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Conselhos de fora buscam brasileiros

Cada vez mais companhias americanas e europeias buscam profissionais do Brasil para fazer parte do principal órgão supervisor das empresas, o conselho de administração.

Conselhos de fora buscam brasileiros

Procuram-se conselheiros com sotaque brasileiro para compor o “board of directors” de empresas estrangeiras. Impulsionadas pela importância do mercado latino-americano para os negócios e pelas características dos executivos locais, cada vez mais companhias americanas e europeias buscam profissionais do Brasil para fazer parte do principal órgão supervisor das empresas, o conselho de administração.

O francês Sylvain Dhenin, headhunter da consultoria global CTPartners, afirma que há uma demanda crescente por parte de empresas europeias de todos os setores por executivos latino-americanos para fazer parte dos conselhos. “Existe uma tendência hoje para que as organizações diversifiquem o ‘board’ com o objetivo de adaptá-lo aos seus mercados. Para isso, precisam de pessoas com o conhecimento geográfico e cultural dos países onde têm operações fortes.”

Pela posição de destaque que possui na região e por ser considerado um mercado-chave para essas companhias, o Brasil acaba sendo o “exportador” mais cobiçado de conselheiros. Em geral, são executivos com ampla experiência no mercado nacional e internacional, que ocuparam a presidência de grandes companhias e que acumulam participações em conselhos no Brasil.

É o caso de Luiz Kaufmann, que já comandou a Aracruz e foi convidado há cerca de um ano para fazer parte do “board” da fabricante de caminhões americana Paccar. A companhia controla a DAF, empresa que no ano passado começou a construção de uma fábrica no Brasil. Ele foi recrutado por headhunters acionados pelo vice-presidente responsável pela expansão no país, em busca de um conselheiro com conhecimento da América do Sul, já que a fábrica pretende produzir para todo esse mercado.

“As décadas de experiência em gestão de Kaufmann no Brasil vão oferecer uma perspectiva valiosa para a Paccar em um momento em que ela expande para esse mercado importante”, disse o presidente do conselho e CEO da empresa, Mark Pigott, em comunicado sobre a nomeação. Ele é o primeiro brasileiro a fazer parte do conselho da companhia, que tem uma trajetória de mais de cem anos. Kaufmann já passou pelo conselho da empresa de tecnologia agrícola americana Pioneer há alguns anos e, no Brasil, acumula passagens pelos ‘boards’ de companhias como Vivo, ALL e Lojas Americanas.

Hoje, ele atua como consultor na reestruturação de empresas após processos de fusão e aquisição e, além do trabalho na Paccar, faz parte do conselho da companhia aérea Gol. Kaufmann afirma que existe uma boa receptividade das organizações estrangeiras em relação aos brasileiros nessa função – especialmente com o destaque que o Brasil ganhou na economia mundial nos últimos anos.

Na Paccar, ele viaja de quatro a cinco vezes por ano para reuniões presenciais nos Estados Unidos e faz parte do comitê de auditoria em razão de sua experiência na área financeira. “O conhecimento de quem ocupa uma cadeira em um grupo como esse pode ser aplicado em situações muito distintas. Você vê as coisas sob uma outra perspectiva e isso é muito enriquecedor”, diz.

A consultora Fátima Zorzato, da empresa de recrutamento de executivos seniores Russell Reynolds Associates, viu a busca por executivos como Kaufmann se intensificar nos últimos dois anos tanto por parte de empresas da Europa como dos Estados Unidos. De acordo com ela, a princípio, a motivação das companhias era ter no conselho alguém que pudesse falar com propriedade sobre o Brasil e a América Latina, mercados onde a prioridade é crescer.

“Agora, a procura existe também pelo fato de as empresas perceberem que aqui existem muitos executivos globais”, diz. A busca por mais diversidade nos conselhos, uma discussão bastante atual, é outro componente que impulsiona a presença de mais estrangeiros. “Mesmo para assuntos de lá, é interessante para essas organizações saber como um latino-americano pensa.”

A companhia de óleo e gás francesa Technip, por exemplo, nomeou em 2011 a brasileira Leticia Costa para o conselho, a primeira latino-americana a fazer parte do grupo. A executiva já foi presidente da consultoria Booz & Company no Brasil e hoje também faz parte do conselho da Localiza e da Marcopolo, além de estar na diretoria executiva da escola de negócios Insper e atuar como consultora. “Como a Technip tem uma operação importante no Brasil, queriam poder contar com alguém do país”, explica. Apesar de não ter trabalhado diretamente no setor energético, Letícia tem décadas de atuação em consultorias, o que lhe dá um amplo conhecimento sobre o mercado local.

A nomeação da brasileira, feita junto com a de uma americana, é parte da estratégia de renovar e diversificar a composição do ‘board’, segundo o comunicado da empresa, que destaca o “entendimento profundo [que as executivas têm] dos principais clientes e mercados do grupo”. A presença de mais conselheiras também responde a exigências do governo francês de que mulheres precisam formar 20% desse time até 2014 e 40% até 2017. Hoje, quatro dos onze conselheiros, ou 36%, são mulheres. Com reuniões presenciais a cada dois meses, Letícia faz parte do comitê de estratégia, além do de ética e governança.

As características dos executivos brasileiros os tornam atraentes para empresas estrangeiras, segundo Luiz Marcatti, sócio da consultoria Mesa Corporate Governance, especializada em governança corporativa. Além de vir do maior mercado da América Latina e de um ambiente de negócios mais sofisticado que o dos demais países da região, os profissionais do Brasil também acumulam experiência com longas crises – uma expertise interessante para empresas de países que passam por situação semelhante atualmente, como é o caso das europeias.

“Existe uma versatilidade nos executivos do nosso país que é muito interessante para os estrangeiros. Eles são muito bem formados, comandaram multinacionais e viveram em um cenário de economia turbulenta por muitos anos”, diz. Outro fato que o consultor percebe influenciar na preferência por brasileiros é o reconhecimento da governança corporativa local. “As práticas que temos aqui nesse sentido estão entre as melhores dos países emergentes”, diz.

Oscar Bernardes, que já foi presidente da empresa de alimentos e bioenergia Bunge e sócio-diretor da consultoria de tecnologia Booz Allen & Hamilton, reconhece que sua experiência em mercados “incertos” como o brasileiro é um aspecto importante para a companhia americana de gases industriais Praxair, onde é conselheiro há três anos. “Por viver uma economia cheia de altos e baixos, o executivo brasileiro acaba sendo muito bem treinado para lidar com a incerteza. Isso é muito valorizado pelas empresas”, diz. No seu caso, contou não apenas o conhecimento do mercado nacional, mas também sua experiência no mundo de negócios americano.

A Praxair é controladora da White Martins no Brasil. Bernardes também está no conselho da Gerdau, Localiza, Suzano, Marcopolo e Dasa Laboratórios, além de atuar como consultor. Até dois anos atrás, estava no conselho da produtora de motores de Hong Kong Johnson Electric, onde foi convidado pela proximidade que tinha com o presidente da empresa. No caso da Praxair, foi abordado por um headhunter que buscava um conselheiro do Brasil.