Desde 2012, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) regulamentou a geração distribuída, na qual pessoas físicas e jurídicas podem ter mini e microgeradores para consumo próprio e devolver o excedente à rede em troca de desconto na conta de luz. A Agência revisou as normas em 2015, através da RN 687/2015, para aprimorar o modelo, mas alguns players do setor ainda resistem à tecnologia com argumentos de que os custos de infraestrutura tendem a aumentar e sobrecarregar aqueles consumidores que não podem investir em energia solar.
“É um argumento que não faz sentido”, afirma Rodolfo Meyer, especialista em energia solar e sócio do Portal Solar (www.portalsolar.com.br), hub de informações e empresas da área. Em entrevista, ele explica por quê, na realidade, a descentralização da geração de energia contribui para todo o setor no Brasil, além de destacar os benefícios para o meio ambiente. Confira:
As pessoas que não aderem à geração compartilhada podem ser prejudicadas com o avanço do modelo?
Rodolfo Meyer: Esse é o argumento de algumas distribuidoras, que destacam uma taxa chamada TUSD (Tarifa de Uso dos Sistemas Elétricos de Distribuição), a tarifa utilizada para investir na infraestrutura do sistema. Há dois problemas, no entanto: em primeiro lugar, mesmo que você produza 100% do que consome e receba créditos pelo excesso produzido, ainda assim há uma tarifa mínima que pagará às distribuidoras, chamada de custo de disponibilidade. Além disso, a infraestrutura já está construída! Na realidade, o que traz mais custos para o sistema elétrico nacional é ter que criar dois mil quilômetros de torres e cabos de alta tensão para trazer a energia de uma usina no meio da Amazônia, como Belo Monte, a um custo de R$ 5 bilhões, enquanto poderíamos aumentar a geração nas próprias cidades.
Mas então não há essa sobrecarga de custos sobre infraestrutura?
RM: De forma alguma. Na realidade, a energia solar por si só é uma energia extremamente limpa e, conforme o modelo de geração compartilhada se expande – e aqui incluo também outras fontes como eólica e de biomassa -, tende-se a partir para um smartgrid, que é uma rede de energia inteligente, ou seja, uma rede elétrica melhor e mais sintonizada com o que vemos em países europeus, Estados Unidos e Austrália, por exemplo.
Como contornar o fato de que a instalação de sistemas de geração solar tem um preço elevado?
RM: Se você considerar que, além de desonerar a rede elétrica nacional, a energia solar ainda é uma fonte extremamente sustentável e geradora de empregos, acredito que o governo deveria incentivar mais a expansão dessa tecnologia por meio de financiamentos e subsídios como todos os países desenvolvidos fazem. Interesse há, fizemos um levantamento no Portal Solar e notamos que 40% dos orçamentos pedidos no site são de famílias com contas de energia menores do que R$ 200 mensais, 15% ficam abaixo de R$ 100. As pessoas nos perguntam: mas como posso financiar uma placa fotovoltaica? Para ficar no exemplo de Belo Monte que mencionei, com o que o governo gastou na usina até agora seria possível subsidiar em 100% energia fotovoltaica para dois milhões de famílias de classe média baixa. Dois milhões de famílias que nunca mais precisariam pagar por energia!
Você falou em empregos, consegue estimar quantos postos de trabalho o setor gera?
RM: Sim. Recentemente, a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) divulgou que para cada megawatt de energia solar instalado são criados entre 20 e 30 empregos, o que resultaria na geração de até 99 mil novas vagas até 2018. Mas veja, eles consideraram apenas usinas de grande porte. Quando você analisa geração compartilhada, o potencial é ainda maior e bem distribuído, de forma que essas vagas não se concentram em determinada região, mas espalham crescimento econômico por todo o país.
Na sua opinião, por que ocorre essa resistência à geração compartilhada?
RM: É um movimento econômico natural. Trata-se de uma novidade aqui no Brasil que, à primeira vista, aparenta reduzir a receita dos players estabelecidos do mercado, ou seja, as distribuidoras. No entanto, eu acho que falta ter uma visão mais aberta e perceber que, a longo prazo, esse modelo traz vantagens para todos, tanto do ponto de vista ambiental, quanto econômico.