelada de biodiesel obtido são gerados 100 kg de glicerol, provocando efeitos adversos à economia, e podendo também se tornar um possível fardo para o meio ambiente. Mesmo sendo utilizado em diversos segmentos como na indústria química (detergente, tinta, aditivo), alimentícia (estabilizante, antioxidante, emulsificante) e farmacêutica (medicamento e cosmético), o glicerol possui uma capacidade limitada de mercado, o que restringe a absorção de quantidades maiores do produto.

A partir do exposto, se torna um desafio pensar novas aplicações para o glicerol e, uma alternativa apontada é a utilização do mesmo em células a combustível – dispositivos eletroquímicos que convertem energia química de uma reação diretamente em energia elétrica. As células a combustível são sistemas termodinâmicos espontâneos, o que significa que não precisam de energia externa para produzir eletricidade. O grande benefício aliado a este sistema é o baixo índice de emissão de poluentes ao ambiente com a produção de energia. Segundo estudos, em relação às células convencionais, o desempenho da célula a base de glicerol ainda é considerado baixo, no entanto existe a possibilidade de utilização em geradores auxiliares de eletricidade nas próprias indústrias de biodiesel, o que permitiria uma pequena economia de energia elétrica.

Uma outra linha de pesquisa que também vem gerando grandes frutos à área é a conversão microbiana de glicerol em produtos de maiores valores agregados, como a fermentação anaeróbica na formação de etanol e butanol. Contudo, uma grande aposta das pesquisas tem sido o emprego do glicerol na nutrição animal.

A pedido dos leitores, buscamos ampliar o horizonte desta discussão e daremos ênfase ao uso do glicerol na nutrição animal. Para isso contamos com a contribuição do zootecnista Leonardo de Freitas, mestrando em Nutrição e Produção de Monogástricos (Frango de Corte) da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” – USP. 

O Glicerol na Nutrição Animal 

A produção agroindustrial no Brasil representa uma parcela significativa do Produto Interno Bruto e nesta participação a indústria avícola ocupa lugar de destaque, gerando riquezas e realizando um papel social importante na produção de alimentos e geração de empregos.

A cadeia produtiva mundial de frangos de corte tem-se modernizado como consequência do melhoramento genético e dos avanços na área de nutrição, sanidade e manejo das aves. Os objetivos de tais avanços, de modo geral, são redução de custos e aumento da produtividade, com o intuito de não perder competitividade em nível mundial.

Entre os vários aspectos importantes na produção avícola, a nutrição desempenha importante papel, que abrange desde a formulação de dietas que visam atender as exigências nutricionais, como a busca pelo incremento no aproveitamento dos nutrientes presentes nos alimentos formulados, em geral, a base de milho e soja (ARAUJO et al., 2007).

Assim, o dinamismo da nutrição animal busca novas estratégias para melhorar a digestibilidade dos alimentos e proporcionar condições que favoreçam a expressão do máximo potencial genético das aves, sem acréscimos aos custos de produção.

Considerando que a alimentação representa a maior parte dos custos na produção avícola, medidas que visem reduzi-los podem significar lucro para o setor. Assim, é dentro deste contexto que as pesquisas envolvendo a utilização de alimentos alternativos, com destaque para os subprodutos ou resíduos, resultantes do processamento industrial de produtos agrícolas. Atualmente, além das pesquisas do ramo agropecuário, estudos sobre o emprego de fontes renováveis de energia têm sido intensificados. Entre as fontes renováveis, tem recebido grande atenção o biodiesel (Melo et al., 2006).

Com o crescimento da produção brasileira de biodiesel, vem aumentando o interesse pela utilização da glicerina na alimentação animal. Isto se deve ao fato de a glicerina conter alta energia e haver possibilidade de inclusão em rações como ingrediente energético. 

