A decisão do governo de restabelecer a cobrança de PIS e Cofins sobre receitas financeiras das empresas colocou em alerta as companhias e as áreas de crédito corporativo dos bancos. A avaliação preliminar é que o decreto, editado em 1º de abril, não só vai onerar os recursos aplicados do caixa das companhias como deverá aumentar o custo da dívida, em especial o financiamento em moeda estrangeira.
As alíquotas, que foram zeradas em 2004, passarão para 0,65%, no caso do PIS, e 4% na Cofins, a partir de 1º de julho de 2015. O governo estima uma arrecadação de R$ 2,7 bilhões com a cobrança, que deve atingir 80 mil empresas. O tributo será válido para quem recolhe o tributo pelo regime não-cumulativo.
Em linhas gerais, os tributos incidirão sobre qualquer ganho financeiro obtido pelas empresas, desde um rendimento com a aplicação do caixa em um Certificado de Depósito Bancário (CDB) até a variação cambial positiva de um empréstimo obtido no exterior.
O problema, na avaliação de bancos e consultores, é que o governo não previu no decreto a compensação das eventuais despesas financeiras no pagamento do imposto, como havia no passado. Por outro lado, a alíquota que passará a ser cobrada é menor do que os 9,25% que existiam antes.
Para as companhias que recolhem o tributo no regime de caixa, o pagamento do imposto no caso de um ganho financeiro de uma desvalorização do dólar ocorrerá apenas no vencimento das operações. A maior parte das empresas, porém, apura hoje o PIS/Cofins pelo regime de competência, no qual o cálculo do imposto é feito mensalmente.
No caso de uma empresa com financiamento em dólares, se a moeda americana sofrer desvalorização em um determinado mês, o ganho contábil do período estará sujeito à tributação, mas se no mês seguinte a moeda subir a perda não poderá ser compensada. “Quanto mais volátil o dólar, maior será o imposto a pagar”, resume o diretor de tesouraria de um banco estrangeiro.
O caso mais extremo é o de empresas que contrataram financiamento em dólar “casado” com um contrato de swap, que converte o passivo em moeda estrangeira para a taxa interbancária (CDI), referencial para o financiamento em reais. Esse tipo de operação é usado principalmente por companhias que não contam com receita em moeda estrangeira. Nesse caso, a incidência do imposto ocorrerá todos os meses, uma vez que a empresa sempre terá algum ganho a ser tributado, seja na variação cambial ou no derivativo usado para proteger o balanço.
Diante da farta liquidez no mercado internacional e das taxas de juros baixas, os empréstimos externos se tornaram uma fonte alternativa para as empresas em meio à piora no cenário local, mesmo para aquelas que não são exportadoras, conforme reportagem publicada pelo Valor nesta semana.
Em média, o custo dessas linhas estava saindo de 5% a 10% do CDI mais barato do que linhas domésticas, diz o executivo de um banco de atacado. O executivo de um banco de grande porte diz que o fluxo desse tipo de negócio “zerou” desde o anúncio da mudança na alíquota.
Como o imposto incidirá em todo o estoque de operações, e não só nos financiamentos novos, algumas companhias já avaliam a possibilidade de pré-pagar as linhas tomadas fora do país para escapar da cobrança. “Se isso ocorrer, até mesmo a cotação do dólar pode sofrer impacto”, diz um executivo de banco.
Com a expectativa de custos mais altos nas linhas externas, a demanda das companhias deve se concentrar em empréstimos locais e emissões de debêntures. A consequência natural da maior procura deve ser um aumento dos spreads nas operações. “A medida terá impacto na administração de caixa de todas as empresas e também na estruturação dos produtos bancários”, diz Fabio de Almeida Braga, sócio do Demarest Advogados.
A incidência do imposto pode ter como outro efeito colateral a redução na procura por hedge (proteção) pelas empresas contra a alta do dólar. O custo do hedge é historicamente alto no país em razão da diferença entre as taxas de juros locais e externas. “As empresas de maior porte podem optar por migrar as operações de hedge para fora do país”, diz Fabio Zenaro, gerente-executivo de produtos e negócios da Cetip.
O estoque de operações de swap cambial, um dos instrumentos usados pelas empresas para proteger as dívidas contra a oscilação do dólar, registrado na Cetip fechou março em pouco mais de R$ 140 bilhões, uma alta de 28% em relação ao mesmo período do ano passado.
A Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) avalia agora se tomará alguma medida em relação ao tema. Anteontem, a entidade de reuniu com a PwC. No encontro, os executivos de bancos e os especialistas em tributação avaliaram se existia algum produto alternativo com função de hedge, mas sem a incidência de PIS/Cofins. A conclusão, pelo menos temporária, foi que não havia opção.
Outras entidades, como a Fecomercio-SP (varejo) e a Fiesp (indústria), também avaliam o impacto das medidas, que pegaram as companhias de surpresa.
Mais em: http://www.valor.com.br/financas/4009210/disputa-do-piscofins-pode-parar-na-justica