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Meio Ambiente

Balbina, um megaerro à procura de paliativos

A geração de Balbina, no entanto, não chega a 3% do projetado para as turbinas da hidrelétrica do rio Xingu, com 11.233 MW de potência instalada.

Data: 23/09/2013 Editoria: Brasil Reporter: Andre Borges Local: Presidente Figueiredo AM Pauta: Hidreletrica de Balbina Setor: Infraestrutura, Energia, meio ambiente Personagem: Lago da hidreletrica de Balbina em Presidente figueiredo AM Tags: desmatamento, amazonia, Hidreletrica, ecologia, desastre Fotos: Ruy Baron/Valor
Data: 23/09/2013 Editoria: Brasil Reporter: Andre Borges Local: Presidente Figueiredo AM Pauta: Hidreletrica de Balbina Setor: Infraestrutura, Energia, meio ambiente Personagem: Lago da hidreletrica de Balbina em Presidente figueiredo AM Tags: desmatamento, amazonia, Hidreletrica, ecologia, desastre Fotos: Ruy Baron/Valor

São 8 horas da manhã. O sol já transformou o lago de Balbina em um espelho metálico. Com dificuldade, ainda é possível ver o imenso cinturão de árvores mortas, quilômetros adentro da represa. Na margem, a água chacoalha os barcos de pescadores, uma zoada de insetos e pássaros sai do meio da mata. Quase dá para esquecer que se está diante de uma catástrofe ambiental e de um dos piores projetos energéticos do planeta.

Passados 24 anos, ainda se discute o que fazer para minimizar os graves danos que a hidrelétrica impôs ao ambiente e que solução dar aos moradores da vila Balbina, pequena comunidade cuja existência não estava nos planos oficiais. Em discussão, uma redução do lago, o corte das árvores submersas e a incorporação da antiga vila ao município mais próximo, Presidente Figueiredo.

Balbina inundou 2.360 km quadrados de mata nativa, área equivalente à das cidades de São Paulo e Campinas juntas, para gerar uma potência instalada de apenas 250 megawatts (MW), energia suficiente para atender apenas 370 mil pessoas. A comparação de Balbina com outras usinas instaladas, ou em fase de construção, na Amazônia dá uma dimensão do escândalo protagonizado pelo governo militar e pela Eletronorte, que planejaram a hidrelétrica na década de 70 e levaram quase uma década para conclui-la, entre 1981 e 1989.

Com uma área de alagamento pouco maior que a de Balbina, a hidrelétrica de Tucuruí foi erguida na mesma época no rio Tocantins, no Pará, com capacidade de geração de 8.370 megawatts de energia, 33 vezes a potência de Balbina. A floresta alagada por Balbina é quase cinco vezes superior à que será engolida pelo barramento de Belo Monte, com seu reservatório de 512 km quadrados. A geração de Balbina, no entanto, não chega a 3% do projetado para as turbinas da hidrelétrica do rio Xingu, com 11.233 MW de potência instalada.

Balbina escreveu um capítulo de absurdos na história energética do país. Para entender como isso ocorreu há quase um quarto de século e, principalmente, as suas consequências, a reportagem do Valor visitou toda a estrutura da usina, das suas instalações na casa de força às extremidades de sua barragem. Ouviu comunidades que vivem na região, gestores da hidrelétrica, governos local e federal, representantes do setor elétrico e especialistas em energia e ambiente. A decisão de construir Balbina ainda hoje cobra seu preço e serve de alerta aos novos aproveitamentos hidrelétricos planejados para a Amazônia.

A área alagada não é o único impacto gerado sobre qualquer projeto do setor elétrico – Belo Monte, por exemplo, vai exigir a realocação de mais de 20 mil habitantes de Altamira -, mas o assunto ganha relevância absoluta quando se trata de Amazônia.

A vila Balbina, erguida pela Eletronorte no meio na floresta para abrigar os trabalhadores da usina, chegou a ter 10 mil moradores durante a construção da hidrelétrica. Hoje, os 3 mil habitantes vivem uma relação de conflito e descontentamento com a Amazonas Energia, companhia do grupo Eletrobras que controla a hidrelétrica. No centro da polêmica está, justamente, a cobrança da energia elétrica.

Até 2007, nenhum morador da vila pagava conta de luz. De 2008 em diante, a Eletrobras instalou relógios nas casas da cidade e passou a enviar as faturas mensais para os ribeirinhos. A confusão se armou. Hoje, ironicamente, grande parte dos moradores que tiveram que mudar de suas casas para que a hidrelétrica pudesse ser construída rouba energia. Os “gatos” tomaram conta das ruas da vila.

“O povo realmente está revoltado com essa conta de luz. Eles abandonaram a gente aqui, não deram trabalho, nada. Todo mês, as contas de luz chegam com um valor completamente diferente. Estão cortando a energia das pessoas. Quem atrasa o pagamento, tem o nome enviado ao Serasa “, diz o pescador Orlando Paulo da Silva, de 60 anos, que cresceu nas margens do rio Uatumã, onde Balbina foi construída. “O que eles querem mesmo é que a gente vá embora.”

Os “gatos” e a indignação da população de vila Balbina são do conhecimento da Eletrobras. A empresa, no entanto, não vai voltar atrás na decisão. “Não existe nada que nos obrigue a prover energia de graça”, diz Rubens Seixas, gerente de operações da usina. “Na verdade, essa vila deveria ter sido desmontada no passado, mas acabaram deixando ela aí para a população da região. Essa decisão foi um erro”, diz Seixas.

Hoje, esse erro está caindo aos pedaços. Na porta de entrada da vila Balbina, que ainda possui uma cancela administrada por funcionários da Eletrobras, uma série de casarões de madeira, que abrigavam um museu com bichos empalhados da Amazônia, está desmoronando. A estrutura, que custou dezenas de milhões e o trabalho de um conjunto de arquitetos e engenheiros, apodrece ao relento, com o teto caindo, situação que se espalha em muitas outras casas da vila.

A Eletrobras Amazonas fez um orçamento para reformar os prédios. A obra custaria R$ 6 milhões, R$ 3 milhões só de madeira. Desistiu. “Não dão sequer a madeira para arrumarmos essas casas. Aqui nós estamos vendendo o almoço para pagar a janta. A caça e a pesca pioraram muito. A vida era muito melhor antes dessa usina”, diz o pescador Silva. “Antes eu morava no meu próprio rancho, na minha terra. Hoje estou nessa casa. Se eu sair, eles entram e derrubam tudo. E eu não recebo nada por isso.”

A Eletrobras Amazonas negocia a integração da vila a Presidente Figueiredo, município de 25 mil habitantes, cuja sede esta a 80 km de Balbina. “Minha visão é que a vila deixe de ser da Amazônia Energia para ser parte do município. São 3 mil eleitores a mais. Vamos fazer nosso primeiro plano para isso”, diz Tarcísio Estefano Rosa, diretor de geração, transmissão e operação da empresa em Manaus.