Com 2012 a pleno vapor, vale a pena refletir como dez anos de forte crescimento econômico nos países emergentes levaram às retumbantes transformações vistas em 2011. Desde os dramáticos acontecimentos no Oriente Médio até a gigantesca onda de apoio à cruzada anticorrupção de Anna Hazare na Índia, os líderes dos países emergentes vêm recebendo mensagem clara das ruas: apenas crescimento econômico não basta. Os que ignorarem a mensagem o fazem por sua própria conta e risco.
As economias de países emergentes apresentaram expansão sólida na década de 2000 e sobreviveram até mesmo à crise financeira mundial sem que o crescimento se desintegrasse. O espectro do aumento da corrupção, no entanto, compromete a legitimidade de seus ganhos econômicos e corrói o apoio às outras reformas necessárias para sustentar o impulso de seu crescimento.
A corrupção assume muitas formas, mas nos países emergentes, uma combinação de fatores a converteu em um câncer que, no fim das contas, acaba derrubando regimes. A incansável corrupção nas baixas esferas do poder é um grande estorvo para a população mais pobre em muitos desses países; limita, de fato, seu acesso a serviços sociais e a funções básicas do governo das quais muitas vezes dependem para a própria sobrevivência.
Outro tipo de corrupção é o que envolve o desvio de enormes quantias de dinheiro em projetos de grande escala. Na Índia, por exemplo, o governo perdeu entre US$ 30 bilhões e US$ 40 bilhões de uma arrecadação mais do que necessária quando vendeu o cobiçado espectro de banda larga em leilão manipulado.
Para as pessoas comuns, a corrupção em grande escala é menos visível, porque embora as somas envolvidas sejam estarrecedoras, os custos não são sentidos diretamente como nas negociatas em pequena escala. A percepção desse tipo da “megacorrupção”, no entanto, mudou, à medida que o alto crescimento elevou a desigualdade social.
Em países como China e Índia, a expansão da economia tirou muitas pessoas da pobreza. Os frutos da globalização e esse crescimento elevado, entretanto, não foram compartilhados de maneira uniforme – os ricos tornaram-se super-ricos enquanto uma grande parcela da população continua muito pobre.
A crescente desigualdade de renda está longe de ser algo limitado aos mercados emergentes, mas sua combinação com corrupção escancarada e desigualdade generalizada cria uma mistura tóxica que vem minando o apoio a reformas que poderiam fortalecer e consolidar os ganhos econômicos vistos nesses países.
Em muitos países emergentes, a falta de liberdade política soma-se a essa mistura inflamável. A combinação de corrupção, desigualdade e repressão política cria uma enorme pressão e não há canais institucionais para dar-lhe vazão.
Regimes políticos mais livres, no entanto, não são uma panaceia. Em uma democracia como a Índia, os que gozam de boas conexões políticas beneficiam-se do crescimento distorcido, aumentando, portanto, o ressentimento dos que são relegados. A oportunidade de “expulsar os canalhas” em cada ciclo eleitoral ajuda a aliviar um pouco a pressão, mas não resolve os problemas que a produzem.
É difícil prever o que desencadeia os protestos populares, mas os fatores econômicos são essenciais. Por exemplo, elevar o preço dos alimentos tende a prejudicar os mais pobres, especialmente os de regiões urbanas, já que gastam uma grande parcela de sua renda em alimentação; ao contrário dos trabalhadores agrícolas, eles não recebem nenhum dos benefícios decorrentes da alta do preço dos alimentos. Com o crescimento das populações urbanas, ficará cada vez mais difícil controlar essas pressões.
Alguns governos reagiram aos recentes acontecimentos com repressão, restrição às informações, com medidas autoritárias. A China, por exemplo, impediu a cobertura pela mídia do país dos protestos egípcios. A Primavera Árabe, contudo, revela a fragilidade dos regimes repressores que tentam manter sua legitimidade limitando os fluxos de informação.
A principal lição para os países emergentes mais dinâmicos é que concentrar-se exclusivamente no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) pode acabar não sendo bom para a estabilidade política e econômica. Mesmo com grandes elevações da renda nacional, se os líderes dos países não distribuírem os benefícios de forma justa, ficarão vulneráveis ao descontentamento popular. Derrubar a corrupção é crucial para melhorar o crescimento de longo prazo e manter a estabilidade social.
Esses países precisam de medidas que os ajudem a manter os mais pobres fora das armadilhas da pobreza e lhes deem oportunidades reais de melhorar seu bem-estar econômico. Entre esses passos estão a ampliação dos mercados financeiros, de forma que as pessoas tenham mais acesso a crédito e investimentos; o fortalecimento das redes de segurança social para proteger os mais vulneráveis economicamente; e a melhora do acesso à educação e de sua qualidade.
As lições aplicam-se igualmente aos países avançados, que também sofrem com o aumento da desigualdade e formas sutis de corrupção. Para essas economias mais ricas, contudo, atualmente a prioridade é recuperar níveis satisfatórios de crescimento.
Os países emergentes têm uma oportunidade de ouro de aproveitar os ganhos econômicos e garantir o crescimento e a estabilidade, se conseguirem resolver problemas arraigados como o da corrupção. Como mostraram os acontecimentos de 2011, os custos da inação poderiam ser calamitosos. (Tradução de Sabino Ahumada)
Eswar Prasad é professor de economia na Cornell University e bolsista sênior na Brookings Institution. É coautor, junto com M. Ayhan Kose, de “Emerging Markets: Resilience and Growth Amid Global Turmoil” (algo como “Mercados Emergentes: Resiliência e Crescimento em meio à Confusão Mundial”, em inglês). Copyright: Project Syndicate 2012.