A Utilização da Glicerina na Alimentação de Aves e Suínos 

Com relação ao desempenho de frangos de corte, Simon et al. (1996), avaliando a adição de  5, 10, 15, 20 e 25%  de glicerina pura na dieta, concluíram que a inclusão de até 10% deste produto não afetou negativamente o desempenho dos animais. No entanto, a adição de 25% de glicerina prejudicou o desempenho e provocou mudanças patológicas no epitélio do papo, no fígado e nos rins. Mais recentemente, Cerrate et al. (2006) avaliaram as inclusões de 5 e 10% de glicerina proveniente da produção do biodiesel (contendo alto nível residual de potássio) em rações de frangos de corte e relataram que o nível de 10% afetou negativamente o consumo de ração, o peso final e, consequentemente, a conversão alimentar dos frangos. Quanto às características de carcaça e da cama, os mesmos tratamentos reduziram os pesos (absoluto e relativo à carcaça) do peito das aves e pioraram a qualidade da cama, tornando-a mais úmida.

Menten et al. (2008), avaliando o farelo de soja suplementado com 10% de glicerina proveniente da produção do biodiesel (81,47% de glicerol, 153 ppm de metanol e 2,4% de sódio) na dieta de frangos de corte, concluíram que o mesmo pode ser utilizado durante todo o período de criação sem afetar negativamente o desempenho das aves, desde que sejam considerados os devidos ajustes nutricionais, em termos de energia, aminoácidos e sódio.

Em estudos desenvolvidos nos Estados Unidos, avaliando a inclusão de 5 e 10% de glicerina bruta (84,51% de glicerol e 3200 ppm de metanol) proveniente da produção do biodiesel na dieta de leitões na fase de creche, Lammers et al. (2007) não observaram qualquer efeito no desempenho e na ocorrência de lesões nos tecidos associados com o metabolismo do metanol.

Já Groesbeck et al. (2008), avaliando os efeitos da inclusão de 3 e 6% de glicerina (90,7% de glicerol e 136 ppm de metanol) e 6 e 12% de glicerina associada com óleo de soja sobre o desempenho de leitões na fase de creche, observaram um efeito linear positivo no ganho diário de peso dos leitões que receberam glicerina na dieta, sem, no entanto, afetar o consumo diário de ração e a conversão alimentar.

No Brasil, em recente estudo de Berenchtein et al. (2010), ficou evidenciado que a glicerina semi-purificada (80% de glicerol) pode ser utilizada como ingrediente energético das rações de suínos em crescimento e terminação até o nível de 9%, sem afetar o desempenho, as características de carcaça e a qualidade da carne dos animais.

Em estudo com a adição de 2.5, 5.0, 7.5, e 10% de glicerina em dietas de frangos de corte, (Silva, 2010) observou que a inclusão de 10% de glicerina favoreceu o desempenho das aves na primeira semana de criação (fase pré-inicial), ocorrendo aumento no consumo de ração, sem alterar a conversão alimentar, obtendo-se melhor peso vivo, porém este ganho não se prolongou nas demais fases de criação, onde a inclusão de 5% de glicerina se mostrou mais adequada.

Resultados de pesquisas gerados nos últimos anos indicam que o uso da glicerina bruta proveniente da produção de biodiesel tem uma aplicação segura quando incluída na formulação de rações para aves até cerca de 10%, não afetando o desempenho, a saúde, a qualidade da carcaça e da carne dos animais. Entretanto, como a qualidade da glicerina produzida industrialmente pode ser variável, seu uso deve ser feito com cautela até que novos estudos estabeleçam mais claramente todos os efeitos da alimentação de animais com a glicerina bruta.

É nesse cenario de pesquisa, inovação e de crescimento do mercado do biodiesel que o destino do glicerol também nos desafia a descobrir novas alternativas de utilização deste e novas tecnologias para o setor. 

Por Leonardo W. de Freitas, graduado em zootecnia pela Universidade Federal da Grande Dourados-MS e Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal e Pastagens da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – ESALQ/USP. E-mail: [email protected]

Colunista Thiago H. B. Corrêa, professor do curso técnico em Química do Colégio Porto dos Bandeirantes, Mestrando em Educação da Universidade Metodista de Piracicaba e aluno do curso de especialização em Ciência e Tecnologia na Universidade Federal do ABC. E-mail: [email protected] 

Referências podem ser obtidas com os autores